Thelma Regina
Alexandre Sales[1]
Em algum momento da vida explodir de raiva, dramatizar situações, ter desejo de vingança, ser egoísta, ter mania de perseguição, dificuldade em se relacionar, desrespeitar leis, ser impulsivo, ter baixa tolerância a frustrações, ser manipulador é até natural. O problema é quando isso ocorre com frequência e em exagero, pode indicar transtorno de personalidade antissocial, também conhecido como sociopatia, condutopatia ou psicopatia. Somam 4% da população e não tem cura.
A cada 25 pessoas no mundo, uma é perversa, desprovida de culpa e capaz de passar por cima de quem for para satisfazer seus próprios interesses. Estas pessoas possuem défice no campo das emoções; não sentem amor, compaixão ou remorso; são indiferentes ao próximo, incapazes de empatia. Já nascem com predisposição genética à manifestação de indiferença afetiva.
Existe mais de 69 milhões de indivíduos com essas características no mundo, dado incerto, pois outros milhões estão à solta e por isso sem registro da Organização Mundial de Saúde. É no ambiente prisional que se encontra grande parcela dessas pessoas, correspondendo a 20% da população carcerária e 86,5% dos serial killers.
Psicopatas apresentam três defeitos comuns: são egoístas; não se arrependem e possuem valores morais distorcidos. Por isso, seu prazer se limita ao sofrimento alheio, o que os tornam predadores e parasitas, pois dependem de outras pessoas para viver.
Devido à singularidade de cada ser, não é fácil determinar as manifestações essenciais de um psicopata. No entanto, o que move sua personalidade não é de ordem cognitiva: a razão funciona bem e ele tem clara consciência de que age infringindo a lei, no entanto não se importa com isso, não se sente ansioso ou nervoso com a possibilidade de ser descoberto e até calcula os danos para saber o custo-benefício da ação. Incapaz de aprender com a experiência, por limitação no córtex pré-frontal, age por motivação intrínseca, por impulsividade em obter seus objetivos narcisistas em tempo recorde. Por vezes simula ter aprendido com seus erros, mas somente para sair impune de um delito.
Possui aparência de pessoa mentalmente saudável.
Uma de suas principais habilidades mentais é a inteligência, tanto na dimensão intelectual, quanto moral, pois sabe distinguir seus atos de maldade. Outras funções mentais importantes são a consciência e a atenção. Psicopatas são lúcidos e hipervigilantes, prontos a detectarem a fragilidade do outro. Possuem habilidade na linguagem, o que os tornam persuasivos, capazes de usar a culpa, a força e outros métodos para influenciar pessoas a fazerem coisas que normalmente não fariam.
Sempre usarão uma “máscara” de sanidade, agradável e simpática. Mas possuem traços narcisistas, consideram-se superiores, inteligentes, mais espertos e mais poderosos que as demais pessoas. Jamais admitem seus erros e enganos. Julgam-se merecedores de terem suas próprias leis. Racionalizam suas ações, minimizam o produto de suas maldades e convencem serem as vítimas.
A ausência de emoções e o comportamento social anormal ou violento bloqueiam o remorso, único sentimento que poderia frear suas atitudes. O egocentrismo os impossibilita de se entregarem aos outros, tornando-os insensíveis, racionais e frios. São pessoas de resposta sexual superficial e impessoal. Podem manter um relacionamento afetivo apenas para satisfazer as necessidades biológicas ou porque lhes fornece álibi para demonstrar uma vida normal. Devido à incapacidade de amar e sentir empatia tornam-se agressores cruéis e implacáveis e cometem delitos pelo simples prazer de sentir que podem fazer. Alguns praticam estupro e abuso sexual para satisfazer a necessidade de poder.
Quietude, calma e reflexão são incomuns aos psicopatas. Eles precisam estar sempre entretidos e em ação, pois apresentam maior estímulo para excitação do que a maioria das pessoas. No entanto, não são ansiosos e pouco se incomodam com situações tensas e conflitivas. Em parte, isso se deve a ausência de culpa e remorso.
