Em entrevista exclusiva ao DIÁRIO, Leonardo fala sobre o apoio que recebeu e como foi sua relação com os detentos durante seus dias no presídio de Caratinga
CARATINGA – Leonardo Machado Figueiredo recebeu a reportagem do DIÁRIO DE CARATINGA em sua residência. Bastante calmo, ele falou pela primeira vez a um órgão de imprensa após ter tido sua prisão revogada no dia 11 de julho. O servidor público efetivo da Prefeitura de Caratinga havia sido detido no dia 1° de junho juntamente com outros três investigados durante a “Operação Império”.
Dos investigados, Leonardo foi o último a deixar a prisão e o único que não está em regime domiciliar. Mas, ainda assim, ao contrário do comportamento da maioria das pessoas que se encontram na mesma situação e anseiam por ganhar a liberdade, ele se mostrava paciente. Para Leonardo, essa paciência tem uma explicação muito simples: a esperança que vem de Deus.
Inicialmente o juiz Anderson Fabio Nogueira Alves, da Comarca de Caratinga havia decidido por manter a sua prisão preventiva. No entanto, no dia 7 de julho foi proferida nova decisão, acolhendo, em parte, o incidente processual. Seria substituída a prisão preventiva por algumas medidas cautelares, além do pagamento de fiança no valor de R$ 15 mil. Caso fosse efetuado o pagamento da fiança, seria expedido alvará de soltura e termo de compromisso.
No entanto, a defesa do funcionário público recorreu do valor da fiança, informando à Justiça que o salário de Leonardo é de pouco mais de R$ 1.600, portanto, não teria condições de arcar com a fiança. Uma vez que o titular da 2ª Vara Criminal havia entrado de férias, o juiz Consuelo Silveiro Neto, acolheu em parte o requerimento da defesa, e reduziu o valor para R$ 5 mil. Familiares e amigos se mobilizaram e conseguiram recolher o valor e a Justiça, já no regime de plantão, cumpriu o alvará de soltura.
Leonardo afirma que aos poucos têm tentado retomar sua rotina, mas, sua prioridade, no momento, é recuperar todo o tempo em que precisou ficar afastado de sua família. A ligação familiar é fácil de ser percebida: sempre que Leonardo mencionava sua filha e sua esposa durante a entrevista, emocionado, ele direcionava seu olhar a elas.
Nesta entrevista, Leonardo ou “Léo”, como é carinhosamente conhecido entre seus amigos e familiares, fala sobre os dias em que ficou detido; sua relação com os detentos com que dividia a cela e o apoio que recebeu.
Onde você estava naquele 1° de junho de 2016, quando foi procurado pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO)? Você imaginava que seria detido?
Eu estava em casa. O grupo esteve aqui pela manhã. Trataram muito bem a mim e a minha família, nos respeitaram. Fui com eles para a delegacia e inicialmente imaginava que eu iria depor. Não sabia que ficaria detido.
Quando chegou ao presídio de Caratinga, qual a primeira coisa que passou pela sua cabeça?
As coisas foram acontecendo muito rápido. Me senti triste e humilhado. Fiquei preocupado com a minha família e o que eles estavam sentindo. Procurei estar bem naquele momento e sentia que Deus me confortava, também senti o cuidado Dele comigo.
Você poderia descrever como era a cela em que você estava?
Era uma cela pequena, que ficavam em média seis pessoas. Saíam alguns e às vezes chegavam outros. Eles me procuravam, conversavam comigo. Tive um bom relacionamento com as pessoas na cela.
Como era essa relação com os detentos?
Todos me trataram bem. Senti, nas conversas que tínhamos, que muitos demonstravam o desejo de conversar sobre Deus. Eles me receberam, conversavam, até me davam força, falando que ia dar tudo certo. Tivemos muita oportunidade de conversar sobre Deus, de ler a Bíblia e orar juntos. Quando saí, muitos me falaram: “Léo, Jesus está no meu coração”. Fiquei muito feliz com essa experiência, da esperança também entrar no coração deles. De verem que têm uma vida pela frente. Sempre falavam de seus familiares e relatavam o desejo de sair dali e viverem uma vida diferente. Deus me abençoou muito neste tempo com eles.
Durante o tempo em que esteve detido, como foi seu contato com a família. Você recebia visitas?
Isso foi algo muito especial que aconteceu. Eu senti muito o carinho da minha família. Por mais que eu vivesse isso todos os dias na minha casa, naqueles momentos mais difíceis, eles estiveram juntos comigo me dando força. Recebi cartas da minha esposa, dos meus pais, minhas irmãs e amigos que quero guardar para o resto da minha vida. Foram demonstrações de companheirismo e de amor, que me faziam admirá-los ainda mais. Meu pai me visitou, na primeira oportunidade. E receber o abraço do meu pai naquele momento foi uma sensação que não consigo descrever, chego até a me emocionar com este sentimento. Porque, quando ficamos privados do contato, dessas coisas que realmente são importantes, os momentos em família, um café da manhã com o seu filho e sua esposa, os sentimentos se tornam maiores. E quando vi meu pai, indo lá me visitar, dando apoio, foi muito bom. Já os amava muito, agora os amo ainda mais. Deus me deu esse presente de ter minha família e amigos cuidando de mim.
