Secretaria de Saúde realiza programação tendo como foco a importância da humanização na saúde mental
CARATINGA- Conhecida como “holocausto brasileiro”, que matou mais de 60 mil pessoas, a história do Hospital Colônia de Barbacena, fundado em 1903 é considerada o retrato do horror quando o assunto é a saúde mental. O manicômio ficou conhecido pelos maus-tratos e torturas físicas e psicológicas aos pacientes.
De lá para cá, a visão de que pessoas com transtornos mentais e/ou necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas necessitam de atendimento em hospitais psiquiátricos, de maneira isoladas da sociedade tem sido progressivamente descontruída.
O Movimento da Reforma Psiquiátrica teve por resultado a aprovação da Lei 10.216 de 06 de abril de 2001, a “Lei Paulo Delgado”, que trata da proteção dos direitos das pessoas com transtornos mentais e redireciona o modelo de assistência. O marco legal estabeleceu a responsabilidade do Estado no desenvolvimento da política de saúde mental no Brasil, através do fechamento de hospitais psiquiátricos, abertura de novos serviços comunitários e participação social no acompanhamento de sua implementação.
Em 18 de maio completam-se 32 anos da comemoração do Dia Nacional da Luta Antimanicomial. A Prefeitura de Caratinga, através da Secretaria de Saúde, por meio do Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS-AD), preparou uma semana de atividades para dar ênfase ao trabalho realizado pela equipe. Na segunda-feira (13) e ontem foram exibidos filmes e documentários relacionados ao tema, seguidos de roda de conversa com pacientes e familiares buscando a conscientização. Hoje será realizada palestra com a referência técnica em Saúde Mental da Superintendência Regional de Saúde de Coronel Fabriciano sobre “Os desafios e dificuldades de estabelecimento da RAPS (Rede de Atenção Psicossocial)”.
O encerramento será na sexta-feira (17), com uma caminhada de protesto e apoio à luta antimanicomial, com participação dos dispositivos em saúde mental do município, Faculdade de Psicologia do Centro Universitário de Caratinga (Unec), cursos técnicos em Enfermagem do Colégio Integrado de Caratinga (CIC) e Rede de Ensino Doctum, Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), Fundação Cidade dos Meninos (Funcime), Associação de Amparo aos Doentes Mentais São João Batista (Asadom); e escolas municipais e estaduais. O percurso seguirá do CAPS AD, situado à Major Etienne Arreguy, 36, com encerramento na Praça da Conceição.
De acordo com o psicólogo e coordenador municipal de saúde mental, Ridley Vasconcelos, a caminhada visa chamar atenção da população. “É o momento que busca trazer para essa luta a sociedade como um todo, visto que trabalhamos com pessoas excluídas, não só em função da saúde mental, mas também em função do consumo de álcool e outras drogas”.
SAÚDE MENTAL
Quando se trata de saúde mental, a participação da família e da sociedade é fundamental, como explica Ridley. “A loucura é tratada como algo que deve ser colocado à margem, existe hoje um movimento de novas leis que pretendem retomar o tratamento manicomial, que é o foco da nossa atenção nesse momento para que isso não aconteça, visto que já aconteceu em Barbacena o holocausto brasileiro com um grande número de mortes de pessoas, que precisam ser tratadas nos centros de atenção psicossocial com humanidade, respeito e dignidade. Para que eles consigam retomar suas vidas dentro dessa sociedade que os criou”.
O psicólogo acredita que o tabu em torno deste assunto ainda existe. Ele afirma que a política de saúde mental precisa avançar no município, buscando a melhoria da assistência ofertada aos pacientes. “Aqui em Caratinga temos curiosamente muitos loucos na rua, a sociedade acaba aceitando, contanto que eles não criem nenhum tipo de problema. Quando por acaso eles entram em surto viram um grande problema social e todo mundo corre atrás para tirá-lo da rua, resolver aquele problema imediato. Hoje contamos com a UPA (Unidade de Pronto Atendimento), que é outra porta de entrada para a saúde mental e estabiliza, mas ainda temos muita coisa para ser colocada em prática. Do ponto de vista da rede de atenção psicossocial temos apenas três CAPS e tratamento psiquiátrico e psicológico na policlínica, mas não temos leitos psiquiátricos, alguns dispositivos de saúde mental que dariam pra nós condições de tratar melhor dessas pessoas”.
A demanda pelos serviços ofertados é crescente. A Rede de Assistência Psicossocial é microrregional, contemplando 13 localidades. O CAPS 2 atende a cerca de 10 mil pessoas; no CAPS AD são seis mil prontuários e o CAPS Infantil, atende a cerca de 800 pacientes. “A demanda é imensa, acreditamos no crescimento desses números em função mesmo da vida moderna e adoecimento psíquico não só das pessoas com esses problemas já instalados, mas também do trabalhador, stress social, depressões, Caratinga tem um índice alto de suicídios. Nós vemos um futuro em que mais cedo ou mais tarde isso vai aumentar, já está aumentando esta demanda, que já é muito grande”, afirma.
Ridley enfatiza que a saúde mental tem vários aspectos biopsicossociais, o que significa que existem influências biológicas, psicológicas e sociais para a formação do indivíduo. “Nesse contexto uma pessoa é normal, pode ou não ter características genéticas que farão com que se desenvolva um transtorno têm ou nascem com síndromes como Down e tantas outras, autismo; uma gama muito grande de doenças já instaladas ou aquelas que se instalam a partir da droga, de traumas. Enfim, muitas patologias tratadas pela rede de assistência”.
Para o psicólogo é preciso trabalhar a conscientização e as fazer com que as informações cheguem à sociedade. É preciso entender, por exemplo, que o CAPS não é um lugar para loucos, mas para as pessoas que buscam a sanidade. “O que pretendemos é exatamente oferecer esse serviço para um número ainda maior. Além da rede, também temos a Policlínica que oferece a psicologia e psiquiatria, os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasfs) nas Estratégias Saúde da Família e as pessoas às vezes não conhecem. Muita gente não procura o serviço por preconceito mesmo que é criado com esse grupo de pessoas que têm transtornos mentais, principalmente a depressão, que é tão comum e fica tão escondida nas casas das pessoas e elas não buscam o tratamento que está disponível na rede, gerenciada pela Secretaria de Saúde e prefeitura do município. Quase todo o tratamento é gratuito, com exceção de algumas medicações que não são oferecidas pelo SUS”.