Alex Ferreira explica como deve ser essa conciliação e foge do imediatismo, ‘temos um princípio que é o seguinte: Se não tivermos a informação completa, o DA não publica”
DA REDAÇÃO – Tem uma frase de Heródoto, grego conhecido como o “pai da história”, que descreve o “Egito, uma dádiva do Nilo”. Ele falou isso em alusão à importância desse rio para o crescimento e consolidação dos egípcios enquanto sociedade imperial. Sendo assim podemos dizer que “Diário de Caratinga é uma dádiva do Diário do Aço”, pois Wilton Rodrigues, então proprietário do DA, que numa atitude empreendedora, fundou em 21 de março de 1995 o Diário de Caratinga, que agora completa 26 anos de criação.
E para saber como o DA está fazendo esta transição do impresso para o digital, afinal este periódico é uma das referências do jornalismo feito no interior de Minas, conversamos com o editor Alex
Ferreira. Ele tem opiniões firmes e foge do imediatismo, destacando a apuração: “Se não tivermos a informação completa, o Diário do Aço não publica”. E outra lição que o editor nos ensina foi aprendida nesta pandemia, pois segundo ele, “mesmo as pessoas que gostam de navegar nas águas barrentas da internet sempre ancoram o barco da leitura em fontes confiáveis, tradicionais para conseguir alguma informação mais confiável”.
Alex, poderia nos contar um pouco sobre sua trajetória na comunicação. Como chegou ao Diário do Aço?
Comecei minha carreira no extinto Gazeta do Caparaó, em Manhuaçu. Dei meus primeiros passos sob a orientação do jornalista Luiz Carlos Ferreira, diretor do jornal. Em seguida, aproveitando o conhecimento que adquiri com a redação, fui ser redator do noticiário da Rádio Catuaí, também Manhuaçu. Foi um trabalho retumbante. Pela primeira vez uma emissora tinha um noticiário que priorizava fatos locais e ganhamos a liderança de audiência em um ano de trabalho. Meu grande salto profissional, entretanto, ocorreu em 1995, quando fui contratado para ser repórter e redator da antiga filial da Rede Itatiaia de Rádio, no Vale do Aço. Trabalhei na rede por 12 anos. Nesse meio tempo me graduei em Comunicação Social Jornalismo. No fim do curso, em 2006, cheio de ideias, fui surpreendido por uma mudança na direção da emissora no Vale do Aço e um certo afastamento da rede da sua filial cuja sede ficava em Timóteo. Desanimado com o rádio, procurava um novo emprego e estava prestes a ir para uma emissora de TV. Foi quando o então editor-chefe do Diário do Aço, João Senna dos Reis, soube que eu deixaria o rádio e me chamou para conversar. Dessa conversa saiu a minha contratação para o Diário do Aço, onde me encontro desde 2007.
O senhor foi contratado justamente para fazer este processo de transição do impresso para o digital. Como está sendo este trabalho?
Assim que eu cheguei ao jornal logo percebi que havia uma falha grande. A internet já representava um peso na comunicação, mas esse processo se encontrava estagnado no DA. Apresentei um projeto, que foi imediatamente acatado. O site foi remodelado, para uma versão mais dinâmica e com todos os recursos disponíveis à época. Foi montada uma equipe para começar a produzir, de forma paralela ao impresso, conteúdos para o digital. O primeiro desafio foi mesmo o recurso humano. Jornalistas antigos se recusavam a ingressar no digital. Então eu cheguei à conclusão que poucos conseguiriam se adaptar. Foi uma luta. Na medida em que jornalistas mais novos chegavam já eram contratados já sabendo quais seriam as tarefas. Arrancamos do 0 e hoje temos um site que tem uma média de 4 milhões de visualizações/mês.
Como adaptar as formas de trabalho e trazer os conteúdos para o ambiente online?
O ambiente online é dinâmico, ágil, mais resumido, mais factual e multimídia. Não basta um texto resumido e uma foto. Precisa de um vídeo também, mesmo que resumido. No Diário do Aço adotamos o uso do vídeo linear, sem edição. Vídeo para site de jornal não deve carregar os mesmos elementos de um vídeo-reportagem de TV. Se tiver tempo para editar, ótimo. Se não tiver, acrescenta um título, uma legenda, salva e manda para o ar. Entretanto, temos um desafio extra. Muitos dos assinantes do impresso têm a assinatura do digital também, para o acesso à versão na íntegra, cujos PDFs são postados todo dia à 0h. Esse leitor do impresso que transita entre as duas plataformas não gosta das matérias digitais mais resumidas. Acaba que precisamos atender aos dois púbicos.
