CARATINGA– Nesta terça-feira (21), o Tribunal do Júri da Comarca de Caratinga condenou Lucas Adriano Elias Alves, de 25 anos, pelos crimes de estupro e homicídio de Lucélia Rodrigues, de 42 anos. O crime, que ocorreu em fevereiro de 2023, causou grande comoção na região. Lucas foi sentenciado a 24 anos e 8 meses de prisão em regime inicialmente fechado. O julgamento trouxe à tona detalhes chocantes sobre a violência sofrida pela vítima e a dinâmica do crime.
Lucélia Rodrigues desapareceu no dia 27 de fevereiro de 2023, no córrego dos Ferreiras, zona rural de Santa Bárbara do Leste, onde residia. O corpo da vítima foi encontrado no dia 4 de março, em uma lavoura de café no córrego Barro Branco, com sinais de violência extrema. A investigação da Polícia Civil levou à prisão de dois suspeitos e à apreensão de um tronco de cafeeiro usado como arma do crime.
De acordo com as autoridades, os acusados combinaram o estupro e, posteriormente, o homicídio para evitar que Lucélia denunciasse o ocorrido. Um dos suspeitos foi julgado em maio de 2024 e absolvido por falta de provas conclusivas, decisão que foi contestada pelo Ministério Público. O promotor Henry Wagner Vasconcelos anunciou que recorreu da absolvição e aguarda um novo julgamento.
Em entrevista à imprensa, Vasconcelos disse que Lucas e o outro acusado planejaram o crime em conjunto, motivados por intenções cruéis e premeditadas. “Estamos tratando de dois sujeitos que combinaram o estupro de uma vizinha. Não há possibilidade de se combinar o estupro de uma vizinha e se deixar que essa vizinha viva”.
O promotor detalhou o encontro que levou à morte de Lucélia, descrevendo como ela foi atraída para um local isolado e posteriormente violentada. “A promotoria de Justiça no julgamento de hoje, que foi especificamente do acusado Lucas Adriano Elias, trabalhou como não poderia deixar de ser valorizando a concatenação dos elementos probatórios reunidos desde a investigação policial e indicativos com segurança cristalina de que a vítima Lucélia e o acusado Lucas Adriano Elias tiveram um encontro na tarde daquela segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023, um encontro no local ermo do qual a vítima não regressou, vindo a ser encontrada ali morta no sábado subsequente, dia 4 de março de 2023, com sinais de uma brutal violência derramada sobre ela”.
Henry também destacou a dinâmica do crime, evidenciando a participação de ambos os acusados. “Lucélia foi estuprada, inclusive a narrativa do estupro empreendido pelo acusado Lucas Adriano e por ele combinado com o corréu já veio apresentada no nascedouro dessa persecução penal, quando Lucas foi interrogado duas vezes pela autoridade policial que presidiu a investigação. Em todas aquelas duas ocasiões, ele afirmou que havia uma proposta de um encontro sexual consensual entre ele e Lucélia, ignorando, todavia, Lucélia que um terceiro seria introduzido naquele encontro. Lucélia, ao chegar no local, sentiu-se desconfortável. Lembremos que se trata de um local ermo, um cafezal, um local muito incômodo para que o encontro sexual, especialmente para uma mulher, se realize”.
Conforme o promotor, Lucélia desistiu do combinado, mas foi estuprada e morta. “Lucas, já sob efeito de muita cocaína, forçou o entrosamento sexual, ou seja, ele a estuprou até o momento em que chega no ambiente o sujeito com quem o estupro havia sido pré-combinado, no qual, porém, encontrando Lucélia já muito machucada e também se deparando com o fato de Lucas já haver inclusive ejaculado dentro do corpo da vítima, não leva adiante o propósito de com ela estabelecer uma conjunção carnal, qualquer ato libidinoso”.
Sobre o homicídio, Vasconcelos explicou: “O segundo sujeito desagrada do estado em que encontra a vítima e, uma vez que os dois haviam combinado de antemão um estupro e a vítima estuprada estava, ainda que somente por um deles, avançam na empreitada criminosa e a descartam, a matam porque, naturalmente, não havia a possibilidade de os três, que eram residentes no mesmo lugarejo, o Córrego dos Ferreiras, tornassem a conviver naquele pequeno espaço, naquela pequena comunidade dali para a frente como se nada tivesse acontecido. Obviamente, a vítima levaria ao conhecimento de seus familiares e provavelmente também das autoridades o acontecimento, aquele estupro. Então, o estuprador Lucas e seu comparsa matam a vítima”.
Quanto à absolvição do primeiro réu, o promotor expressou indignação e esperança de reversão. “Há um recurso do Ministério Público contra essa absolvição deplorável. Um recurso que o Ministério Público tem a esperança de que receba o provimento do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, de sorte que, para esse sujeito, um novo julgamento seja realizado, quiçá com a possibilidade de alcance da condenação que o Ministério Público entende ser também devida a ele”.
O promotor Henry Wagner Vasconcelos também destacou o impacto social do caso e as dificuldades enfrentadas em crimes contra mulheres em uma sociedade machista. “Estamos tratando de um crime contra uma mulher, e uma mulher que foi estuprada e assassinada no contexto do processo em que ela estava a interagir sexualmente, eroticamente, com um homem, não obstante ela fosse casada. E isso, numa sociedade estruturalmente machista, misógina, faz recair muito negativamente sobre a pessoa da vítima, a reprová-la e colocar em menosprezo o valor da vida dela, da dignidade dela como pessoa humana. Não obstante Lucélia episodicamente tenha recaído numa conduta que para os homens é corriqueira, a conduta de trai”.
DEFESA
Por outro lado, o advogado de defesa de Lucas, André Gustavo, sustentou a tese de insuficiência de provas e defendeu os direitos de seu cliente durante o julgamento. “Hoje foi um dia de extrema importância para a sociedade caratinguense. Foram trabalhos árduos, a gente está desde 8 horas da manhã aqui, na sessão solene do Tribunal do Júri de Caratinga, onde a gente procurou exercer da forma mais absoluta o direito da ampla defesa do contraditório em favor do nosso constituinte”, declarou.
Ele questionou a utilização da confissão inicial de Lucas: “Obviamente, o conselho de sentença é que vota a tese tanto do Ministério Público de Acusação quanto da defesa e tem que ter uma decisão. No caso de hoje, a defesa sustentou a tese da absolvição pela insuficiência de provas tanto pelo crime do estupro quanto pelo crime do homicídio. Porém, como o Ministério Público se utilizou de uma primeira versão apresentada pelo Lucas, onde que num dado momento ele fazia uma confissão, então o Conselho de Sentença, por maioria absoluta, reconheceu a procedência da denúncia e condenou o Lucas em ambos os crimes”.
André Gustavo anunciou que recorrerá da decisão. “Foi reconhecido, portanto, também o benefício para o Lucas da confissão espontânea. Mas a defesa, a gente, após uma breve análise rápida, optamos por ingressar com o devido recurso de apelação, onde agora a gente vai ter um prazo para a gente analisar e absorver tudo que foi exposto no Tribunal do Júri. Fizemos algumas ponderações da ata de manifestações ministeriais que nós discordamos, que entendemos que seria de ordem, às vezes, que poderia causar até uma nulidade no processo. Mas isso vai ser analisado com calma e serenidade”.
- O corpo da vítima foi encontrado no dia 4 de março de 2023, em uma lavoura de café no córrego Barro Branco, com sinais de violência extrema (Foto: rede social)
- Local onde o corpo de Lucélia foi encontrado (foto: arquivo PCMG)