Presidente do Conselho Nacional do Brasil, Emília Fernandes, fala sobre o trabalho da Sociedade São Vicente de Paulo e da comemoração de aniversário do Conselho Metropolitano de Caratinga
CARATINGA – Hoje Caratinga recebe o Vincentivar. Trata-se da comemoração dos 15 anos do Conselho Metropolitano de Caratinga e do Dia de São Vicente de Paulo. O evento acontece no Santuário de Adoração (pátio da gruta).
São esperadas caravanas de diversas localidades, a partir de 8h, seguido de reunião ordinária. Após uma pausa para o almoço, acontecerá Adoração ao Santíssimo com a equipe missionária, palestra “Tecendo a caridade”, com Emília Fernandes Figueiró Jerônimo, presidente do Conselho Nacional do Brasil (CNB); momento de espiritualidade e encerramento com a missa. A animação do evento será feita pela Banda Chama.
O evento é organizado pela presidente do Conselho Metropolitano de Caratinga, Marly de Paula Barboza. De acordo com Marly, o Conselho tem muitos motivos para comemorar. Afinal, são dois projetos sociais desenvolvidos com apoio da Sociedade São Vicente de Paulo. “Estamos com o de corte e costura ‘Salão de Costura Antônio Frederico Ozanam’, contemplando 10 assistidos, mas, temos abertura para um número maior. Trabalhamos voluntariamente e nosso sonho é depois criar uma cooperativa para que essas pessoas possam trabalhar e ter mais dignidade. Temos também a escola de música ‘Antônio Frederico Ozanam’, que é um salão onde a gente acolhe as crianças, para que não fiquem na rua. Ali estão tendo formação religiosa, aprendendo uma profissão e vão ter uma vida diferente dos pais. Inclusive, é um órgão católico, mas atendemos crianças católicas e evangélicas. Temos lá cerca de 80 crianças já participando e mais de 70 aguardando uma nova oportunidade. E fomos contemplados com uma complementação para esse projeto de em torno de 11 mil reais para dar continuidade. A gente espera ainda muito mais, se Deus quiser”.
E para falar um pouco sobre os projetos da SSVP e do trabalho vicentino, o DIÁRIO DE CARATINGA entrevistou a presidente do CNB, Emília Fernandes.
O que representa para a senhora ser um vicentino?
Ser vicentino significa você atender Jesus toda semana na sua casa. Quem nos fundou foi Antônio Frederico Ozanam, nos idos de 1800. Nos idos de 1600, São Vicente de Paulo vivia fazendo a caridade. Ozanam que foi o nosso fundador se inspirou em São Vicente para fazer o seu trabalho. E esse nosso inspirador, São Vicente de Paulo nos falava assim: “10 vezes vocês vão à casa dos pobres. 10 vezes vocês encontrarão a Deus”. Então por isso que eu falo que a gente tem o privilégio de trabalhar pra Jesus, atendendo às suas necessidades.
Frederico Ozanam dizia: “A caridade não basta. Ela trata as feridas, mas não os golpes que as causam. A caridade é o samaritano que derrama azeite sobre as feridas do caminhante que foi atacado. O papel da justiça é prevenir os ataques”. O que ele quis dizer com isso?
Gosto muito dessa frase de Ozanam, acho que ela resume todo o nosso trabalho vicentino. Ele já tinha essa visão lá atrás, porque muitas vezes hoje a gente só fica atacando as consequências. Ajuda porque faltou trabalho, educação ou saúde. Então aí que ele fala: “a caridade cura a ferida”, aquele azeite, bálsamo que passa na ferida. O papel da justiça é prevenir os ataques, então se tem trabalho pra todo mundo, se tem educação e saúde, esse trabalho não precisaria ser feito. Hoje a gente tem procurado ir além das consequências e trabalhar mais na prevenção. Que a justiça aconteça.
Hoje as necessidades de pessoas carentes, muitas vezes fogem de apenas o auxílio através cestas básicas, por exemplo. Há problemas sérios dentro das famílias. A Sociedade São Vicente de Paulo tem refletido sobre novas formas de assistência?
Hoje as fomes são outras, as necessidades são outras. Então, os vicentinos de uma maneira geral, especialmente da área do Conselho Metropolitano de Caratinga já entenderam que não só roupa, comida ou remédio vão curar. O pobre tem que ser atendido em todos os aspectos da sua vida. Costumo brincar, que se a gente não conseguiu aprender com São Vicente, não aprendeu com o Ozanam, hoje tem o papa Francisco pra nos alertar e ensinar isso. Ele fala que o homem e a mulher foram criados para serem felizes em todos os aspectos da vida. E nessas pobrezas de hoje entra principalmente o problema das drogas e nós, vicentinos, de uma maneira geral, não temos expertise para trabalhar com o problema das drogas lícitas e ilícitas. Então, a gente hoje tem que trabalhar junto com outras pessoas fazendo parcerias. Dentro da nossa igreja, tem as pastorais sociais, povo de rua, que trata da sobriedade, principalmente das drogas. A gente que não consegue trabalhar diretamente com essas pobrezas faz parceria com esses grupos, para atender melhor o pobre na necessidade que ele precisa.
Qual o papel do poder público em relação o combate à pobreza? Este é um trabalho independente ao realizado pelos vicentinos, ou ainda é preciso um elo entre as partes?
