A transferência aconteceu um pouco antes da criança completar dois anos, prazo limite para que ela tome o remédio mais caro do mundo
BOM JESUS DO GALHO – O Ministério da Saúde acaba de depositar a diferença do valor até agora arrecadado pela família de Rafael Gonçalves Pelincari, de um ano e onze meses, para aquisição do Zolgensma, considerado o remédio mais caro do mundo e avaliado em R$ 12 milhões. A decisão, que atende uma determinação da Justiça Federal, trouxe mais esperança aos pais de Rafa, que correm contra o tempo para salvar o filho com Atrofia Muscular Espinhal. O DIÁRIO DE CARATINGA ouviu o Adriano Euzébio Pelincari, pai da criança em tratamento.
Adriano, como foi a corrida contra o tempo atrás de um recurso tão alto para garantir o que não tem preço, a vida de um filho?
Foi algo indescritível. Desde o dia 2 de dezembro de 2020, quando o Rafa foi diagnosticado com a Atrofia Muscular Espinhal, minha esposa Elaine deu início à campanha. Ela foi o alicerce do movimento que envolveu toda a nossa família, sempre nos estimulando a lutar sem desistir. Essa luta vem muito da mãe do Rafa.
Como a campanha ganhou força e conquistou o coração das muitas pessoas que contribuíram?
Recebemos ajudas de todas as formas. Foram orações, doações. Tudo a partir da divulgação, do engajamento da mídia, de artistas, de jogadores de futebol, de várias pessoas influentes fundamentais para dar credibilidade à campanha, que ajudaram a divulgar a nossa luta pela vida do nosso filhinho, por uma qualidade de vida melhor para ele. Isso contribuiu bastante, conquistou as pessoas.
Qual o momento da campanha foi mais desafiador?
Aconteceram a cada não recebido. Ao todo, foram seis. Não de quando a gente entrou contra a Unimed, não quando a gente entrou contra a União, não quando a gente entrou contra o município de Contagem, conta o Estado de Minas Gerais. Esses nãos aí foram desafiadores, mas, graças a Deus, Ele nos dava mais força para continuarmos e não baixarmos a cabeça.
Que força é essa que não deixou vocês se curvarem aos contratempos enfrentados nesse período?
Foi Deus, foi Jesus Cristo que não nos deixou desanimar. Independente das críticas que a gente recebia de pessoas nas redes sociais, por telefone, no face a face, presencialmente. Deus segurou as mãos do Rafinha e de toda a família para seguirmos em frente e alcançar nosso objetivo. Temos que completar essa missão.
Como você descreve o momento do ‘sim’ ao Rafa, quando você soube da liberação do recurso para a aquisição do remédio, principalmente, por ter ocorrido muito às vésperas da data limite indicada para a ministração do medicamento?
A Elaine recebeu a resposta às 17h49 da última quinta-feira (1). Ela ficou muito emocionada. Chorou, agradeceu a Deus. Eu estava na rua nesse momento e, quando cheguei, por volta de 18h30, ela me contou. A notícia tirou um fardo das nossas costas. Agradecemos a Deus por essa força que Ele estão nos dando, por essa vitória. É momento de agradecer a todas as pessoas colocadas na nossa vida como anjos para nos ajudar.
Agora, quais são os próximos passos para que o Rafa receba a medicação?
Acabamos de pagar o medicamento, que deve chegar entre 15 e 30 dias. O Rafa vai passar por vários exames para, então, tomar o medicamento. Os exames já foram realizados uma vez, mas vamos precisar repetir todos, pois já venceram o prazo de validade. Depois, vamos para São Paulo onde daremos início a uma outra maratona, fisioterapia, TO, fonoaudiólogo. Assim por diante, mas o maior desafio, graças a Deus, vencemos.
AME
Rafael Gonçalves Pelincari sofre de Atrofia Muscular Espinhal (Ame), uma doença que causa fraqueza, hipotonia, atrofia e paralisia muscular progressiva. Essa enfermidade, que afeta aproximadamente um em cada dez mil crianças e é a principal causa genética de morte em bebês, vem afetando a qualidade de vida de Rafael, que tem dificuldade em dormir, por causa das dores musculares; de se alimentar e até de respirar.
Os primeiros sintomas da doença foram percebidos pela avó de Rafael quando ele tinha seis meses. A criança apresentava atraso motor, dificuldade em firmar as perninhas, em sustentar a coluna cervical, o pescoço, diferente do que se espera de um bebê em sua idade. Desde então, a família passou a buscar ajuda médica, especialistas que pudessem identificar o que estaria motivando essa dificuldade. “Foi uma longa caminhada, com muitas consultas, realização de muitos exames até que, em dezembro de 2020, recebemos o diagnóstico da doença do Rafa e já demos início à campanha para aquisição do medicamento mais caro do mundo, o Zolgensma, que custa R$12 milhões. Apenas uma aplicação desse fármaco já surte efeito contra a doença, mas ele não é disponibilizado pelo SUS”, recorda Adriano Pelincari.
Ele explica que a Ame é causada por um defeito genético que altera a produção de uma proteína necessária para a musculatura do corpo. A falta dessa substância leva à perda de neurônios motores e resulta em fraqueza e paralisia muscular progressiva. O remédio Zolgensma é capaz de transportar a proteína para dentro da célula, corrigindo o DNA afetado. Isso significa que crianças que não andariam e mal conseguiriam respirar sozinhas ganham de volta a força muscular”, explica Adriano.
Além do desafio de conseguir acesso ao remédio, a família trava uma dura batalha contra o tempo, pois a medicação precisa ser ministrada em crianças com até dois anos de idade e a cada dia, Rafael vai tendo mais neurônios comprometidos. Com o valor em mãos, Adriano fala que a família tem sua esperança renovada.
AÇÃO
A família de Rafa contou com os serviços da advogada Daniela Tamanini, conhecida pela atuação em casos parecidos. A decisão foi do juiz federal substituto William Ken Aoki, da 3ª Vara Federal Cível da Seção Judiciária de Minas Gerais. Anteriormente, o magistrado havia negado o pedido da família do Rafael baseado em argumentação de um parecer médico do Núcleo de Avaliação de Tecnologias em Saúde (NATS), que questionou o uso do medicamento para tratamento da enfermidade.
O remédio é produzido pela suíça Novartis e promete neutralizar em crianças de até 2 anos os efeitos da AME, doença rara que pode causar a morte antes mesmo dessa idade. Até 2017, não havia tratamento no Brasil.
- Adriano e o filho Rafa. A família foi um exemplo de perseverança. A fé foi fundamental nessa situação (Foto: Arquivo)
- Rafa irá receber o remédio (Foto: Arquivo)