Recentemente fui questionado sobre a pergunta que intitula esse artigo: quem é o povo? Encontrar uma resposta parece fácil e óbvio, pois basta pesquisar em qualquer dicionário que a resposta está lá. Assim, segundo o Dicionário Michaelis, podemos ver algumas definições: “1) Conjunto de pessoas que constituem uma tribo, raça ou nação: Povo brasileiro; 2) Conjunto de habitantes de um país, de uma região, cidade, vila ou aldeia; 3) Sociedade composta de diversos grupos locais, ocupando território delimitado e cônscia da semelhança existente entre seus membros pela homogeneidade cultural; 4) Pequena povoação; 5) As pessoas menos notáveis e menos privilegiadas de uma nação ou localidade; a plebe.”
Mas quando perguntamos “quem é o povo?”, queremos na verdade, propor uma discussão para entender um pouco de quem somos, indo além de uma pura definição conceitual. Queremos entender como somos tratados e percebidos por nós mesmos e por alguns daqueles, na verdade a maioria deles, que de alguma maneira exercem alguma forma de poder sobre este mesmo povo.
Tentando obter uma ou algumas respostas para tal questionamento vou pedir o apoio de alguns compositores e/ou bandas e espero que ao fim deste artigo tenha contribuído para alguma reflexão.
Biquini Cavadão, uma das bandas mais famosas do Brasil, gravou uma música que ficou tão famosa quanto a banda, e ela define o povo da seguinte forma: “eu sou do povo, eu sou um Zé Ninguém; aqui embaixo as leis são diferentes”.
Zé Ramalho através do seu dom artístico proclama assim quem é o povo: “Vocês que fazem parte dessa massa; que passa nos projetos do futuro; é duro tanto ter que caminhar; e dar muito mais do que receber; (…) Êh, ô, ô, vida de gado; povo marcado; Êh, povo feliz!”. Uma massa, que ri da própria desgraça e que marcada como bois, através dos intermináveis documentos, vivem guiados, sem saber para onde ir.
Zé Geraldo, na canção “Cidadão” (de autoria de Lúcio Barbosa), mostra como o povo é excluído, renegado ao nada; ou como diz na música “Como diria Dylan”, “Ei você que tem de 8 a 80 anos não fique aí perdido como ave sem destino; (…) Escreva sua história pelas suas próprias mãos”. Portanto, um povo perdido, sem identidade, sem destino, que permite que sua história seja escrita por outros.
A banda mineira Skank também tentou fazer uma alerta de quem é o povo, e o fez utilizando- se da seguinte letra: “oh! Pacato Cidadão!; Eu te chamei a atenção; Não foi à toa, não; C’est fini la utopia; Mas a guerra todo dia; Dia a dia, não”.
Outra banda, a Natiruts, gravou uma música que recebe o nome “Povo Brasileiro”. Na canção alguns questionamentos interessantes são feitos, cito algumas partes: “Não venda sua identidade cultural; Esse é o maior tesouro que um país pode ter; Alimentar, Educar, Investir; Mais tarde os seus filhos vão lhe agradecer; Pois a saída de nossos problemas é a educação; Se você não teve sua chance, dê-la a seus filhos então…”.
Até mesmo quando é usada a expressão POVÃO, que é um jeito aumentativo de se expressar, na prática o povão carrega consigo a mediocridade, a pequenez, um grupo de pessoas sem rosto, sem vez, sem voz.
No carnaval do Rio de Janeiro de 2009 a atual escola de samba campeã, Mangueira, cantou o seguinte samba enredo: “sou a cara do povo… Mangueira”.
Mas apesar de toda manipulação que percebemos em nossa sociedade, tornando difícil a missão de responder quem é o povo? Zeca Pagodinho canta assim: “Então, por que que essa gente que tem; Não aprende a lição; Com esse povo que nada tem; Mas tem bom coração”.
Quem é o povo? O povo somos nós. Que deveríamos deixar de ser o Zé Ninguém, de sermos pacatos, passivos e, em muitos casos, omissos. Um povo que não deveria aceitar marcas, que não é gado, que não fica perdido sem destino. Um povo que não aguenta mais ser “as pessoas menos notáveis e menos privilegiadas de uma nação ou localidade”.
Um povo adormecido sempre será tratado como povão, como massa de manobra. Chega de ser povão, vamos ser cidadãos para juntos construirmos de fato uma nação.
Walber Gonçalves de Souza é professor.