Na realidade acho que hoje a gente faz o que o poder público deveria fazer. Mas, o que podemos fazer é trabalhar junto porque o nosso papel fundamental é visitar o pobre na sua casa, seja ela onde for. Então, hoje temos que fazer parcerias junto com o poder público para sair do nosso papel principal que é visitar o pobre na sua casa e trabalhar as políticas que o tire da pobreza. Tem que ter um elo, porque antigamente não se escutava muito falar na Sociedade São Vicente de Paulo, é aquela máxima, o que a mão esquerda faça, que a direita não veja. E nosso olho no olho com o pobre tem que ser assim mesmo, ele não precisa e nem deve ser exposto. O que deve ser mostrado é a Sociedade São Vicente de Paulo, no trabalho que ela realiza, não expondo o pobre, mas a pobreza de maneira geral.
As Igrejas têm se despertado para importância das missões, além dos muros de sua atuação. Como a SSVP se organiza em relação às atividades missionárias?
Nós temos dentro do Conselho Nacional do Brasil o departamento missionário. O nosso mais especificamente vai a todo o Brasil tentando resgatar aqueles vicentinos que se afastaram por algum motivo. E nesse trabalho missionário de resgatar aqueles que já foram um dia e hoje, por um motivo ou outro não são mais acaba mostrando a sociedade São Vicente de Paulo para a sociedade em geral, acaba resgatando pessoas. Então, o nosso trabalho missionário vai chamar novas pessoas e trazer de volta aquelas que se afastaram. Também fizemos agora, recentemente, missão no Paraguai. O Brasil é o maior país vicentino do mundo, temos mais de 17 mil unidades. Paraguai tinha quatro conferências, e o Brasil, chamado em missão, já deixou o Paraguai com duas conferências funcionando. Então, a gente já está indo além das fronteiras.
Já são cerca de 30 vicentinos inscritos para a Jornada Mundial da Juventude. Há expectativas de que este número salte para pelo menos 200 peregrinos. Os jovens também são o alvo da SSVP?
São o principal alvo. A Sociedade São Vicente de Paulo foi criada por jovens, para jovens, sem excluir os adultos. E hoje a gente percebe que a Sociedade envelheceu um pouco. Se você for olhar, no Brasil a fora são muitas cabecinhas brancas carregando a Sociedade São Vicente de Paulo. Então, hoje, o grande desafio nosso rejuvenescer a Sociedade São Vicente de Paulo no Brasil. E a Sociedade é muito eclética, os vicentinos que atuam têm todas as idades, de crianças até os mais experientes. Mas, o nosso foco hoje são crianças, adolescentes e jovens.
Gostaria que a senhora falasse um pouco sobre os projetos sociais da SSVP e se Caratinga já foi contemplada com algum.
O Conselho Nacional do Brasil, pensando nessas novas formas de pobreza e pra ajudar os conselhos metropolitanos do Brasil a fazerem o seu trabalho da forma que a gente imagina que deve ser feito criou projetos sociais que todo ano destina uma verba considerável para atender projetos que os próprios conselhos se inscrevem. E esses projetos normalmente não são projetos muito caros, mas são projetos que tiram o pobre da pobreza. Normalmente é capacitação, material. Por exemplo, aqui em Caratinga foi contemplado com o curso de corte e costura. A pessoa sai com a profissão e muitas vezes, empregada. O fato de a gente dar o alimento material não é bacana. São Vicente tem uma fala que é muito interessante e nos leva muito a refletir: “O pobre só perdoa o pão que lhe damos, porque é dado com amor”. Porque é humilhante para alguém receber ajuda de outra pessoa se ela não tem a capacidade de trabalhar e comprar os seus alimentos, as coisas que precisa pra ter dignidade. É capacitar, formar, inserir no mercado de trabalho, para que não dependam mais de ajuda de quem quer que seja. Conseguir andar sozinha.
O Conselho Metropolitano de Caratinga está comemorando 15 anos. Quais são as expectativas para a comemoração?
Estou muito alegre de estar aqui. Com a maior expectativa porque o Conselho Metropolitano de Caratinga faz 15 anos essa semana, mas a Sociedade São Vicente de Paulo na área de Caratinga tem mais de 100 anos. Poder estar aqui, visitar e conhecer esses confrades que conseguem mudar para melhor a vida dos pobres é motivo de muito orgulho pra mim e muita alegria. Então, a gente espera interagir bastante porque o Brasil, não falo que é um país, é como se fosse um continente, é difícil a gente visitar mais vezes cada conselho. Cada vez que visito o conselho a expectativa é melhor, principalmente de conversar, olhar olho no olho de cada confrade e consórcio, que doa o melhor de sua vida pra mudar a vida dos outros.
Que mensagem a senhora deixa aos vicentinos e não vicentinos de Caratinga.
Eu sou suspeita pra falar, porque ser vicentino é bom demais. A exemplo da frase de São Vicente de Paulo, como disse anteriormente, temos a certeza de que o pobre que a gente visita é o Jesus que estamos visitando. Para aquele que não é vicentino ainda, só sendo pra ele ver o quão é bom todas as semanas visitar Jesus em sua própria casa e atender as suas necessidades. Muitas vezes não é nem levando coisas materiais. É levando o nosso ombro, nosso ouvido porque raramente alguém escuta o pobre. E a maior qualidade do vicentino é essa, aliás, ele tem três qualidades que considero essenciais: humildade, simplicidade e dar ouvido e ombro aos pobres. Agradeço cada vicentino da área do Conselho Metropolitano de Caratinga porque o nosso trabalho é voluntário, nosso trabalho é vocação. Só consegue trabalhar como vicentino quem é vocacionado porque a gente não atende ou trabalha para o pobre quando quer, mas, na hora que o pobre precisa e quando ele estiver. Meu muito obrigada a cada confrade e consócia que o doa o melhor de sua vida para o próprio Jesus.