Marcos Alves de Magalhães1
Fala-se muito em crise ambiental. Entretanto, não é o meio ambiente natural que se encontra em crise. Vive-se uma crise de valores, que desencadeiam os problemas presentes em diferentes setores de nossa sociedade – e geram a ameaça ao meio ambiente.
Nesta perspectiva nunca se discutiu tanto sobre questões ambientais nos diferentes segmentos da sociedade e nos meios de comunicação como nos dias atuais. Entretanto, essa discussão ocorre, muitas vezes, de forma fragmentada e/ou descontextualizada, variando de acordo com o interesse, seja econômico, político, ambiental ou social.
Especificamente a nível econômico, dada à complexidade da realidade econômica, suas inter-relações e estrutura afetam diretamente a todos os demais segmentos, principalmente o meio ambiente. Nesse contexto, a atividade econômica demanda, de forma crescente, a extração de matéria prima para produzir bens, razão pela qual deve ser avaliado de forma criteriosa e contínua, pois uma parcela significativa dessa matéria prima é destinada a produção de bens não duráveis, que são rapidamente substituídos por novos produtos e tecnologias, tornando-se obsoletos e que nem sempre são descartados adequadamente, causando sérios prejuízos ao ambiente.
Nesse modelo há graves distorções que necessitam de ações efetivas, pois não há a mesma rapidez e eficiência das empresas que geram tecnologias, bens e serviços, para igualmente darem conta dos resíduos gerados. Apesar da legislação há fragilidades na gestão e os motivos são os mais diversos, considerando que os resíduos são gerados de forma contínua, crescente e com maior nível de complexidade.
No Brasil, por exemplo, estabelece a responsabilidade compartilhada entre todos os segmentos envolvidos na cadeia, seja importador, indústria, distribuidor, consumidor, de forma a assegurar o retorno obrigatório do resíduo (eletroeletrônicos, pilhas e baterias, embalagens de agrotóxicos, pneus, óleos lubrificantes e lâmpadas fluorescentes) à fonte geradora. Esse retorno, previsto na Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010, artigo 33) denomina-se “Logística Reversa”, entretanto na prática, muitas empresas ainda continuam produzindo sem contabilizar os custos ambientais nos seus lucros, causando prejuízos ao meio ambiente.
De modo geral as demandas na sociedade têm sido alimentadas pelas estratégias de vendas e pelo marketing que seduzem os consumidores a comprarem cada vez mais, tendo como consequência reflexo na (in)sustentabilidade ambiental. O termo sustentabilidade tem sido usado em todos os setores, seja no meio ambiente, na economia, educação ou administração para definir ações e atividades humanas que visam suprir as necessidades atuais dos seres vivos, dando suporte a alguma condição, a algo ou alguém. Desde o início o conceito de sustentabilidade teve sua origem relacionada ao termo “desenvolvimento sustentável”, definido como aquele que atenda às necessidades das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprirem suas próprias necessidades.
Transformar este conceito em ações e políticas públicas esbarra em dificuldades, pois o maior valor tem sido o crescimento econômico em detrimento dos limites da biosfera para atender as demandas humanas, razão pela qual o quadro atual de degradação e riscos provocados por estilos de vida e de produção são incompatíveis com a disponibilidade dos recursos naturais e, consequentemente da sustentabilidade ambiental.
Algumas reflexões sobre o modelo de “desenvolvimento” vigente, na maioria dos países, têm significativas implicações no âmbito ambiental, indo na contra mão da sustentabilidade. Na prática os discursos vigentes, tanto de governos como de diferentes segmentos da sociedade, com maior ou menor ênfase, declaram que é necessário “garantir empregos”, “gerar novos postos de trabalho”, “movimentar a economia”. Está aí, portanto, um grande desafio, definir o remédio e a dose a ser ministrada na economia.
O crescimento da economia com elevado custo ambiental e social implica no crescimento sem qualidade, portanto o modelo tornar-se-á insustentável ao longo do tempo. É importante destacar que na dimensão ambiental deste conceito qualquer ação humana deve: respeitar os ciclos naturais, o tempo de recomposição dos recursos e os limites que os regem; conservar a integridade do ambiente; consumir sem ultrapassar a capacidade de renovação dos recursos e respeitar a diversidade humana que produz formas diferentes de existência.
A concepção de sustentabilidade apesar de ter como pressuposto uma relação equilibrada com o ambiente em sua totalidade, considerando que todos os elementos afetam e são afetados reciprocamente pela ação humana, na prática a sustentabilidade de forma utópica tem sido falado, usado ou praticado de forma leviana, pois de modo inquestionável temos caminhado na direção da insustentabilidade.
