* Gabriella Coelho Motta Pizzani
Diante do diagnóstico da surdez muitas famílias se sentem assustadas e desmunidas de condições para lidar com essa nova realidade. Pensar no indivíduo surdo como um estrangeiro dentro de seu próprio país tornam as coisas menos assustadoras e as estratégias de convivência um pouco mais fáceis.
A criança diagnosticada com surdez tem uma limitação única e exclusivamente comunicacional que pode ser agravada mediante iniciativas erradas da família ou a falta delas, Haja vista que todos nós nascemos com um mecanismo inato de aquisição linguística que só pode ser desenvolvido quando houver um ambiente linguístico favorável, no caso dos surdos, seria essencial o contato com uma comunidade surda fluente em Língua de Sinais, ou seja, uma língua cuja modalidade de produção e recepção linguística seja gesto-visual, língua essa que a pessoa surda está fisicamente apta a adquirir. Mas, como a maioria das causas de surdez é adquirida e não necessariamente uma condição genética, vinda de pai para filho, a maioria dos surdos tem pais ouvintes, usuários de línguas orais cuja recepção linguística se dá pelos ouvidos, língua essa que não permite a criança surda uma aquisição linguística natural, haja vista que a mesma possui um impedimento auditivo.
Diante de uma visão clínica terapêutica, a maioria das famílias a partir do diagnóstico da surdez começam uma busca desenfreada por tratamento e medicalização, visando à cura da surdez, e se esquecem das questões linguísticas que envolvem aquele novo ser surdo. Assim, muitos surdos perdem o período ideal de aquisição linguística, que vai do nascimento a puberdade, e acabam sofrendo severas consequências da aquisição tardia de linguagem, como; dificuldade de organização lógica das ideias, consolidação do pensamento abstrato, etc.
A questão é tão seria que a legislação, mais especificamente o Decreto 5626/2005, reservou um espaço no Capitulo VII, artigo 25, inciso VIII, para determinar aos profissionais da saúde a tarefa de orientar às famílias acerca das implicações da surdez e da importância para criança surda ter acesso a LIBRAS o mais cedo possível. Segue abaixo a legislação que trata desse assunto:
“Art. 25. A partir de um ano da publicação deste Decreto, o Sistema Único de Saúde – SUS e as empresas que detêm concessão ou permissão de serviços públicos de assistência à saúde, na perspectiva da inclusão plena das pessoas surdas ou com deficiência auditiva em todas as esferas da vida social, devem garantir, prioritariamente aos alunos matriculados nas redes de ensino da educação básica, a atenção integral à sua saúde, nos diversos níveis de complexidade e especialidades médicas, efetivando:
VIII – orientações à família sobre as implicações da surdez e sobre a importância para a criança com perda auditiva ter, desde seu nascimento, acesso à Libras e à Língua Portuguesa;”
Enfim, basta pensarmos no nosso processo de aquisição linguística e consequentemente em como foi importante e simplesmente necessário estarmos rodeados de adultos fluentes na Língua Portuguesa para que possamos ter acesso ao mais poderoso instrumento promovedor do nosso desenvolvimento cognitivo, a linguagem.
Quando temos em mente que o surdo é um estrangeiro em seu próprio país e buscamos introduzi-lo em uma comunidade surda usuária da LIBRAS, para que haja identificação e aquisição linguística, reconhecemos que sua língua natural é a LIBRAS e que a partir dela ele pode adquirir novas línguas, como o Português, assim como ter um desenvolvimento cognitivo semelhante a criança ouvinte, desde que respeitadas suas peculiaridades e oportunizados os recursos necessários para sua acessibilidade a esse mundo de maioria ouvinte. Ao contrário, quando não oferecemos as condições essenciais para o desenvolvimento linguístico e cultural das crianças surdas, estamos predestinando as mesmas a sofrerem com uma limitação além e mais prejudicial para vida social do que a auditiva, a limitação cognitiva.
Então, a vocês pais de crianças surdas ou futuros pais, que não estão isentos de terem uma criança com limitação auditiva, fica a orientação acerca da importância de localizar próximo a vocês uma comunidade surda, seja em uma associação de surdos, escola, igreja… a fim de que seja oportunizada a essa criança o contato e respectiva aquisição natural e no período ideal da Língua de Sinais. Assim como também fica a dica para que vocês, e toda a família, aproveitem e aprendam a língua de seu filho objetivando tornar a comunicação entre vocês mais eficaz e consequentemente o relacionamento entre pais e filhos mais íntimo e prazeroso.
* Gabriella Coelho Motta Pizzani é tradutora e intérprete de LIBRAS/Português e professora da disciplina LIBRAS em todos os cursos de graduação oferecidos pelo UNEC- Centro Universitário de Caratinga.
-Mais informações sobre autor: http://lattes.cnpq.br/0969249139229201