Nessa mudança, como atrair novos leitores (internautas) sem perder os adeptos do impresso?
Não há outra forma de atrair novos leitores que não seja no impulsionamento via mídias sociais. Estamos indexados no motor de busca do Google e com presença em todas as mídias sociais.
Nos últimos anos mudou a forma de se comunicar. Como o retorno dos internautas está influenciando a produção de conteúdo para o Diário do Aço?
O retorno da audiência das notícias publicadas durante o dia pode determinar o que será manchete na primeira página do impresso. Monitoramos o que gera engajamento nas mídias sociais o tempo. Anotamos dados, dúvidas levantadas nas matérias do digital, adequamos a partir desse retorno de audiência material que sai no impresso. Ao fim de cada notícia tem uma mensagem “Encontrou um erro? Tem uma sugestão? Fale com o editor”. E tem um link para enviar uma mensagem. Isso tem sido excelente. Nunca fechamos a edição do impresso sem antes avaliarmos esses fatores.
Hoje a informação é muito rápida. O que a imprensa deve fazer para não cair no imediatismo? Diante de tanta urgência pela notícia, como manter a qualidade e a credibilidade?
Temos um princípio que é o seguinte. Se não tivermos a informação completa, o Diário do Aço não publica. Não vamos cair nessa de publicar coisas como “um carro capotou hoje na curva do sabão e parou com as rodas para cima”. Quem dirigia? Qual o estado de saúde da vítima? Foi socorrida por quem? O que pode ter provocado o acidente? Tem outras pessoas envolvidas? Mesmo porque temos um perfil de leitor que não aceitaria publicar uma notícia imediatista somente em busca de um clique. Entretanto, se houver uma necessidade de sermos imediatistas, como ocorreu essa semana, com um anúncio de adesão de Ipatinga à onda roxa, fazemos um movimento coordenado, em que mais de uma pessoa atua no mesmo assunto, de forma a assegurar que ao fim de um pronunciamento todas as informações, fotos e vídeo estejam no ar.
Outra percepção é que uma parte substancial das pessoas que acompanham as redes sociais prefere texto curto, uma pílula da notícia. Sendo assim, existe uma forma de escrever para o impresso e outra para a internet?
O texto que nós já sabemos antecipadamente que será usado somente no digital recebe um tratamento para tal. Nos demais casos é feita publicação mais agilizada para a internet e quando fica pronto o texto do impresso, de forma mais completa, o pessoal de apoio é orientado a substituir. E há casos em que mantemos o texto enxuto no site e não substituímos. Isso ocorre, por exemplo, quando a notícia é produzida com um vídeo, uma entrevista em vídeo, então não se justifica inserir um texto complexo se na internet tem uma entrevista em vídeo.
Outro problema enfrentado pelo jornalismo é a questão das Fake News. Para algumas pessoas se está na internet é verdade. Como enfrentar essa situação?
Nós mostramos sempre a checagem e não temos medo de dizer que, “diferentemente do que circula nas mídias sociais, não procede a informação sobre xx. A versão que circula no WhatsApp não passa de Fake News. A reportagem apurou junto a fonte tal que a realidade dos fatos é…”. Claro que isso rende um grande bate-boca, mas é importante porque engajamento em rede social tem outro significado: monetização. E isso é o que tem mantido o nosso trabalho, um serviço de inteligência no meio digital, para reivindicar dele o máximo de recursos financeiros que conseguirmos.
Muito se fala na sobrevivência do impresso. O senhor acredita que esse formato vai até quando?
Isso é uma incógnita. Em 2007 eu pensava que em cinco anos no máximo o impresso fecharia. Ocorreu o contrário. As assinaturas cresceram, mais pessoas passaram a adquirir o combo (impresso+digital) e assim trabalhamos até hoje. Ficou evidenciado na pandemia que mesmo as pessoas que gostam de navegar nas águas barrentas da internet sempre ancoram o barco da leitura em fontes confiáveis, tradicionais para conseguir alguma informação mais confiável. De 2018 para cá, com a inundação de informações falsas na internet, as assinaturas do impresso cresceram, a leitura de notícias no site diariodoaco.com.br quase dobraram. Então, a depender do quadro atual ainda teremos o impresso em papel por um bom tempo.