Psicopatas não tem o menor receio em mentir para justificar seus atos, assim como não têm vergonha se forem descobertos na mentira. Suas mentiras são deslumbrantes, inspiradoras, persuasivas e convincentes (mentira patológica ou pseudologia fantástica), usadas na intenção de capturar vítimas. Eles usarão deste precedente na terapia, na revisão de sentenças, em julgamentos, para promover sua imagem, se tornarem bem-sucedidos, serem vistos como heróis ou como vítimas.
Psicopatas possuem demência semântica e incapacidade de internalizar o conteúdo emocional das palavras, bem como de decifrar a conotação emocional da linguagem não verbal. Não se culpabilizam por suas ações, pois acreditam que foi o outro que o impulsionou ao ato. Suas condutas antissociais são persistentes e inadequadamente motivadas, visto que não há lógica para tais. Conduta comum aos psicopatas é a violência ou agressão para atingir suas metas podendo ser impulsiva (não racionalizada, não planejada, emocional, reativa e sem sequência organizada) ou premeditada (operacional, predatória, executada de forma calculada).
A falha no cumprimento de tarefas cotidianas é sistemática. Devido à impulsividade e os desejos egocêntricos são comuns dificuldades de relacionamento e demissões no trabalho. A falta de emoção leva ao descuido com algo que não satisfaça seus desejos, por isso não se preocupam em se desfazerem do que conquistaram. Para os psicopatas, serem despedidos do emprego ou presos por um delito não é nada autodestrutivo, já que o fim justifica os meios e as consequências são necessárias para satisfazer seus desejos e manter seu senso de liberdade e superioridade.
Psicopatas são vulneráveis a influência do álcool e outras substâncias que favorecem o comportamento antissocial. Muitos dos atos violentos ou crimes são realizados nessas condições, inclusive infrutíferas tentativas de suicídio, que pode ser parte de seu comportamento manipulativo de controlar os outros ou obter benefícios para a saúde.
Assim, a psicopatia é um estilo de vida e não uma “doença mental”, já que não afeta a razão, o entendimento ou o juízo da realidade. Psicopatas são mentalmente saudáveis e levam uma vida normal, podendo ser vizinhos perfeitos, amigos perfeitos ou algo dessa natureza. O que está inapropriado no psicopata é a conduta deformada, o estilo de vida mal adaptado marcado pela insensibilidade, impulsividade e narcisismo.
Existem três tipos de psicopatia: a leve, que lesa uma pessoa (ex. os famosos golpes 171, estelionato ou fraude); a moderada, que atinge um número grande de pessoas e que ocorre em esfera social mais alta (ex. o superfaturamento na compra de medicamentos para o sistema público); e a grave, que corresponde aos assassinos em série para quem não basta matar, tem que haver atos de crueldade. Dos 4% da população de psicopatas, 1% é grave e 3% são leves ou moderados.
O argumento para a dificuldade de tratar a psicopatia é a própria incapacidade de compreender e ser compreendido que dificulta a aliança terapêutica. No entanto, a psicoterapia é uma das únicas possibilidades de tratamento, sendo que tem maior resultado nos tipos leve ou moderado, sem comorbidades, em jovens com idade inferior a 30 anos, sem antecedentes criminais multiplos (comportamentos ilícitos, abuso sexual, mentiras, falta de remorso e de vontade de mudar de vida) e que cumpre regularmente o tratamento com equipes especializadas.
Thelma Regina Alexandre Sales
Nutricionista e Médica – Especialista em Terapia Nutricional/SBNPE – Especialista em Nutrição Clínica/UECE – Especialista em Saúde Pública/UNESCO – MBA em Gestão de Negócios/UNEC – Mestre em Meio Ambiente, Saúde e Sustentabilidade/UNEC – Professora do Centro Universitário de Caratinga.