Caso de DJ agredido por defender “flanelinha” em 2010 vai a júri nesta quinta-feira (17)
CARATINGA- 30 de maio de 2010. Essa data ficou marcada para o DJ Marcone Vieira Sales, que à época tinha 24 anos de idade. Ele quase foi morto ao tentar intervir em uma agressão a um “flanelinha”. O caso vai a júri nesta quinta-feira (17), no Fórum Desembargador Faria e Sousa, em Caratinga.
Conforme narra a sentença de pronúncia, disponibilizada no processo cadastrado no site do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, foi apurado que um homem teria colidido com seu veículo caminhonete contra a traseira da motocicleta de Marcone, passado por cima da vítima e o arrastado por cerca de dez metros, dando início à execução de um crime de homicídio que não se consumou “por circunstâncias alheias a sua vontade”. Este homem teria ficado irritado, após Marcone ter presenciado e pedido que ele parasse de agredir a um rapaz que vigiava carros na Rua Coronel Pedro Martins, a Rua do Correio.
Quase 12 anos depois, ainda é difícil para Marcone relembrar o episódio. Mas, ele conversou com a reportagem e relatou como isso afetou a sua vida e o sentimento ao saber que o julgamento acontecerá esta semana.
Marcone, que é DJ há 20 anos, lembra dos seus compromissos naquela noite. Primeiro, tocou no casamento de um amigo, que acabou por volta de meia-noite. Sem seguida, ele foi para a antiga Boate Diesel, onde tudo aconteceu. “Quando estava no final da boate, não lembro o horário, talvez umas 3h ou 4h, muita coisa apagou depois do acidente da mente. Lembro que saí, fui na Catarina Cimini, estava tendo um show, tinham uns amigos meus trabalhando, conversei com eles e voltei, retornei de moto, parei na porta da Diesel novamente. Nesse momento vi uma agressão a um flanelinha, um rapaz que vigiava os carros lá e era até conhecido da gente. Tinham várias pessoas, dois ou três rapazes, não lembro muito bem. Quando vi a agressão tentei separar, vi que ninguém ia separar, mas, o cara não tinha porte físico para ser agredido, não aguentaria aquelas agressões”.
Marcone afirma que o agressor ficou bastante exaltado. “Tentei ajudar realmente, fui separar. Falei para não bater no cara e esse agressor me perguntou: “Você é polícia, rapaz? Você não manda nada não”. E eu com toda educação pedindo para não bater nele. Nesse momento ele tentou me desferir socos, são poucas coisas que lembro por causa do acidente”.
Ele afirma que chegou a ser alertado por pessoas que estavam no local, de que a situação poderia se complicar. “Lembro que ele saiu correndo falando que ia pegar uma arma e me dar uns tiros. Os amigos dele ainda me falaram, vai embora que esse cara é doido. Lembro ainda que um rapaz alto, aqui da cidade, não sei o nome, mas, sei quem é, me falou para ir embora. Fiquei com medo realmente, não sabia o que o cara ia buscar no carro. Quando montei na minha moto, virei ela para sair, não vi mais nada, isso mesmo no acostamento. Foi o momento que o carro me pegou pelas costas e me atropelou”.
Com a violência, Marcone ficou bastante ferido. “Segundo as testemunhas do caso, que são pessoas que me conhecem, fui arrastado em cerca de 10 a 11 metros com a moto e o carro. Foi assim que vieram os ferimentos, quebrei a bacia em seis lugares. Minhas costas foram bastante esfoladas no asfalto, rosto, minha coxa teve uma abertura muito grande com uma cicatriz muito grande. Foi uma agressão muito forte”.
Após este fato, enfrentou o duro período de recuperação e assim, ficou um período impossibilitado de trabalhar. “Desde sempre sou autônomo como DJ, nesse período fui hospitalizado. Acho que uma das coisas que salvou minha vida é que eu tinha ido no banheiro 10 minutos antes, porque o carro passou em cima da minha bexiga. Se eu não tivesse ido ao banheiro, segundo os médicos, ela teria estourado e eu não aguentaria. Fiquei quase nove meses deitado numa cama, não conseguia me mexer, pois, a parte da bacia é bem complicada a recuperação. Era tudo na cama. Me prejudicou bastante”.
Quanto ao “flanelinha” que Marcone ajudou, ele afirma que chegou a vê-lo novamente, quando se recuperava da agressão sofrida. “Ele foi me visitar. Alguém da minha família levou ele na casa onde eu estaria, eu fiquei algum tempo na casa do meu irmão. Ele chegou bem emocionado lá, ainda perguntei a ele o que aconteceu e ele contou. Foi uma coisa bem legal ter visto que, por mais que eu estivesse mal, ele estava bem. O que eu queria era ajudar ele mesmo, não sabendo que eu seria o maior prejudicado. Mas, se acontecesse de novo eu faria de novo”.
Nos últimos dias Marcone foi surpreendido ao ser intimado para o julgamento do caso. Uma década depois, relatar o caso ainda afeta as emoções do DJ. “Achei que já tinha prescrevido, não viria à tona esse caso agora, teria esse julgamento agora, já que ele vai à júri popular. Mexe com o psicológico da gente, uma coisa antiga que tentamos esquecer. Algumas pessoas às vezes perguntavam, e aquele caso? Eu tentava não falar, foi uma coisa triste para mim, minha mãe, meu pai, minha família. Todo mundo sofre junto. Quando chegou essa intimação, primeiro levei um susto. Meu psicológico ficou bem abalado, mexeu num gatilho que eu não queria que mexesse. Meu emocional não está legal, mas, veio à tona, acho que a Justiça está fazendo a parte dela, mas, não me fez bem”.
Para Marcone Sales, a realização do julgamento representa a conclusão de um caso que mudou a sua vida. “Não recebi indenização nenhuma. Graças a Deus hoje estou trabalhando, estou feliz e com o mais importante que é a vida. Mas, não é só eu, tem outras vítimas, o cara é reincidente em outras agressões, outras passagens. Então, a Justiça tem que fazer a parte dela, pode até acalentar outras famílias. Eu querer que esse caso seja esquecido seria uma burrice. Passaram-se doze anos, demorou, mas, está acontecendo, o importante é isso”.
A reportagem entrou em contato com a advogada do acusado que vai a Júri pela suposta prática de tentativa de homicídio contra Marcone, para que apresentasse sua tese de defesa. Até o fechamento desta edição não houve resposta.