Para Jorge Victor há risco epidemiológico claro e direto para a região de Caratinga
CARATINGA– Na manhã de ontem, o promotor de Justiça Jorge Victor Cunha Barretto da Silva concedeu entrevista ao DIÁRIO para comentar as mudanças implementadas em novo decreto do município, que acataram, em parte, a recomendação do Ministério Público. Ele ainda frisou questões que trazem alerta à população para o risco de saúde pública com 18 casos de alta suspeição pra o covid-19 no município.
SITUAÇÃO DE SAÚDE
Inicialmente, o promotor frisa que todos os assuntos que envolvem a pandemia exigem fundamentação técnica, tanto na área jurídica como na área sanitária. “E o contexto técnico-sanitário que temos hoje em Caratinga é extremamente preocupante, temos mais de 100 casos suspeitos ainda não descartados, oito pacientes internados, além disso, na terça-feira (7) recebi um documento do Hospital Irmã Denise (CASU) afirmando que de acordo com aplicação do protocolo técnico do Ministério da Saúde existem 18 pacientes que estiveram ou estão internados com alta suspeição para o covid-19. Além disso, em nossa região, já temos casos confirmados em Manhuaçu, Governador Valadares, Ipatinga, Coronel Fabriciano, Timóteo, mostrando que o vírus já está em nossa região. Não fosse suficiente isso, em data recente, o Ministério da Saúde habilitou 10 leitos de UTI para o Hospital CASU, de todo esse cenário temos um risco epidemiológico claro e direto para a região de Caratinga”.
Esta lista de pacientes que passaram pelo Hospital Irmã Denise foi entregue na terça-feira (7). “Óbvio que neste momento não podemos cravar, porque existe imprevisibilidade da confirmação pela Funed (Fundação Ezequiel Dias). Mas, pelos sinais e experiência médica e as pessoas do CASU tiveram capacitação específica para isso, eles afirmam no sentido que há uma alta suspeição para essas pessoas”.
A respeito destes casos, a reportagem procurou a direção do Hospital CASU que informou que a imprensa acompanha os números de casos suspeitos que passam pela unidade e que muitos deles aguardam resultado de exame. O CASU ainda recomendou que a população continue seguindo orientações dos órgãos de saúde.
HISTÓRICO DE MEDIDAS
Jorge destaca ainda aspectos jurídicos presentes na deliberação n° 17 do Centro de Operações de Emergência em Saúde Pública, que é a recomendação técnica defendida pela Gerência Regional de Saúde, com apoio na portaria 188 do Ministério da Saúde. “E muitas das disposições que foram dadas nessa deliberação, que têm sido seguida por vários prefeitos da nossa região, não foram atendidas no município de Caratinga. Por isso, com esse embasamento técnico dos casos que já temos notificados e ainda não descartados, a quantidade de pacientes internados e as informações que foram repassadas pelo Hospital CASU da alta suspeição desses pacientes, entendi por editar a recomendação no sentido de regulamentar o funcionamento do comércio de Caratinga”.
O promotor relembra que a deliberação 17 consistia no fechamento total de bares, academias de ginástica, clínicas de estética, estabelecimentos comerciais que são situados dentro de centros ou galerias; com turnos parciais de revezamento de funcionamento, que seriam apresentados pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) ao MP de forma a reduzir a aglomeração de pessoas. No entanto, o novo decreto publicado na última quarta-feira (8) não atende à recomendação da Promotoria. “É absolutamente insuficiente e impõe um risco sanitário muito grande para a população de Caratinga. Porque, em primeiro lugar, desconsidera o risco epidemiológico. Nós já sabemos que 80% da população é assintomática, não é necessário que nós confirmemos casos ou internações para poder afirmar que o vírus está em Caratinga. Além de não ter respeitado o devido processo legal para sua edição”.
