Ildecir A.Lessa
Advogado
Segundo os informes econômicos, o endividamento dos brasileiros vem atingindo recorde sobre recorde. O porcentual de famílias com dívidas saltou para 66,2% no mês de junho, o maior patamar da série histórica da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), iniciada em janeiro de 2010. A inadimplência também subiu e a expectativa é que aumente por causa do Covid-19. De acordo com o levantamentos do IPEA o porcentual de famílias com dívidas ou contas em atraso chegou a 25,3% em junho, contra 24,1% no mês anterior. As informações econômicas consideram como dívidas as contas a pagar em cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, empréstimo pessoal, prestação de carro e seguro. O total de famílias que declararam não ter condições de pagar suas contas ou dívidas em atraso e que, portanto, permaneceriam inadimplentes passou a um patamar bem alto.
De outro lado, o número de mortes continua aumentando. O confinamento da população tem trazido sérios problemas. Os hospitais estão com a capacidade no limite de lotação. Mas, o superendividamento é trágico porque grande é o contingente de pessoas sem o mínimo existencial necessário para se manterem em estado de sobrevivência, privados de acesso à alimentação e aos medicamentos, nem tampouco possuem recursos para o pagamento dos serviços públicos essenciais à sobrevivência.
Dados obtidos dos órgãos de pesquisa, apontam que, no Brasil o nível de endividamento já chega na casa dos 30 milhões da população. Esse estado de coisas, sem dúvida alguma, foi gerado pela pandemia da Covid-19, que trouxe esse grande endividamento e até um superendividamento dos consumidores em âmbito nacional. A queda brusca da situação financeira, provocada pelo quadro atual, atingindo patamares elevados do desemprego, com a inevitável redução de salários, suspensão de contratos de trabalho e até mesmo com a impossibilidade de locomoção para o desempenho de atividades profissionais para grande parte da população já foi constatada por estudos oficiais no Brasil. A redução da renda da pessoa nesta situação, de maneira não ocasionada por conduta a si imputável, é geradora de endividamentos que afetam até mesmo o pagamento de contas básicas de consumo, como é o caso do pagamento das mensalidades escolares neste cenário.
As informações dos dados oficiais do Ministério da Economia apontam que mais de 7 milhões de brasileiros já tiveram redução de jornada e salário ou suspensão do contrato de trabalho em todo o país, o que representa mais de 20% (vinte por cento) dos empregados com carteira de trabalho no setor privado. O grande problema disso tudo é que, o superendividado passa a carregar o estigma do “devedor”, enfrentando dificuldades para se reinserir no mercado de trabalho, numa rotina de marginalização e punição. Incluído nos cadastros de restrição ao crédito, não consegue celebrar novos contratos. A situação extrapola a pessoa do consumidor, se tornando fonte de tensões na família e acarretando defasagem na educação dos filhos, crises conjugais, problemas de saúde, baixa produtividade no trabalho. Anulado pelo mercado e transformado em “refugo humano”, gera alto custo social e demanda dos poderes públicos uma solução a fim de contornar a miserabilidade completa.
Tudo isso vem a gerar um momento de grande instabilidade, sendo certo que, a maioria desses problemas irão desaguar no Judiciário que, deve preparar e adequar para administrar e julgar esses novos problemas, em virtude da pandemia da Covid-19. Mesmo as legislações e providências que estão sendo tomadas a nível governamental, certamente serão alvos de questionamentos junto ao Judiciário. O endividamento dos brasileiros, constitui portanto, uma nova pandemia a ser enfrentada.