Eliza Rezende leciona na Escola Professor Jairo Grossi, onde desenvolve um projeto de redação. O assunto começou a ser abordado com os alunos dois meses antes da prova
CARATINGA- Todos os anos, a grande expectativa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) está em torno do tema da redação. Já pensou em acertar a temática que será abordada na prova? Foi o que aconteceu com a professora Eliza Rezende Marques, que leciona na Escola Professor Jairo Grossi.
Em 2021, os candidatos precisaram escrever um texto dissertativo-argumentativo sobre “Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil”. O assunto começou a ser abordado pela professora de Caratinga dois meses antes da prova realizada no domingo (21).
Eliza dá aulas com mentoria de repertórios e redação. Para falar sobre a questão de acertar o tema desse ano, ela prefere frisar um trabalho sério, comprometido com o ensino de grandes eixos, atrelados aos assuntos contemporâneos e relacionados com os temas sociais.
Em entrevista ao DIÁRIO, Eliza explica que as aulas são realizadas, semanalmente, com os alunos do 3° ano do Ensino Médio e esse tema emergiu dentro de um eixo de minorias. “Assim como foi de pessoas desaparecidas; doação de sangue de homossexuais, os preconceitos atrelados à essa questão. E surgiu uma tese de doutoramento que tratava sobre os indocumentados, estudamos e lemos esse repertório como uma forma de criar subsídios para escrever sobre o tema, de uma pesquisa sobre a situação de pessoas no centro do Rio de Janeiro, que não tinham documentos. Interessante, achamos que está atrelado às áreas mais periféricas e não é. O sudeste tem um dos maiores indicadores de pessoas ainda sem documentos. E, a partir desse eixo, estudamos também o conceito de invisibilidade da filósofa brasileira, negra, que é a Djamila Ribeiro”.
Após o estudo de todos os chamados repertórios, que compõem os conhecimentos, referências e visão por meio de diversos campos e experiências no estudo temático; a professora entregou aos alunos uma proposta de redação que tratava sobre a importância do registro civil, documento diretamente atrelado à identidade. “O registro civil é a identidade prima do que tratamos de sujeito de direitos e é o primeiro documento que temos para ter acesso a todos os outros e, principalmente, aos direitos sociais. Logo após essa abordagem em setembro, no mês de outubro os meninos fizeram a proposta, basicamente, desse tema. Fizemos a redação até na última terça-feira, fizemos dois textos. Eles estavam fazendo, em média, de dois a três textos por semana. Me perguntam: Elisa, você adivinhou o tema? Não. Isso é fruto de uma mentoria, um trabalho sério com a Educação e comprometimento com esses meninos”.
Quando foi divulgado o tema da redação do Enem, Eliza revela como foi a reação ao perceber que se tratava do mesmo assunto abordado por ela em sala de aula. “Tenho o hábito de quando começo a ler, tenho a referência. Quando li a referência do primeiro texto motivador a sensação foi incrível, eu não acreditava, o primeiro fragmento de texto foi a tese que eu tinha trabalhado com os meninos. Pensei, não é possível. Quando pego o infográfico, que foi o mesmo, eu já tive a certeza de que meus meninos iam fazer uma excelente prova. Não porque foi adivinhado o tema, mas, porque estavam preparados para qualquer um dos temas que aparecessem e, por sorte, ou trabalho incansável, tivemos esse tema, que trouxe a cara boa dos meus alunos. Eles saíram da prova falando: “Tia Elisa, nós arrasamos na redação e foi do jeitinho que você falou””.
Após a realização da prova, a professora recebeu contatos animados dos estudantes. “Relataram tranquilidade, porque sempre coloco pra eles, independentemente de ser um tema que você já tenha escrito, importante, o mais interessante e no Enem é não perder o foco do recorte. E o recorte se dá pelos textos motivadores, então, independente de terem feito ou não o texto, teriam que ler bem a proposta, para não correr o risco de tangenciar o tema. E foi isso que eles fizeram, como fazem em todos os textos que eles produzem, ler a proposta, fazer um recorte bem feito, a escolha do repertório, porque esse trabalho foi feito de maneira muito séria com eles, nessa proposta nova de mentoria”.
Eliza acrescenta que o trabalho tem feito a escola se destacar e já tem resultados em outras edições do Enem. “Em relação à redação do ano passado, nossa menor nota foi de 880, tivemos até um 960. E esse resultado, esse ano, acredito que vamos continuar mantendo esse nível, porque nosso objetivo aqui não é ser só a melhor escola de Caratinga, mas, queremos despontar dentre as melhores de Minas, quiçá do Brasil. Esse é o nosso compromisso”.
