Ildecir A.Lessa
Advogado
Todo esse quadro especulativo sobre o julgamento de Lula, aconteceu, na data de 22/03/2018, quando o Supremo Tribunal Federal levou a julgamento pedido de Habeas Corpus apresentado pelo ex-presidente Lula da Silva, que pretende aguardar em liberdade recursos ao STJ e STF contra a decisão do TRF da 4ª Região. O HC, como fartamente anunciado na mídia, só foi colocado em pauta após e em razão de uma forte campanha de políticos e pessoas ligadas aos ministros do Supremo por laços familiares ou de amizade. Após longas discussões sobre o cabimento de HC, o julgamento foi suspenso e dado salvo-conduto ao condenado, assegurando-lhe aguardar em liberdade o julgamento final, marcado para esta quarta-feira.
Nada pode-se falar sobre o mérito do HC. Mas tão somente sobre o motivo do adiamento, ou seja, a viagem marcada pelo ministro Marco Aurélio. A justificativa para o pedido de adiamento foi o compromisso do magistrado em dar uma palestra no 15º Colóquio da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, no Rio de Janeiro. Contudo, por mais importante que fosse o colóquio, ele não se sobrepõe a um julgamento na Suprema Corte. O Código de Ética da Magistratura, editado pelo CNJ, afirma: Art. 21. “O magistrado não deve assumir encargos ou contrair obrigações que perturbem ou impeçam o cumprimento apropriado de suas funções específicas, ressalvadas as acumulações permitidas constitucionalmente”. Ou seja, o ato do Ministro foi errado. Como também o é, a ausência do Ministro Gilmar Mendes, no julgamento desta quarta-feira. A premissa é de que magistrados de todas as instâncias não devem sobrepor à sua atividade principal. O compromisso com o julgamento célere é ético.
O certo é que, estamos diante de um Supremo Tribunal Federal partido no meio, que pode usar o julgamento do para derrubar uma jurisprudência definida pela Corte dois anos atrás e impedir a prisão de alguns réus. A pressão é gigante. Membros do Ministério Público e do Poder Judiciário entregaram na tarde desta segunda-feira (2) no Supremo Tribunal Federal, um abaixo-assinado com mais de 5 mil assinaturas contendo argumentos a favor da manutenção da possibilidade de prisão de condenados em segunda instância.
Na mesma toada, em oposição, um grupo de advogados entregou nesta segunda-feira (2) ao Supremo Tribunal Federal um abaixo-assinado com cerca de 3,6 mil assinaturas pedindo que a Corte julgue duas ações pendentes e só permita prisões de condenados após o julgamento de todos os recursos possíveis em todas as instâncias da Justiça. O Supremo Tribunal Federal está em um impasse sobre a marcação cerrada da mídia. Ao mesmo tempo que precisa reafirmar as conclusões das decisões proferidas pelo colegiado no HC 126.292 e nas ADCs 43 e 44, encontra-se com a prisão de Lula. A tendência é manter as conclusões anteriores, autorizando a prisão após a segunda instância, sustentando a tese de que, com o exaurimento das questões fáticas, justifica-se a prisão.
Uma especulação: o STF vai denegar a ordem, dizer o mesmo, mas com efeitos diferentes, preservando o efeito suspensivo do Superior Tribunal de Justiça, por apertada maioria. Confirmará, assim, a diretriz do HC 126.292: “CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado”.
Assim, após o julgamento em segundo grau, tanto no TRF, como em qualquer Tribunal de Justiça, a prisão depende da posterior negativa de seguimento do recurso especial pelo STJ, dada a possibilidade prevista em lei de se conferir o efeito suspensivo. No julgamento das ADCs 43 e 44, restou ementado: “No âmbito criminal, a possibilidade de atribuição de efeito suspensivo aos recursos extraordinário e especial detém caráter excepcional (art. 995 e art. 1.029, § 5º, ambos do CPC c/c art. 3º e 637 do CPP), normativa compatível com a regra do art. 5º, LVII, da Constituição da República. Efetivamente, o acesso individual às instâncias extraordinárias visa a propiciar a esta Suprema Corte e ao Superior Tribunal de Justiça exercer seus papéis de estabilizadores, uniformizadores e pacificadores da interpretação das normas constitucionais e do direito infraconstitucional”. Em termos práticos, mantém a possibilidade de prisão depois de encerrado o julgamento dos recursos ordinários, mas declara que o ato de prisão não pode ser automático e se submete a eventual interposição de recurso especial e/ou extraordinário, bem assim da decisão da Presidência (ou Vice, em alguns tribunais) de negar provimento ao recurso, bem assim ao agravo interposto ao STJ, em que o efeito suspensivo possa ser conferido pelo relator do STJ (e depois STF). Com essa decisão, o STF preserva genericamente a possibilidade de prisão em segundo grau, ampliando somente o momento da prisão, que deixa de ser imediato e passa a ser depois de negado seguimento e/ou efeito suspensivo ao recurso, à mercê de um efeito suspensivo. Esta decisão pode manter a decisão anterior — prisão em segundo grau —, mas com requisitos e efeitos diversos. Assim, a ordem deve ser denegada, mas esclarecido o procedimento para prisão, sublinhando que deve ser negado o efeito suspensivo.
O HC de Lula será denegado, mas a prisão imediata de Lula, impedida pelo esclarecimento constante no voto majoritário. É apenas a nossa opinião sobre o jogo do processo penal. Nesta quarta-feira, o Brasil poderá conferir o resultado.