A sustentabilidade, portanto diz respeito às escolhas sobre as formas de produção, consumo, habitação, comunicação, alimentação, transporte e também nos relacionamentos entre as pessoas e delas com o ambiente, considerando os valores éticos, solidários e democráticos.
Na contra mão da sustentabilidade nunca a sociedade teve um comportamento tão caracterizado pelo “ismo” (consumismo, imediatismo e individualismo) como no atual momento. Em relação ao consumismo tem ocorrido de forma sem precedentes, consome-se até o que não há necessidade, o supérfluo, o dispensável. De modo geral, o consumo não é maior porque o fator limitante é o poder aquisitivo, que não permite atender as muitas seduções pelas aquisições de bens que não representam necessariamente necessidades reais. Outro comportamento é o imediatismo, cuja compulsividade pelo consumo tem levado, de forma crescente, ao endividamento das famílias e, inclusive, muitas pessoas necessitam recorrer a ajuda psíquica. Compõe ainda a relação do comportamento caracterizado pelo “ismo” o egoísmo, a indiferença, o desprezo ao coletivo, em que age-se como “primeiro eu”, “segundo eu”, “terceiro eu também”. Um exemplo é o descarte dos resíduos domiciliares na rua fora do dia (domingos, feriados) ou do horário para a coleta pelo serviço público. Atitude individual como essa demostra falta de cidadania e de comportamento ético, afetando a coletividade, pois compromete a qualidade ambiental e, consequentemente a qualidade de vida.
O conceito sustentabilidade na prática não é fácil de ser implementado, com grandes desafios, à exemplos supracitados de comportamento individuais inadequados e das atividades humanas altamente impactantes no meio ambiente como agricultura em larga escala, extração vegetal, mineração, que requerem a aplicação de práticas sustentáveis nesses empreendimentos. Áreas meramente extrativistas dos recursos disponíveis são condenadas ao extermínio por práticas predatórias, necessitam de intervenções para se recuperarem.
De uma forma simples, podemos afirmar que garantir a sustentabilidade do meio ambiente é dar garantias de que mesmo explorado, continuará a prover recursos e bem estar econômico e social para as comunidades que nele vivem por muitas e muitas gerações. Mantendo a força vital e a capacidade de regenerar-se mesmo diante da ação contínua e da presença humana.
Do ponto de vista da física, a capacidade de um material suportar tensões, pressões, intempéries, adversidades e retornar a sua forma anterior denomina-se “resiliência”. Aproveitando esse conceito sob a ótica da “resiliência ambiental” as atividades antrópicas impactam diretamente o meio ambiente, cuja magnitude do potencial poluidor degradador, deve, por força de Lei, ser mitigado para não causar degradação ambiental, ou seja, não comprometer a biodiversidade (flora e fauna) ou poluir as águas, os solos, o ar, e, portanto, impactar na resiliência ambiental, de tal modo que o meio impactado retorne a sua forma anterior, restabeleça novo equilíbrio num espaço de tempo que dependerá da magnitude do potencial poluidor degradador. Temos tempo para ver a resiliência da Terra estabelecer novo equilíbrio?
Apesar da necessidade de se discutir a questão ambiental, tem sido cada vez mais difícil se chegar a um consenso de como se manter os rumos do crescimento econômico e do desenvolvimento humano, sem prejudicar ao ecossistema e a própria vida humana. Os resultados obtidos pelos encontros realizados no Rio de Janeiro (ECO 92), Johannesburgo (Rio + 10), Kyoto (1999), e em Copenhagen (2009), são provas da dificuldade de se efetivar esta proposta de desenvolvimento sustentável.
Concretamente há muitas perguntas que carecem de respostas: Será que a sociedade, as empresas, os governos estão se dando conta de sua responsabilidade sobre o meio ambiente? O atual modelo de crescimento econômico é sustentável ambientalmente a longo prazo? Os discursos estão coerentes com as ações? Estamos caminhando em que direção (in)sustentabilidade? A humanidade não está preparada para o desenvolvimento sustentável? O ser humano sabe viver de maneira sustentável?
Certo é que a falta de organização individual dá origem aos problemas ambientais. Portanto antes de estabelecer política internacional, governamental ou empresarial, a sustentabilidade deve ser norteadora para que possamos impedir a degradação ambiental, razão pela qual não há momento melhor que o atual para discutirmos, refletirmos e construirmos esta nova realidade.
Marcos Alves de Magalhães é Engenheiro Agrônomo (UFV), Mestre em Engenharia Agrícola na área de concentração em Manejo de Resíduos (UFV) e Doutor em Engenharia Agrícola na área de concentração em Recursos Hídricos (UFV). É professor do Centro Universitário de Caratinga (UNEC) do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária.
Mais informações sobre o autor: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4770499E6