Por: Paula Lanes
Se não fossem algumas características físicas e o excesso de amor e carinho que nem todo ser humano tem pelo próximo, seria impossível notar a síndrome de down.
CARATINGA – A síndrome de Down é causada pela presença de três cromossomos 21 em todas ou na maior parte das células de um indivíduo. Isso ocorre na hora da concepção de uma criança. As pessoas com síndrome de Down, ou trissomia do cromossomo 21, têm 47 cromossomos em suas células em vez de 46, como a maior parte da população.
As crianças, os jovens e os adultos com síndrome de Down podem ter algumas características semelhantes e estar sujeitos a uma maior incidência de doenças, mas apresentam personalidades e características diferentes e únicas. É importante esclarecer que o comportamento dos pais não causa a síndrome de Down. Não há nada que eles poderiam ter feito de diferente para evitá-la. Não é culpa de ninguém. Além disso, a síndrome de Down não é uma doença, mas uma condição da pessoa associada a algumas questões.
“Síndrome do que mesmo?”, esta é uma frase usada pela professora Valéria Costa em uma rede social em que conta o dia a dia de sua filha Alice da Costa Almeida, de apenas quatro meses, que é portadora da síndrome de Down. Ela é uma criança linda, simpática e adorável. Alice é irmã de Beatriz, de 10 anos e Luiz Henrique, de seis, e seu pai é Alexander de Almeida Freitas. “Descobrindo o mundo com Alice” é uma comunidade no Facebook criada para mostrar que a síndrome de Down não é uma doença e mostrar o desenvolvimento de Alice.
Com objetivo de ir contra o preconceito, a reportagem do DIÁRIO DE CARATINGA fez esta matéria especial, mostrando que pessoas portadoras desta síndrome, podem e devem ser inseridas na sociedade de forma comum como todos.
Outra entrevista que o leitor pode desfrutar nesta edição é do adolescente Lucas Moreira, 18 anos, irmão de Karla, 23; e filho de Ivone de Araújo Ribeiro Moreira e de José Carlos Moreira.
A família de Lucas recebeu a reportagem em sua casa e contou a trajetória de conquista deste garoto muito especial, não apenas por ser portador da síndrome, mas por seu carisma, inteligência e capacidade de vencer os osbstáculos da vida. Lucas também concedeu uma entrevista, onde fala com muita desenvoltura de suas preferências, suas conquistas, além de mostrar o amor que tem pelo próximo.
Com quantos anos você engravidou? Foi planejada?
Com 36 anos. Não foi totalmente planejada, tinha acontecido uma gravidez, tinha perdido, pouco tempo depois engravidei novamente do Lucas.
Sua gravidez foi tranquila?
Sim
Quando você descobriu que teria um filho especial? Qual foi sua reação?
Fiquei sabendo no 6º mês de gravidez, o ultrassom deu que a medida do fêmur não estava compatível com a semana de gestação, aí o médico disse que poderia ser um diagnóstico para síndrome de down, mas não era 100% certo. Aí acompanharíamos com ultrassom um mês depois, se o fêmur não estivesse acompanhando a semana de gestação faríamos outros exames. Fiz e deu tudo normal, então era esperar nascer para ver, mas como mãe já imaginava que ele seria especial.
Quando você passou a aceitar que seu filho tinha nascido com a síndrome?
No primeiro momento fiquei um pouco assustada porque era algo desconhecido, mas minha irmã era assistente social na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), ela tinha muita experiência, quando saí do médico, depois de um exame já imaginava que o bebê seria portador de uma síndrome, encontrei com ela e falei que poderia ser down, ela me disse que eles são muito capazes, que precisava ter muitos estímulos, então procurei me informar. Quando o Lucas nasceu eu já estava preparada. Durante o parto não quis tomar anestesia, queria ver tudo, ele chorou, mexeu, dei graças a Deus porque estava com saúde. Fez teste de Apgar (N.E.:Trata-se de um método simples e eficiente de medir a saúde de seu recém-nascido e de determinar se ele precisa ou não de alguma assistência médica imediata), estava tudo certo. Queria ver as características físicas dele, observei e não tive dúvida que tinha a síndrome de down, ele parecia um anjinho, todos se apaixonaram com ele.