Se tratando de invisibilidade e registro civil, ela acredita que os candidatos poderiam utilizar duas possibilidades de abordagem. “Costumo fazer com os meninos duas proposições de recorte, uma política e uma social. Abordagem política, atrelada a essa ideia de cidadão de direito, enquanto o Estado que é inoperante, uma série de questões governamentais e, por outro lado, como isso é complexo para a sociedade. Por que uma pessoa continua sem documento? Quando a gente fala de miséria humana, a pobreza não está atrelada só à fome, à insegurança alimentar, mas, a essas diversas dimensões dessas incúrias governamentais, dessas negligências que se materializam em coisas como essa, de não tenho documento e tenho vergonha de falar que não tenho. Quantas pessoas não conseguem às vezes o emprego por que não têm documento. Quantas pessoas perdem o acesso, tivemos o caso desses direitos sociais e programas de transferência de renda, pessoas que não tiveram acesso numa situação de pandemia, porque não tinham documento. Acredito que essas múltiplas abordagens poderiam ser feitas não só no aspecto político-social, mas, também emocional”.
De acordo com Eliza são muitos os questionamentos que vêm à tona a partir desta temática. “O que é uma pessoa hoje que não tem documento? Como ela se considera? Qual é a saúde mental dessa pessoa? É como se eu estivesse no mundo e não existisse. São pessoas que são invisíveis e temos que torná-las visíveis ao sistema, pois, se já temos um sistema caótica com as que já são visíveis, imaginem esses que ainda nem entram no cenário, nem são mensurados nesse panorama”.
ESTUDANTES
Lucas Alves Damasceno pretende cursar Medicina Veterinária. Ele realizou o exame este ano e destaca que pensou em contratar um professor particular de redação devido ao período conturbado da pandemia. No entanto, mudou de ideia após conversar com a professora Eliza. “Ela me falou com muita segurança e propriedade que não precisaria, que o trabalho de mentoria dela seria suficiente para a gente atingir o sucesso no final do ano. Percebo que sinceramente foi muito melhor, um trabalho muito bem realizado e pensado. É um processo sequencial, é fruto de um trabalho. A gente fazer a prova e sair com esse sorriso, essa alegria, não é coincidência. É algo muito bem feito”.
A primeira coisa ao pegar a prova é saber o tema da redação, para Lucas, uma grata surpresa. “Quando vimos que era o tema que a tia Eliza tinha trabalhado há menos de um mês, primeiro bateu a ansiedade de não posso perder a média, porque já fiz isso aqui, sei fazer e sou capaz. Uma alegria muito grande. Ela falou desde o início que íamos sair dessa prova sorrindo e foi verdade. Só felicidade, graças a Deus!”.
Direito foi o curso escolhido por Maria Eduarda Genelhu de Araújo. Para isso, ela também realizou o Enem e contou com as aulas de mentoria. “A tia Eliza trabalha com um projeto de texto, que se encaixa em qualquer tema. Foi esse que usei, realmente dava para encaixar em qualquer tema que eu fosse usar. Eu já estava com a redação bem na cabeça, falei mais sobre questão de cidadania mesmo, busquei repertórios, a Constituição, na proposta de intervenção também usei a PEC 241. Eu estava muito nervosa, mas, graças a Deus deu muito certo”.
Letícia Lanes de Paiva quer cursar a faculdade de Jornalismo e relata experiências anteriores com o Exame do Ensino Médio. “O interessante é que sempre deram pra gente a base de uma redação Enem, é como se fosse uma forma de bolo que você vai encaixando em cada pedacinho que tem que ser encaixado, para ter a nota nas competências. Mas, eu tive uma defasagem, quando fiz a prova no 2° ano, tipo treineiro, abri a prova, achei um tema sensacional e não me vinha nada na cabeça. Fiz, foi uma nota boa, interessante para 2° ano, mas, não me senti satisfeita com minha redação, porque é uma coisa que amo fazer, gosto muito de escrever”.
Ela conversou com a professora Eliza com o objetivo de montar um projeto em que a estudante conseguisse mostrar seu conhecimento dentro da. Em 2021, o desempenho foi aprimorado, como destaca Letícia. “Gosto muito de escrever, ter liberdade dentro do meu texto, de ter alguma coisa com a minha cara. Li vários livros, várias coisas e acabei jogando um texto falando sobre um livro que eu li: Ideias para adiar o fim do mundo, de um indígena brasileiro Ailton Krenak. Pensei que eu tinha que jogar essa ideia no meu texto, coloquei lá e deu exatamente para esse tema. Tivemos essa base, esse acompanhamento. Só não quis quem não procurou, porque houve muito esforço, tanto nosso quanto da professora Eliza”.
- Recortes da tese trabalhada pela professora Eliza mostram mesmo tema da prova do Enem
- Tema do Enem 2021
- Lucas Alves pretende cursar Medicina Veterinária e está satisfeito com seu desempenho na redação
- Direito foi o curso escolhido por Maria Eduarda Genelhu
- Letícia Lanes quer cursar Jornalismo e relata suas experiências
- Professora Eliza destaca trabalho de mentoria desenvolvido com os estudantes
- Eliza abordou invisibilidade e registro civil