Você demonstra ser um homem bastante ligado à Igreja. Quando estava detido, seu contato com Deus se fortaleceu? Como sua fé lhe ajudou a suportar?
Sempre acreditei que Deus controla nossa vida tanto nos momentos de alegria como nos momentos de tristeza. Acredito num Deus muito grande e senti o cuidado Dele, o tempo todo me dando paz. Sempre vinha ao meu coração o sentimento que Deus me amava e acredito muito nisso. Sei que por mais difícil a situação que vivamos, o mais importante Ele já nos deu, que foi Jesus morrer um dia na cruz em nosso lugar para nos dar a salvação. No momento de dificuldade, posso dizer que passei a amar ainda mais a Deus.
No dia 5 de junho, um domingo, um grupo de amigos da igreja que você frequenta, se reuniu pela primeira vez após sua detenção, na porta do presídio. Você conseguiu ouvir o que estava acontecendo?
No primeiro dia eu não ouvi. Depois os próprios presos vieram comentar comigo, porém, eu não tinha escutado. Mas, eles continuaram indo em todos os outros domingos.
Você passou seu aniversário no presídio de Caratinga. Como foi para você passar um dia que deveria ser de extrema felicidade longe de sua família?
Na data de aniversário realmente é muito bom estarmos junto de nossos amigos e familiares. Não poder estar com eles realmente é difícil. Neste dia, estiveram ali ao lado, em uma estrada próxima, muitas pessoas, amigos, minha família. Naquele dia eles também prestaram culto a Deus e acho que foi um dos aniversários que fiquei mais feliz, porque naquela noite eles foram meu presente. Pude agradecer muito a Deus pela oportunidade de receber o carinho das pessoas.
Esses cultos continuaram acontecendo após sua saída da prisão?
Sim. Eles continuaram fazendo esse trabalho ali do lado do presídio. Eu já estive com eles lá duas vezes, participando disso. Todos que estiveram lá sentiram que há um trabalho a ser feito. Lá de dentro, consegui perceber nos depoimentos dos próprios presos, falando que nesse momento sentiam conforto em seus corações, que fazia diferença e os acalmava. O evangelho pode mudar a vida de qualquer pessoa. Deus colocou no coração deles o desejo de estarem indo lá aos domingos. São mais ou menos umas 500 pessoas ali que estão ouvindo a palavra de Deus. Fico muito feliz de a igreja ter se disposto a fazer isso. Espero que isso que isso faça diferença na vida delas.
Nas redes sociais, muitas pessoas te apoiaram. Algumas até mesmo sem lhe conhecer se solidarizaram com a campanha #euacreditonoleo. Outras te julgaram. Qual recado você mandaria para a sociedade de Caratinga?
De agradecimento pelo carinho demonstrado por todos. Foi bom sentir este cuidado dos amigos, da família e das pessoas da igreja que frequento. Foram a expressão do amor de Deus na minha vida. Fiquei muito feliz com isso. Quero dizer a todos que estiverem enfrentando problemas para confiarem que Deus está no controle, nos guarda e sempre tem o melhor para nossa vida.
Quando você saiu do presídio, amigos e familiares lhe esperavam ansiosos, mas uma cena em especial chamou atenção. Sua filha te abraçou e ficou em seu colo por muito tempo. Como foi aquele momento?
Uma coisa que sempre tive muito é o carinho da minha família. E tenho uma admiração muito grande por eles. Tenho prazer de estar com minha filha, minha esposa, meus pais, minhas irmãs e com tantos outros familiares e amigos. O mais difícil em todo esse momento que vivi foi a saudade deles. Não poder acordar de manhã e ver a minha esposa e minha filha, não ter os momentos do dia com elas, não viver estes bons momentos foi muito difícil. Era o que mais doía dentro do meu coração. Quando foi passando o tempo, esse sentimento de saudade foi aumentando e aquele momento foi de muita emoção mesmo, porque Deus me deu de novo o que eu mais queria que era estar perto de todos que amo, inclusive, minha filha. Acho que por isso, aconteceu daquela forma. É um sentimento muito verdadeiro no meu coração e no dela também.
Fora do presídio de Caratinga, você já está retomando sua rotina?
Sim. Já estou voltando a ter as minhas atividades normais. Estou de férias do meu trabalho para estar mais perto dos meus familiares.
“Tivemos muita oportunidade de conversar sobre Deus, de ler a bíblia e orar juntos”.
“Recebi cartas da minha esposa, dos meus pais, minhas irmãs e amigos que quero guardar para o resto da minha vida”.