
Para Cortella, há um vínculo entre valores e algumas religiões, mas não é de obrigatoriedade que sejam coerentes (Foto: Nana Higa)
Em entrevista exclusiva, o professor e filósofo comenta: “não existe uma Ética Universal, com validade para todos, o tempo todo, em todos os lugares”
DA REDAÇÃO- “Ética é o conjunto de valores e princípios que usamos para responder a três grandes questões da vida: (1) quero? (2) devo? e (3) posso? Nem tudo que eu quero eu posso; nem tudo que eu posso eu devo; e nem tudo que eu devo eu quero. Você tem paz de espírito quando aquilo que você quer é ao mesmo tempo o que você pode e o que você deve”. Esta é a definição de Mario Sergio Cortella para um conceito aparentemente simples, mas que envolve uma série de questões.
Muito se fala em ética e também em moral. Há diversas opiniões sobre o assunto. O DIÁRIO DE CARATINGA tratou essa temática em sua edição especial de aniversário da cidade, que foi às bancas em 24 de junho de 2016, onde foram ouvidos diversos setores da sociedade. Naquela ocasião citamos Cortella, que foi procurado pela nossa Reportagem, mas não pôde dar a sua contribuição, devido a uma rotina de compromissos agendados.
No entanto, neste mês de setembro, o filósofo, escritor, educador, palestrante e professor universitário encontrou uma “brecha” em sua agenda e respondeu a esta entrevista elaborada pelo DIÁRIO DE CARATINGA, que acabou sendo mais oportuna, por se tratar de um período eleitoral. O papel da Educação na formação do caráter e sobre a corrupção foram alguns dos temas abordados por ele.

Cortella afirma que não existe Ética Individual, mas também não existe uma Ética Universal (Foto: Nana Higa)
É correto afirmar que ética vem de berço?
Se entendermos o “berço” como sendo o início da formação de um ser humano, sem dúvida ali se iniciam as fontes para uma conduta social saudável ou não; contudo, o berço original é apenas uma das condições, pois a liberdade permite que uma pessoa escolha rotas de vida que não deveria.
Qual o papel da escola na formação do caráter do brasileiro?
Sendo a Escola um lugar metódico e estruturado para uma Educação intencional e deliberada, tem bastante influência. Porém, os limites para essa ação formadora encontram interfaces com outras instituições sociais mais poderosas, como a mídia e a família. Vale registrar o que dizia Paulo Freire: “não será a Escola sozinha a mudar o mundo, mas sem ela esse mundo não mudará”.
O brasileiro tem uma noção de ética diferente de pessoas de outras nacionalidades, por exemplo, os japoneses?
Cada cultura tem seu modo próprio de vivenciar os valores e princípios de convivência, embora muitos destes possam ser coincidentes entre as nacionalidades; não existe Ética individual, mas também não existe uma Ética Universal, com validade para todos, o tempo todo, em todos os lugares.
As pessoas costumam generalizar e dizer que faltam princípios cristãos nos corruptos. Mas moral e ética independem dos valores religiosos?
Há um vínculo entre valores e algumas religiões, mas não é de obrigatoriedade que sejam coerentes, dado que uma parte das religiões já patrocinou ou ainda patrocina em certos momentos a prática delituosa e imoral. A corrupção é uma possibilidade humana, oriunda da nossa Liberdade e, por isso, a Religião tem seu limite nessa restrição positiva.
A maioria das pessoas aceita pequenas “malandragens” do dia a dia, mas condena atos de maior proporção. Por que isso acontece?
Por que se esquecem da veracidade da advertência de Mahatma Gandhi: “olho por olho, uma hora acabamos todos cegos”.
Mario Sergio Cortella, nascido em Londrina/PR (1954); filósofo, Mestre e Doutor em Educação, professor-titular da PUC-SP (na qual iniciou a docência e a pesquisa em 1977), professor-convidado da Fundação Dom Cabral. Foi Secretário Municipal de Educação de São Paulo (1991-1992); escritor e conferencista tem presença constante na mídia como âncora, debatedor e comentarista.