Ildecir A. Lessa
Advogado
“Não há, senhores, corpo sem células. Não há estado sem municipalidades. Não pode existir matéria vivente sem vida orgânica. Não se pode imaginar existência de nação, existência de povo constituído, existência de estado, sem vida municipal”. (Rui Barbosa Habeas corpus em Defesa da Autonomia dos Municípios Baianos). No dia 1º de janeiro de 2017, mais de 5500 novos prefeitos tomaram posse em todo o Brasil, em evento que é conhecido como cerimônia pública. No âmbito oficial, não existe cerimônia pública mais importante do que a posse dos representantes legitimamente eleitos dos cidadãos: os vereadores, os prefeitos e os vice-prefeitos. É o momento mais marcante do município em termos oficiais, é o apogeu da cidadania e da democracia. A cerimônia de posse dos vereadores, do prefeito e do vice-prefeito, quando eles prestam o seu compromisso, ocorre durante a realização de uma sessão solene. Cada etapa da cerimônia, normalmente, está prevista na Lei Orgânica do Município (LOM) e detalhada no Regimento Interno da Câmara Municipal.
A Lei Orgânica Municipal, a partir da Constituição Federal de 1988 (CF), detalhou uma nova realidade, que se impôs na relação entre os poderes. É estabelecida uma tendência de autonomia política e administrativa municipal que, na prática, seria legitimada nas correspondentes constituições federal e estaduais, e especificamente nas leis orgânicas municipais. Portanto, a Administração Pública é cercada por instrumentos de controle que, muitas vezes, são desconhecidos dos agentes, sejam servidores, sejam políticos. Logo, já se vê que a autoridade não está sozinha no exercício das suas atividades. Existe, à sua volta, uma ampla estrutura de vigilância. Erra aquele que acredita que, investido de autoridade, tudo pode. Ao contrário, pode menos do que um cidadão comum. O administrador público – como todo funcionário – só pode fazer aquilo que a lei lhe autoriza e da forma que a lei comanda. Com a vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal, o Controle Interno ganhou força. É bem verdade que ninguém gosta de ser controlado. Mas o administrador eficiente não pode desprezar a prevenção da rotina dos seus ofícios. É fundamental entregar a atividade de controle a pessoas com conhecimento técnico e com sensibilidade administrativa.
As matérias são complexas. Envolvem questões como ordenar despesas, cota de pessoal, prestação de contas, licitações, contratos administrativos, etc. Logo, áreas de conhecimento especializado. E isso não pode ser tratado por funcionários quaisquer. Mas, além do conhecimento, esses profissionais precisam ser sensíveis. Têm que ser hábeis para discernir questões de interesse público; para interpretar a lei dentro do espírito do legislador. Na medida em que o gestor tem uma estrutura de controle bem formatada, composta por pessoas que foram escolhidas atendendo ao perfil, é hora de tirar proveito. Como? Aconselhando-se com esses profissionais; reunindo-se com eles para examinar previamente aspectos técnicos dos seus atos. E, claro, registrando tudo. Se, posteriormente, esse administrador for questionado por uma Corte de Contas, terá elemento valioso de defesa. Estará resguardado, uma vez que poderá demonstrar que, na ocasião própria, procurou se cercar das devidas cautelas. Valorize o Controle Interno. É melhor resguardar-se com o aconselhamento de profissionais dentro do órgão do que esperar que terceiros, de fora, apontem a irregularidade dos atos. Sabemos que a prática política tem feito com que o gestor municipal contorne esse controle mediante relações promíscuas. Primeiro, porque muitas vezes os próprios vereadores não estão conscientizados da amplitude do poder e das responsabilidades que têm; segundo, porque dependem, para a própria sobrevivência eleitoral, de favores do prefeito. Então, este é ambiente propício para a promiscuidade, que atende a interesses duvidosos de ambas as partes. Esse quadro de negociação e de tolerância