* Melissa Araújo Ulhôa Quintão
Existe um projeto de lei, do senador americano Anthony Portantino, da Califórnia, que visa a proibir o início das aulas escolares antes de 8h30 da manhã. Esse projeto propõe preservar o número de horas diárias de sono necessárias a crianças e adolescentes. Essa lei, se aprovada, justifica-se porque evidências científicas apontam que 87% dos alunos americanos do ensino médio e 59% dos alunos do ensino fundamental dormem menos que 8,5-9,5 horas de sono por noite. Essa redução nas horas de sono para a faixa etária citada vai contra a recomendação da Associação Americana de Pediatria. A orientação é que o sono seja mais longo, pois ele é fundamental para consolidação da memória, aprendizado, crescimento em estatura e desenvolvimento infanto-juvenil.
Dentro desse mesmo contexto, estudos conduzidos na Universidade de Albion (EUA) corrobora a necessidade de manter o sono em dia. Essa pesquisa foi realizada com cerca de 400 estudantes. Durante o procedimento, foi apresentada charadas para todos eles. Um grupo era privado do sono e o outro não. O desempenho do grupo privado de sono foi 50% menor. Portanto, a solução é dormir para melhorar o desempenho físico e mental.
Dormir é algo lógico a se fazer quando estamos com sono. Correto? Não, quando o assunto é dormir ao volante. De um lado temos algumas entidades que cuidam para preservar o sono, como a Associação Americana de Pediatria. No outro extremo, temos algumas medidas sendo tomadas para que trabalhadores não adormeçam quando estão fadigados.
Uma cadeira “antisono” está sendo desenvolvida para evitar que os motoristas profissionais adormeçam ao volante. A poltrona apresenta dispositivos como vibração, aquecimento, ventiladores e alto-falantes para mensagens, que são acionadas quando o condutor apresenta sonolência. O objetivo da cadeira é manter o trabalhador alerta. Um alerta contra o sono!
Essa cadeira foi desenvolvida para atender uma demanda. Existe uma preocupação com os altos índices de acidentes de trânsito que culminam em morbimortalidade no Brasil e no mundo, decorrente de acidentes automobilísticos. Essa preocupação é maior para os motoristas profissionais. Os motoristas de caminhão estão sujeitos a trabalhos irregulares, noturnos e com longa jornada, devido à necessidade de urgência nas entregas. Essa realidade culmina na privação do sono.
Pesquisas indicam que os motoristas apresentam vários fatores que contribuem para acidentes de trânsito no seu cotidiano. Sonolência, consumo de álcool, estradas mal conservadas, dirigir mais de 10 horas por dia, distúrbios do sono, são fatores que podem contribuir com o aumento da taxa de acidentes de trânsito.
Um assento “antisono” seria realmente uma boa ideia para prevenir dormir ao volante e, consequentemente, acidentes de trânsito? Ou seria mais importante adotar políticas públicas e condições de trabalho que protejam e preservem o sono de trabalhadores?
Enquanto a legislação não protege e garante o sono de todos, talvez essa poltrona seria importante para assegurar que o motorista não durma ao volante, que o funcionário de uma empresa entregue um projeto em tempo hábil, que os médicos, enfermeiros, policiais e bombeiros não durmam durante um procedimento.
No entanto, mesmo para aqueles que precisam ficar acordados para cumprir uma tarefa, precisamos analisar e rever todas as formas possíveis que lhes garantam a saúde e o bem estar. Afinal, qual tendência seguir: o sono ou os dispositivos que tiram o sono? Eu escolho o sono.
E deixo a letra de uma canção como reflexão, pois dormir bem é uma tarefa difícil:
“Estamos meu bem, por um triz/
Pro dia nascer feliz/
Pro dia nascer feliz/
O mundo inteiro acordar/
E a gente dormir
“Pro dia nascer Feliz”
(Cazuza e Frejat)
* Melissa Araújo Ulhôa Quintão
Doutora em Ciências (USP) e Mestre em Fisiologia (UFES). Docente dos cursos de Enfermagem, Fisioterapia e Medicina do Centro Universitário de Caratinga – UNEC.
Mais informações sobre o autor(a), acesse:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4775398E5