O que fez para estimulá-lo quando criança?
Desde bebê ele é estimulado, os primeiros momentos foram tranquilos, tivemos muita aceitação do nosso príncipe. Os dois primeiros meses foram de muito carinho e aí começou a estimulação precoce na Apae, com excelentes profissionais. Ele fez fonoaudiologia e fisioterapia. E iniciei ainda quando ele estava com dois meses, uma especialização de psicopedagogia, porque sabia que teria que acompanhá-lo na vida escolar. Ele ficou dois anos na fisioterapia e dois na fonoaudiologia e depois teve alta. A fono orientou que o estímulo daí pra frente seria o meio falante para desenvolver, ela já tinha trabalhado postura de boca, da língua e a mastigação. Para o meio falante levei para escola regular. Com dois anos foi para a escola “Fazendo Arte”, uma escola pequena, a diretora Virginia trabalhava muito olho no olho, ele ficou seis meses, porque entrou em agosto. No ano seguinte, achei que deveria ir para uma escola maior e foi para o “Pingo de Gente”, iniciou alfabetização e ficou até primeiro período, saiu semialfabetizado e foi para a “Jairo Grossi”, nos mudamos aqui para perto da escola. Na fisioterapia seria atividade física e ele iniciou com a natação.
E atualmente o que faz nesse sentido?
Bom, ele foi para primeiro ano alfabetizado, tivemos que fazer adaptação, porque precisaria de uma auxiliar para atender as dificuldades pedagógicas, não mais como babá, ele já conseguia ir ao banheiro, tomar água, ao recreio, tudo sozinho. Ele ainda tem este acompanhamento agora no 9º ano. Depois foi para a escolinha de futebol. Atualmente faz aula de violão e academia. No primeiro ano quis que ele repetisse, para reforçar bem a alfabetização para ficar mais fácil para ele. Isso foi muito bom, pois iniciaria com a outra turma já na frente, isso foi muito bom para autoestima dele. Daí pra frente seguiu normalmente, sem retenção.
Como é a relação dele com a irmã?
(Lucas, que acompanhou toda a entrevista, fez questão de responder esta pergunta). “Minha irmã é linda e também me enche o saco como toda irmã, mas sempre foi carinhosa comigo, ela me liga, porque mora fora. Sou cruzeirense e minha irmã também. É uma pessoa muito especial para mim”.
Descreva como é um dia dele.
Acorda às 6h30, faz o lanche, se apronta, pega a mochila e vai para escola sozinho. Ele tem 6º horário, termina 12h20, almoça, depois gosta de ouvir uma música e fazer um show com violão, onde sempre faz uma homenagem a alguém ou a uma data especial, como fez recentemente na semana das crianças, faz isso durante uns 20 minutos, depois vai para internet responder mensagens nas redes sociais, olha também o celular, assiste o jornal Hoje que gosta muito e para tudo para iniciar os estudos, a auxiliar vem em casa a partir das 14h, faz as tarefas, pesquisas, lê um livro com a auxiliar, que é uma estudante de pedagogia. Terminado os estudos por volta 16h, ele desce vai à lanchonete aqui do lado bater um papo, lancha e volta pra casa e me espera chegar do serviço. Todos os dias ele me manda mensagem dizendo que está me esperando. Assiste TV, gosta das novelas da tarde, do Vale a Pena Ver de Novo. Ele conhece todos os personagens como artistas e na vida real, sabe tudo sobre eles. E tem o dia da semana que tem aula à tarde também, fica até 16h20. Como ele estuda pela manhã não teve como continuar o futebol e substituímos pela academia e tem também o violão.
O que você espera para o futuro dele?
O futuro a Deus pertence, não penso muito lá na frente, procuro focar no hoje, damos uma estrutura, uma condição para que seja cada dia mais autônomo. Mas já me sinto realizada, ele gerencia as coisas dele sozinho, nas redes sociais se comunica muito bem. Futuramente se ele conseguir ir mais além nos estudos, depende dele e é um garoto muito esforçado.
