Zilanda Souza – Neuropsicopedagoga
Minha profissão me dá o privilégio de conhecer diversas histórias, experiências e poder contribuir e aprender com elas. Recebo todos os dias crianças e adolescentes que não correspondem às cobranças escolares e familiares. Tiram notas baixas, não cumprem obrigações dentro dos prazos. A maioria já chega falando que perdeu o direito do uso do celular, do videogame, o passeio com os amigos e estão suspensos do futebol. Um ciclo interminável: cobrança – não resposta – castigo. Pais desgastados. Mães sem voz (a maioria grita, mas não assume). A impressão que dá é que o caminho entre a infância e a adolescência – a infantolescência – tem penalizado essa garotada com a invisibilidade do ser. Então passa a existir apenas o que deve ser feito. Existir depende do resultado da tarefa imposta. Você é, se você faz, e bem feito, por favor!
Esses meninos e meninas chegam aos 11, 12 anos e ganham a solidão de presente! Sob uma fumaça de distorção, ouço pais conversarem sobre seus filhos como se eles tivessem 30 anos. Então faço um teste simples, que gostaria que você leitor (se for pai ou mãe), fizesse. Tente responder essas perguntas:
- Quanto tempo você passa junto com seu filho, sem fazer cobranças? Ensinando, descobrindo um novo caminho, ouvindo-o contar sobre o novo jogo de videogame, a nova paixão da escola, a preferência musical, o treino no futebol?
- Quando foi a última vez que ensinou algo ao seu filho? Desde colocar a corrente na bicicleta a fazer um sanduíche? Lavar o tênis e arrumar a cama?
- Quando foi feito o último elogio, dissociado de um resultado ou posição?
- Quando foi a última vez que sentaram juntos para montar esquemas de organização da semana, do quarto, dos brinquedos, dos planos de estudos, sem que tenha sido movido pela pressão da nota baixa ou ameaça da recuperação?
Então a fumaça vai dando lugar a consciência de que estamos falando de garotos e garotas. Eles não têm 30 anos! As áreas do sistema nervoso dessa meninada, que respondem às funções de autogestão, responsabilidade, planejamento, memória estão abertas a estímulos, modelos, treinos e rituais saudáveis. Elas aguardam por um ambiente, por um tempo cronológico e por pais que sejam suas referências na construção desse processo de SER! E por mais que eu estude e pesquise, eu volto para as minhas rimas, inspiradas no amor! O que faz com que os pais respondam satisfatoriamente as 4 questões aí em cima, é a qualidade de amor que é desenvolvido ao longo da vida. Nossos meninos tem ganhado de presente a solidão por causa de um rebaixamento do significado de Amar: “Amar foi reduzido a trabalhar arduamente para bancar uma estrutura chamada casa. Amar é oferecer celular, brinquedos, boa comida na mesa, boa escola, futebol e inglês”. E em nome disso, não se tem mais tempo para construir o SER dos nossos meninos, na simplicidade da vida. Sem perceber, esse amor rebaixado vai transformando os pais em pais de reuniões de fim de trimestre, da cobrança e da bronca. Os pais que pagam as contas. Sem tempo para observar quem são seus filhos, suas habilidades e fragilidades. Sem tocá-los no caminho diário da vida. Na adolescência então, ouve-se apenas os choques das trombadas. Esse amor reduzido esfria o vínculo, desautoriza a voz diretiva dos pais e torna cada cobrança apenas uma imposição infundada e injusta, não amparada pelo amor que ama o ser, que caminha diária e incansavelmente, ensinando, protegendo e estabelecendo a ordem!