Desde o rompimento da barragem de Fundão em Mariana, no dia 5 de novembro de 2015, como membro da diretoria do Comitê da Bacia Hidrográfica do Caratinga, tenho acompanhado as consequências da maior tragédia ambiental da história do Brasil e uma das maiores do mundo. Foram mais de 40 bilhões de litros de lama despejados em cima do Distrito de Bento Rodrigues, matando ali 19 pessoas. A lama despejada pela Samarco provocou uma infinidade de impactos sócio-ambientais-econômicos em vários municípios, inclusive em Caratinga, em cidades, como em Barra Longa e inúmeros povoados localizados a jusante de Mariana. Tive a oportunidade de investigar in loco a catástrofe provocada não só naquele Distrito, mas também em vários pontos da calha do Doce, inclusive, em sua foz, na Praia de Regência (ES).
Em outra ocasião, me manifestei aqui no DIÁRIO DE CARATINGA que, na verdade, o que aconteceu nos rios da Bacia do Rio Doce foi uma tragédia anunciada. A diretoria da Samarco não levou em consideração o aconselhamento do engenheiro Joaquim Pimenta de Ávila, projetista da barragem do Fundão. Em depoimento à Polícia Federal, Ávila afirmou que, desde 2014, alertava à diretoria da Samarco que a situação da barragem era muito grave e necessitava de providências urgentes e maiores do que a empresa estava tomando. Desgraçadamente o pedido e as orientações do projetista não foram levadas em consideração!
Passado um ano do rompimento da barragem o que se constata, entre outros, é um verdadeiro pesadelo de lama, de incúria técnica e administrativa, descaso por parte dos órgãos públicos que concederam o licenciamento ambiental. As águas do Rio Doce, bem como as do mar, a 650 km do local da tragédia, continuam avermelhadas por ainda seguirem recebendo a lama vinda de Mariana e também a que foi depositada no fundo dos cursos d’água. O rejeito de minério despejado nas margens dos rios e que não foi retirado pela mineradora – são milhares de toneladas – pode agravar, ainda mais, o desastre porque o período de chuvas na região da Bacia Hidrográfica do Rio Doce já se iniciou e vai até por volta do final de março, traz sérios riscos de que a lama volte a poluir novamente os cursos d’água, mate peixes e fauna marinha, corte o abastecimento de água em vária cidades, prejudicando sobremaneira a população ribeirinha. Há outro agravante em relação porque a Samarco ainda não conseguiu estancar totalmente a lama que continua descendo de Fundão.
Nos dias 24, 25 e 26 de outubro realizou-se aqui em Caratinga o 5º Encontro de Integração da Bacia do Rio Doce quando, na oportunidade, estiveram presentes e representados todos os Comitês de Bacias Hidrográficas – seis de Minas Gerais e quatro do Espírito Santo. Neste Encontro, obviamente como não poderia deixar de ser, um dos assuntos mais importantes debatidos foi a “Tragédia de Mariana”. Notamos, durante as intervenções dos encontristas, de autoridades e de convidados, a indignação da forma como a Samarco vem tratando esta séria questão. Muito do que foi e tem sido prometido pela empresa para atenuar os problemas provocados pela lama, desde o início desta “ecocatástrofe”, não está sendo cumprido, provocando indignação em milhares de pessoas impactadas pela tragédia.
Trabalho com questões ambientais há mais de trinta anos e, jamais, imaginei um dia ter que conviver com uma catástrofe desta magnitude! Depois de lutar por décadas pela preservação do Rio Paraibuna em minha cidade, Juiz de Fora, quis o destino que, agora, como integrante da diretoria do CBH-Caratinga, fizesse parte da triste história deste belo rio (Doce) que, agora, “chora lágrimas de sangue” por imprudência de uma empresa capitalista que coloca o lucro acima de tudo! Que os (i) responsáveis por tudo isso sejam exemplarmente punidos de acordo com a legislação vigente.
Finalizando recomendo em https://www.youtube.com/watch?v=zX11uEaCZlY que vejam esta tragédia, através de imagens e de música, numa linda melodia – Cacimba de Mágoas – composta por Gabriel Pensador e Fala Mansa. A cada acesso, você estará contribuindo com a população vitimada de Bento Rodrigues.
*Wilson Guilherme Acácio, professor aposentado (UFJF), mestre em Geografia (UFRJ), ex-superintendente de Meio Ambiente (Prefeitura de Caratinga), vice-presidente do CBH-Caratinga. Geógrafo da Doctum.