E o que você destaca das coisas que o Lucas faz?
Já tivemos muitos avanços e vitórias. Ele nos surpreende muito, não desiste do que quer. Ele faz xadrez na escola desde pequeno, o xadrez faz parte do currículo da escola. Recentemente ele se destacou e recebeu uma medalha de honra ao mérito na sala de aula. Já teve outras homenagens, quando fez Proerd (Programa Educacional de Resistência às Drogas) foi o aluno destaque, participou ativamente e ganhou um kit do Cruzeiro e uma camisa do time em praça pública. Aonde ele vai se relaciona muito bem, é muito carismático. E tudo isso graças à inclusão numa escola regular com apoio da família. Com relação à tecnologia, ele foi estimulado na escola desde pequeno. Ele usa muito desta ferramenta porque desenvolve muito a produção de texto. No Facebook faz texto de homenagens às pessoas, coloca fotos, descreve as características das pessoas, desenvolveu muito.
Tem alguma coisa que queira falar para as mães ou gestantes que tem filhos especiais?
É preciso ter muita persistência, não da parte deles, mas da nossa. O Lucas nunca desiste, quando começaram as tarefas escolares complicadas eu ficava com a cabeça quente e ele me pedia calma, dizia que daria certo e ele sempre consegue.
LUCAS, O JOVEM ENCANTADOR E INTELIGENTE
O que mais gosta de comer?
Bata frita e asa de frango
Qual seu time do coração?
Cruzeiro
Pratica esporte? Qual o preferido?
Academia, mas meu esporte preferido é o futebol
Qual sua matéria preferida na escola?
São várias, mas especialmente literatura, ética e português.
O que gosta de fazer com os amigos?
Conversar
Qual sua religião?
Sou católico. Todos os sábados eu e meu pai vamos à missa com a minha avó Nileide Já fiz a primeira comunhão
Pretende fazer uma faculdade? Qual curso?
Quero fazer Direito para ser advogado. É uma boa profissão
Já tem namorada?
Muitas
Qual seu programa de TV favorito?
Faustão aos domingos e gosto muito de novelas e também de jornais para saber o que está acontecendo de importante
Qual seu estilo musical?
Sertanejo. Gosto do Michel Teló, Paula Fernandes. Também gosto muito de Raul Seixas e do rei Roberto Carlos, que faz aniversário no dia do meu avô Milton, dia 19 de abril, e no meu violão toco diversas músicas
O que mais gosta de ler?
Já li muitos livros e atualmente estou lendo “A Moreninha” e o livro do meu avô que se chama “Com cheiro de Terra”
Que dia é seu aniversário e o que gosta de ganhar?
25 de março. Gosto de roupas, jogos, e estou querendo um celular novo e meu pai disse que me dará uma guitarra com um caixa de som
O que mais gosta de fazer com seu pai?
Ver TV, sair com ele. Toda sexta-feira saímos à noite com meu pai, minha mãe, a Rosa e com o marido, para um local que tenha música ao vivo
E com a sua mãe?
Gosto de conversar com ela, ela brinca comigo, mas me chama atenção também (risadas). Ela fala muito, mas somos muito amigos. Ela me ama.
DESCOBRINDO O MUNDO COM ALICE, SEGUNDO A MÃE VALÉRIA COSTA
Com quantos anos você engravidou? Foi planejada?
Com 32. Foi planejada
Sua gravidez foi tranquila?
Muito tranquila
Quando você descobriu que teria uma filha especial? Qual foi sua reação?