Conforme apurado pelo Ministério Público, por ocasião de decreto anterior, foi criado um comitê que estava operante, do qual fazia parte a CDL, Associação Comercial e Industrial de Caratinga (ACIC), polícias, representantes dos hospitais e do MP. “Já naquela época considerando o bom senso editamos este decreto, que teve a participação social e por isso teve uma regulamentação adequada quanto ao funcionamento do comércio. Do meu ponto de vista já foi um decreto liberal, porque não determinou o fechamento total do comércio de Caratinga. Indicava que estabelecimentos deveriam funcionar, quais não deveriam funcionar e quais funcionariam em tempo parcial. Não foi suficiente, na última quinta-feira, dia 2 de abril, o prefeito, sem ouvir o comitê deliberativo e a autoridade sanitária que é a secretária municipal de Saúde, no final do dia, dá um decreto com uma liberação ampla e restrita do funcionamento do comércio”.
Para o promotor, o decreto desta semana é “extremamente preocupante”, pois contrariava as deliberações, indo em sentido contrário à declaração de emergência em caráter internacional da Organização Mundial de Saúde e expondo um risco desnecessário à população de Caratinga. “Além disso, a secretária municipal de Saúde tentou intervir para que esse decreto fosse revogado e, mesmo assim, o prefeito insistiu para que o comércio fosse aberto de uma maneira ampla e irrestrita. Pra mim, isso é claro, que nesse momento a Prefeitura abandonou o caráter técnico e sanitário, que devem lastrear as decisões sobre o covid-19 para adotar um critério que é exclusivamente político. Exigiu a necessidade de atuação do Ministério Público por meio da recomendação, dos espaços que foram dados e foram requisitadas informações à Gerência Regional de Saúde, à Polícia Militar e à Câmara de Dirigentes Lojistas para nortear a nossa tomada de decisão a partir de agora”.
Jorge ainda aponta reflexos regionais quanto aos consumidores e má repercussão de dois ônibus oriundos de Caratinga, impedidos de ingressar em Belo Horizonte. “Justamente, porque o município de Caratinga não adotou as medidas de distanciamento e isolamento social. Isso já tem repercutido com uma imagem muito negativa para nossa cidade, nossa população e todo o estado, especialmente, que diversos outros municípios têm feito o seu papel para cumprir as medidas sanitárias que foram preconizadas”.
Como outros fatos que aconteceram no município e demonstram um risco sanitário maior, é citada a chegada na rodoviária de Caratinga de um ônibus de São Paulo, da Viação Kaissara; bem como o grande número de pessoas no centro da cidade. “Sem nenhuma fiscalização direta para realizar naquele momento notificação compulsória para que essas pessoas permanecessem em Caratinga. De todo esse cenário, essas pessoas foram recebidas, oriundas de uma zona suspeita, implementando um maior risco de circulação e propagação do vírus. Fora isso, tem diversos boletins de ocorrências instaurados quanto a aglomerações desnecessárias em filas de instituições bancárias, o que, inegavelmente facilita o contato social mais próximo entre essas pessoas e a própria propagação do vírus”.
DECRETO INSUFICIENTE
No entendimento do Ministério Público, a medida ideal é seguir integralmente a suspensão das atividades de clínicas de estética, salões de beleza, estabelecimentos comerciais situados em centros ou galerias; bares, restaurantes e academias de ginástica, cinemas, clubes e teatros. “Todos esses estabelecimentos devem permanecer fechados. Se o decreto não contempla esses tipos de estabelecimentos é insuficiente, pífio, que não atende a necessidade de segurança à saúde da população de Caratinga”.
O promotor Jorge também questiona o fato de o município reduzir o padrão de segurança na propagação do vírus, se aumentaram os números de casos suspeitos e notificados. “E se temos novos casos de internação hospitalar. Não tem sentido, em Direito temos o princípio da vedação ao retrocesso, que se aplica nesse caso. Se já foi implementado no município um padrão de proteção mais amplo, porque se aumentaram os casos e confirmaram outros casos na região, vou reduzir o padrão de proteção para o funcionamento do comércio? Não faz o menor sentido isso”.
Para o MP, as mudanças anunciadas esta semana pela Prefeitura, que se limitam a somente suspender por 15 dias as atividades de academias; bem como de restaurantes, bares e lanchonetes (funcionando apenas por delivery) não combate o risco sanitário que se propaga em Caratinga de acordo com as informações epidemiológicas.