* Adriana Barbosa Sales de Magalhães
A presença de gosto e odor desagradáveis na água para consumo humano é um problema crescente e complexo. Em geral, consumidores avaliam a qualidade da água distribuída para consumo humano por meio de percepções sensoriais de gosto, odor e aparência (cor e turbidez) e mesmo que a água apresente características químicas e biológicas seguras do ponto de vista de saúde, poderá ser rejeitada.
Muitos compostos químicos de origem industrial podem contribuir diretamente para gosto e odor na água. Por outro lado, esgotos domésticos, efluentes industriais e águas de drenagem urbana e agrícola contém nutrientes que estimulam a crescimento de organismos aquáticos. Substâncias produzidas por microrganismos e a decomposição da matéria orgânica em mananciais de abastecimento são fontes comuns de compostos causadores de gosto e odor na água potável. As cianobactérias, também conhecidas como algas azuis, constituem um grupo particularmente importante, pois, além de produzir compostos que conferem gosto e odor a água, também apresentam capacidade de produzir toxinas que ocasionam riscos à saúde humana. Esses organismos apresentam intensa proliferação no ambiente aquático, formando as chamadas florações na superfície da água, principalmente em ambientes eutrofizados. Sendo assim, a detecção de gosto e odor na água pode servir de alerta, para atenção a problemas potencialmente mais sérios.
A norma brasileira de qualidade da água para consumo humano do Ministério da Saúde, estabelece que gosto e odor devem fazer parte do padrão de potabilidade. Entretanto, os processos de tratamento chamados “convencionais” são pouco eficientes na remoção de muitos compostos que causam gosto e odor na água. As técnicas analíticas sofisticadas para a identificação e quantificação dos compostos orgânicos causadores de gosto e odor em águas de abastecimento não tem sido comuns entre a maioria das companhias de saneamento, uma vez que o investimento necessário em equipamentos e mão de obra altamente qualificada é significativamente elevado.
É importante que os responsáveis pelos serviços de abastecimento de água estejam devidamente preparados e deste modo, o desenvolvimento de técnicas alternativas para a identificação e quantificação de compostos orgânicos causadores de gosto e odor tem sido consideradas e dentre estas, pode-se citar o Painel Sensorial, largamente difundido na indústria alimentícia e de bebidas.
O Painel Sensorial para análise da água deve ser composto por especialistas capacitados para avaliar a percepção dos consumidores ao ingerir a água. A sensibilidade dos profissionais faz com que percebam mínimas variações no sabor e odor do líquido. Se houver qualquer característica que fuja aos parâmetros estabelecidos, a estação de tratamento de água correspondente à amostra examinada é comunicada e pode corrigir o problema. Os analistas têm a capacidade de identificar odores cítricos ou florais; sabores amargos, doces ou ácidos, por exemplo, com o papel de aprovar ou rejeitar, de acordo com um padrão. Todos os gostos, odores e sensações táteis são caracterizados e atribuídas notas as suas intensidades.
Para tornar-se um degustador de água é necessário realizar um curso específico, ter bom de paladar, e evitar hábitos que prejudiquem esta habilidade, como o fumo, por exemplo. Alguns aspectos são destacados na literatura (por exemplo, por Minim, 2012) como determinantes na variabilidade e confiabilidade da análise sensorial, tais como: fatores associados ao ambiente, ao preparo e apresentação das amostras, e fatores emocionais e físicos como indisposição ou resfriados. Para realizar as provas, é importante não usar perfume ou qualquer outro produto que possa comprometer a qualidade da análise; e atividades como escovar os dentes ou lavar as mãos com sabonete devem ser feitas com mais de meia hora de antecedência.
Aprendemos que a água não possui sabor, nem cor e nem cheiro, porém, estas características são válidas para a água pura em si. Até chegar aos consumidores, o líquido passa por tratamentos para alcançar um padrão de potabilidade, que acabam modificando estas caraterísticas.
A qualidade da água dos mananciais tem sofrido alterações significativas, causadas pelo avançado estado de degradação. Isso pode interferir no gosto e odor, aspectos associados ao problema de rejeição da água. É importante que as empresas de saneamento estejam preparadas para realizar as análises sensoriais, garantindo a distribuição da água com padrões estabelecidos pela norma brasileira de qualidade da água para consumo humano.
Para garantir que a água chegue às casas dos consumidores com qualidade, as empresas de saneamento devem contar com a tecnologia humana. Na prática, isso significa profissionais especializados em garantir a excelência do produto consumido por milhões de pessoas. Os degustadores devem provar a água da estação de tratamento para detectar qualquer anormalidade no sabor e no odor dessa bebida tão indispensável ao ser humano.
*Adriana Barbosa Sales de Magalhães, Bióloga pela Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC – Bahia), Mestrado e Doutorado em Botânica pela Universidade Federal de Viçosa (UFV) e Pós-doutorado em Saneamento Ambiental (UFV). Professora do Centro Universitário de Caratinga
Mais informações sobre o autor(a): http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4262763J2