Estava no início da gravidez com 12 semanas e a gente fez um exame de translucência nucal, que toda grávida faz entre a 12ª e a 14ª semana e ele mede um líquido na nuca e tem uma determinada espessura, tem que dar até 2,5mm e o dela deu 2,8mm e o médico viu que poderia ter algo errado. Depois fiz outro exame de sangue para ver a probabilidade de ela ter alguma síndrome, e foi alta, mas não era conclusivo. Aí o médico pediu outro exame que se chama amniocentese, que é feito em Belo Horizonte e ele colhe um líquido onde o bebê fica na barriga e faz a análise. Neste exame tivemos a confirmação que era síndrome de down. Minha reação foi uma mistura de sentimentos, não vou dizer que fiquei feliz, fiquei muito assustada e chorava muito. Mas não tinha nada de errado com a gravidez, com ela também estava normal, se desenvolvendo normalmente, foi mais o psicológico que afetou. Recebi o resultado no dia do meu aniversário por e-mail, 12 de fevereiro. Fui chorar, chorei, porque a gente não imagina (lágrimas). É um assunto desconhecido, depois comecei a ler sobre o assunto e durante a gravidez começamos a investigar se ela tinha algum problema, porque 50% dos bebês com down tem cardiopatia e fizemos exames fora e vimos que não tinha nada. Eu e meu marido optamos por fazer o parto aqui em Caratinga e foi uma tensão muito grande de como seria, pensei que não daria conta… E quando vi o rostinho dela, aí já esqueci tudo, se soubesse que seria assim não teria chorado, hoje choro de emoção. É a coisa mais linda do mundo não tem nada de errado.
Quando você passou a aceitar que sua filha tinha nascido com a síndrome?
No processo da gravidez foi um período de estudo, uma mistura de sentimentos e veio a pergunta: Por que eu? Mas quando a vi pela primeira vez tive a certeza que minha família tinha sido escolhida para cuidar dela. Sei que Deus a mandou pra mim. Porque conheço algumas pessoas que tem filhos com down e sempre achei que são escolhidas e nunca imaginava que eu pudesse ser digna de ser escolhida por Deus para ter essa criança. Hoje sou uma pessoa melhor, não imaginava que seria tão forte e descobri essa força depois que ela nasceu.
O que faz para estimular a Alice?
Com 30 dias ela já começou a fazer fisioterapia, porque os bebês com down nascem com hipotonia, que é a musculatura mais fraca, então precisam deste estímulo para poder andar, sentar, firmar o pescoço. A hipotonia da Alice é muito leve, mas mesmo assim ela faz duas vezes por semana, fonoterapia e terapia ocupacional. Em casa também estimulamos bastante
Já passou por algum episódio de preconceito?
Sim e saí de perto. E tive a sabedoria de pensar que a pessoa era ignorante mesmo, não foi por maldade. A pessoa me perguntou se meus outros filhos eram perfeitos, daí pensei: Mais perfeita que a Alice?
Como é a relação dos irmãos com ela?
Muito boa. O Luiz que é mais novinho não entende muita coisa. Eles me ajudam, a estimulam bastante.
O que você espera para o futuro da Alice?
Espero que ela seja feliz. Porque um dos meus medos quando descobri, era se ela seria feliz. Porque quando vem uma síndrome com essa sociedade cheia de preconceito é complicado. Procurei saber se quem é portador da síndrome sabe que é down e eles sabem. Só quero que ela seja feliz.
Como surgiu a ideia da página “Descobrindo o mundo com Alice”?
Quando descobri tive muitas dificuldades e procurei a internet para pesquisar e os meios que me aliviaram foram as páginas que outros pais criaram. Então resolvi fazer a da Alice para ajudar as pessoas a conhecerem a ajudar aquelas que terão filhos com a síndrome ou estão passando por este momento.
2 Comentários
Rulia
Alice é uma criança linda, esperta ao extremo e faladeira!!!! nao vejo diferença, pois responde a todas as situações e estímulos!
E, realmente, Deus escolheu a dedos a família para quem a mandou, pois são muito carinhosos e oferecem sempre o melhor a ela!
E à Valeria, mais uma vez reitero meus parabéns, pois desde a gravidez já pesquisou tudo para que a Alice tivesse o melhor, e ela está tendo!
Parabéns a vocês pelo envolvimento, dedicação e carinho!
À família do Lucas, também deixo minha admiração, não os conheço, mas se percebe que há muito amor envolvido.
RONIA
Parabens pela matéria e parabens aos entrevistados pela aula de dedicação e sabedoria…me emocionei, pois as lutas são intensas, mas a vitória é certeira quando se tem amor, quando se tem Deus !!!! #alicesindromedafofura………