não é raro. Não há Município que já não o tenha assistido. Mas não é o fato de ser comum que deve levar ao descrédito do sistema. Por isso é que se estuda e busca-se aplicar o melhor direito. E, nesse prisma, cabe assinalar essa prática e dizer que ela, ainda que repetida e corriqueira, é ilegítima e imoral. O gestor municipal deve valer-se da possibilidade de consulta ao Tribunal de Contas. O Regimento Interno dessas Cortes contempla a possibilidade de o gestor fazer consultas em tese. Com isso, tem mais uma forma de resguardar-se. Também, é importante que o serviço jurídico esteja atendo à jurisprudência dos Tribunais de Contas. Conhecendo como os Tribunais de Contas têm decidido sobre certos atos, o gestor terá uma referência segura. Estará, portanto, protegido. O administrador idôneo, seguro, sabe impor-se pelos seus méritos e não precisa bater na porta dos favores. Até porque o gestor que colocar o seu mandato sobre esse tipo de alicerce, não conseguirá elevar-se por muito tempo. Será um eterno refém, sujeito a todo tipo de chantagem. Por força da Constituição Federal, nada escapa do controle judicial. Tudo, absolutamente tudo, pode ser levado à apreciação de um juiz. A lei coloca institutos jurídicos à disposição de cidadãos, dos administrados, da sociedade organizada e do Ministério Público. Todo gestor público – político ou funcionário deve ler atentamente o que o Código de Penal relaciona como CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. Também deve ler a Lei nº 8.429/92 – Lei da Improbidade Administrativa -, pelo menos nos artigos 9º, 10 e 11.Com essas duas leituras – e a observância do que ali está posto – pode-se dizer que muitos dissabores serão evitados. O Controle Social não está formatado como um sistema oficial, mas é, exatamente, o que mais funciona, pela cidadania, por intermédio do voto e, pela imprensa, noticiando, fiscalizando e denunciando.
Atualmente, com o pleno exercício democrático, amplia-se essa forma de controle. A imprensa está presente, com total liberdade. Uma notícia desabonadora pode representar, às vezes, uma condenação pública perpétua. O gestor deve ter em mente essas formas de controle. Toda vez que for tomar uma decisão, é preciso prever a repercussão que ela terá nesse universo. Por exemplo: Quem atua na Administração Pública municipal precisa estar atento à especial vigilância do Ministério Público. O maior número de agentes públicos responsabilizados por improbidade administrativa está nos Municípios. Todo gestor hoje precisa estar atento aos pontos vulneráveis da Administração. São eles: LICITAÇÕES – Dizem respeito direto ao emprego de recursos públicos. Não realizar licitação, quando a lei a exige, é crime. CONTRATOS – Feita a licitação, virá a execução do contrato. A lei manda nomear fiscal para acompanhar. Não o fazendo, o gestor atrai para si toda a responsabilidade pelos prejuízos que decorrem da má-execução. RESPONSABILIDADE FISCAL – É sabido que a impropriamente chamada Lei de Responsabilidade Fiscal trouxe um novo elenco de atribuições ao gestor. Na verdade, no seu primeiro artigo, a lei indica o ponto de cautela: ela não é lei de responsabilidade fiscal, mas é lei de responsabilidade do gestor na gerência fiscal. RECURSOS HUMANOS – Muitas pessoas se referem à Administração Pública como máquina administrativa. Não é máquina, é serviço. Máquina tem parafusos, engrenagens, peças de impulsão mecânica. Serviço tem gente! O gestor que não desenvolver uma boa política de recursos humanos – que tratar o funcionário como equipamento – corre, no mínimo, riscos de resultado. COMUNICAÇÃO – O outro ponto vulnerável é a má comunicação com a sociedade. É grande o números de competentes administradores que deixam a prefeitura praticamente linchados pelo povo. E por falar em comunicação, comunica-se neste artigo, uma homenagem à posse de todos os prefeitos eleitos no Brasil, principalmente colocando a responsabilidade como meta administrativa até 2020!