Daniel Dornelas*
Davi morreu há um mês. A dor de perder meu irmão gêmeo é imensurável, assim como a dor de nosso pai. No entanto, nada no mundo pode se comparar a dor de uma mãe que sepultou um filho.
Davi viveu 22 anos sob os cuidados intensos de nossa mãe. Ela foi a grande protagonista dos cuidados de meu irmão. Durante 8.135 dias, Davi desafiou as estatísticas de uma doença rara e contou com a nossa mãe em tempo integral, da alimentação ao banho. De casa ao leito de UTI. Da cadeira de rodas aos braços que o seguraram firmemente.
Maio chegou com um vazio. Os comerciais de TV, as publicidades na internet e os anúncios em lojas falam sobre presentes e felicidade. Como vivenciar isso sem a presença de um filho?
Nada se fala sobre o luto no dia das mães. A dor torna-se ainda mais invisibilizada na pluralidade da maternidade:
A mulher que perdeu o único filho.
A mulher que teve outros filhos, mas está enlutada pela perda de um deles.
A mulher que gestou, mas sofreu um aborto.
A mulher que perdeu um recém-nascido.
A mulher que desejou, mas não conseguiu viver a maternidade.
Todas são mães. Todas vivem o luto.
O marketing faz tudo parecer fácil e lindo na vida de uma mãe. Porém, fora das telas, sabemos que não é assim. A maternidade, como tudo na vida, é feita de momentos bons e ruins. Há dores que o mundo finge não ver. Há uma sobrecarga que geralmente é vista com positividade.
Mães sobrecarregadas são chamadas então de guerreiras.
Não é uma guerra. Essa metáfora é ainda mais presente na rotina de mães de pessoas com deficiência. Aos olhos da sociedade, cuidar de alguém por longos períodos é encarado como um combate. Sofrimento.
Repito: não é uma guerra. Pelo menos, não precisaria ser se houvesse amparo de qualidade no sistema de saúde e políticas públicas de suporte. Não precisaria ser se o cuidar fosse encarado como uma atividade humana, não apenas das mulheres.
No mar do luto, há também aquelas pessoas que perderam suas mães, esposas ou sofrem com a ausência de outra forma. Dores que parecem não caber em nenhum lugar. Se você está passando por isso, sinta-se abraçado. Eu não tenho palavras bonitas, nem acho que sou capaz de amenizar a sua angústia, mas posso deixar o meu abraço.
Para a nossa mãe, que gestou dois, cuidou de dois e no domingo poderá abraçar somente um, registro aqui o meu agradecimento e todo o meu amor. Davi e eu não poderíamos ter alguém melhor por nós.
Muito obrigado, mãe. Nós te amamos.
*Daniel Dornelas é escritor, influenciador literário e acadêmico de Medicina. Saiba mais: @lendocomdaniel