Recuperandos poderão emitir a segunda via de documentos, converter uniões estáveis em casamentos e solucionar pendências diversas
CARATINGA- A Associação de Proteção aos Condenados (Apac) de Caratinga é a primeira do País a contar com um Posto de Atendimento Pré-Processual (Papre) ou Posto de Cidadania. A inauguração oficial ocorreu na tarde de ontem e contou com a presença de autoridades locais e dos recuperandos da unidade. Também prestigiaram o evento, o juiz auxiliar da 3ª vice-presidência, José Ricardo Veras e o juiz auxiliar da presidência, Luiz Carlos Rezende e Santos, ambos do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
O juiz Anderson Fábio Nogueira Alves, diretor do foro e coordenador do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) local, frisa que a Justiça identificou a demanda da Apac para este tipo de serviço, a partir dos cursos que são ofertados pelo Sebrae. “O Sebrae veio até a Apac de Caratinga para treinar os recuperandos, para que eles pudessem desenvolver os negócios próprios, empreendimento, fazer os cursos de costura e de padaria. E aí constatou-se uma dificuldade que esse público tem de documentação, por exemplo, para se inscreverem no curso oferecido, precisariam ter o CPF e muitos deles não tinham e devido à questão de estarem reclusos não conseguiam tirar, ir até a Receita Federal”.
Conforme o magistrado, a parceria foi firmada de modo a facilitar esta questão. “O Cejusc tem uma parte do atendimento que é de cidadania. Então, às vezes, a pessoa não precisa ter um processo, mas ela tem um problema que precisa resolver e o Judiciário pode auxiliá-lo. É o caso do exemplo do CPF. O recuperando muitas vezes perdeu os documentos e ele não tem como pesquisar o CPF, então é feito um pedido, um requerimento, a pesquisa é feita dentro dos sistemas que o Tribunal de Justiça têm acesso e a gente retorna com o número do CPF, para poder viabilizar esse treinamento, esse curso, às vezes uma carteira de trabalho ou futuramente abrir pra ele uma MEI para ele poder desenvolver a atividade econômica”.
Para atuar no posto de atendimento que foi instalado em uma sala da Apac, os profissionais da instituição foram treinados pelo Poder Judiciário. “Eu estive aqui na Apac, treinei os funcionários que vão trabalhar nesse posto de atendimento e participaram também de parte do treinamento, alguns recuperandos do sistema do regime fechado, alguns do semiaberto, porque a gente não quer retirar o que é o sistema da Apac. O sistema da Apac é recuperando ajuda o outro recuperando, então precisa do recuperando ser capacitado também para poder explicar para os outros internos, o que é o projeto, o que eles vão poder ter e com isso desenvolver ainda mais o método Apac”.
Dentro do setor de cidadania do Cejusc, além da parte documental, também há algumas questões consideradas de “acertamento de registro”, que também estarão disponíveis, como frisa o juiz Anderson. “Reconhecimento de paternidade vai poder ser feito, divórcio vai poder fazer também. Há 15 dias teve um casamento coletivo aqui na Apac, com atuação direta do Cejusc, porque fazemos a conversão da união estável em casamento civil. Muitas vezes já estão há anos convivendo em união estável, já tinham filhos adolescentes e, a partir desse projeto, O Cejusc consegue além de casar a pessoa da data da cerimônia pra frente, convalidar para o casamento valer desde o começo da união estável, desde o primeiro filho do casal”.
O presidente da Apac, Jairo Ferreira Gomes, afirma que o atendimento pré-processual é mais uma ferramenta para solucionar demandas de forma rápida e descomplicada. “Nós estamos muito alegres em sediar esse evento e a implantação desse sistema que vai muito nos ajudar no trabalho desenvolvido. É um grande ganho para a nossa sociedade, comunidade, Caratinga região, porque, realmente vai nos auxiliar e muito na reinserção desse indivíduo na sociedade. O Cejusc vai nos ajudar em toda a documentação, as pessoas estão saindo daqui com a vida delas resolvida, não tem aquela burocracia. É uma grande responsabilidade pra nós, já estamos com a equipe treinada e já começamos a desenvolver, somos a primeira de Minas Gerais e a primeira do Brasil a começar esse processo”.
MODELO
O juiz José Ricardo Veras frisou o conceito de cidadania que está sendo difundido dentro da Apac, a partir desta inauguração. “O Cejusc tem o setor cidadania, que é um dos mais importantes para a política de autocomposição, porque hoje o Poder Judiciário é um poder multiportas, então, o cidadão não encontra apenas a porta do processo judicial, encontra também o acolhimento, uma orientação enquanto uma possibilidade de fazer um acordo pré-processual, de forma muito mais rápida e eficaz. O setor de cidadania, que é o que nós temos hoje na Apac de Caratinga, permite efetivamente que a pessoa seja um cidadão e que ele possa ser recebido como tal, com respeito, com educação, orientado e encaminhado adequadamente para a solução do problema que ele precisa. O posto de Cidadania aqui dentro da Apac, dentro do sistema prisional é o primeiro do País. Temos certeza que é uma experiência que será altamente proveitosa e exitosa e nós pretendemos estendê-la para outras regiões do Estado”.
Para o juiz Luiz Carlos Rezende e Santos, a inauguração de um Papre dentro de uma Apac representa mais um “braço” do Tribunal de Justiça, para aproximar a prestação jurisdicional do jurisdicionado. “É facilitar, fazer com que as pessoas alcancem sempre os seus interesses e os seus direitos o mais rápido possível, evitando as demandas repetitivas, cansativas e desgastantes às pessoas. A Apac foi uma ótima escolha para se testar uma experiência como essa dentro do sistema prisional”.
O juiz Luiz Carlos também enalteceu a Associação de Proteção aos Condenados de Caratinga, considerando um modelo pela eficiência dos trabalhos desenvolvidos. “A gente vê que houve uma receptividade muito grande dos mineiros com relação à proposta das Apacs e não é apenas do Poder Judiciário, talvez da própria comunidade de compreender de que o problema do sistema prisional não é do Executivo nem do Estado, mas de todos nós. E no Estado de São Paulo, as Apacs deixaram de funcionar no final da década de 90, exatamente por causa dessa incompreensão. Minas adotou esse modelo e deu muito certo. Eu me lembro quando estive aqui, quando estava terminando essa obra em Caratinga e ainda dependia de concluir o regime fechado. Mas, a gente tinha convicção de que o povo já tinha acolhido, porque a Apac é uma escolha”.
A unidade local está auxiliando na implantação de uma Apac no Espírito Santo, o que demonstra que o método tem sido aplicado com excelência, como finaliza o magistrado Luiz Carlos. “Hoje, quando o Tribunal se propõe a ajudar os outros estados da federação, como acontece no Espírito Santo, o faz com a expertise dos trabalhos desenvolvidos nas unidades e Caratinga chegou a um nível de excelência muito considerado por nós. Então, acho que ela é um excelente exemplo para os irmãos capixabas”.