Professor Eugênio Maria Gomes fala sobre alternativas para enfrentar a crise econômica e inovar no mercado
CARATINGA – Nesta entrevista, Eugênio Maria Gomes fala sobre a importância da gestão de negócio no enfrentamento da crise econômica. As dicas se estendem às empresas e comércio em geral, desde a satisfação do cliente durante o atendimento até a busca em atrair consumidores.
Outro ponto abordado durante a entrevista é a gestão funcional. Os cuidados a serem tomados de modo a garantir o funcionário como um parceiro da empresa, sem impor ameaças e impondo-lhes incertezas quanto à permanência em seu cargo.
Eugênio é professor e escritor, membro das Academias de Letras de Caratinga e Teófilo Otoni e do Núcleo de Escritores e Artistas de Buenos Aires.
O Brasil tem atravessado uma crise econômica. Como o senhor avalia este momento?
Nunca esteve tão claro o fato de que o Brasil passa, de fato, por momentos complicados em sua economia. Há poucos meses este era um assunto sobre o qual não se falava com tanta certeza, até porque, em função da campanha eleitoral, informações mais precisas foram “mascaradas” como forma de “induzir” votos. E o brasileiro fez a sua escolha, qual seja a de que fosse mantida a “estabilidade” econômica e que não sofresse solução de continuidade a gama de ganhos sociais implantados. Bom, sabemos muito bem agora que o país não vivia um momento tão estável assim em relação à sua economia e, ainda, que os ganhos sociais dos brasileiros nos últimos anos não seriam mantidos em sua totalidade…
O que isso impacta na gestão de negócios?
Este preâmbulo serve, apenas, para falar da gestão de negócios nesse momento de crise, real, vivida pelo país, inclusive com consequências diretas em relação à manutenção da empregabilidade. O mercado de trabalho começa a enfrentar, de fato, uma perigosa crise, o que se comprova pela taxa de desemprego de 7,9%, apurada no primeiro trimestre deste ano, maior que todas as taxas dos últimos dois anos, para o mesmo período. Convivemos hoje com um contingente de oito milhões de pessoas desempregadas, composto em sua maior parte por mulheres e jovens. Milhares de trabalhadores estão sendo demitidos todos os dias nas mais diversas áreas do mercado e, nas áreas industriais, muitas empresas já começam a usar o conhecido artifício das férias coletivas. E tudo indica que esta situação deva perdurar, ainda, por pelo menos doze meses.
Esse desemprego também tem se refletido no consumo?
Situações como o aumento da taxa de desemprego e da inflação, a perda da capacidade de compra dos brasileiros e o aumento das taxas de juros têm ocasionado redução no volume das vendas. A campanha da Rede Globo, intitulada “Menos é Mais” nunca esteve tão em voga e de fácil aplicação, já que a população se vê obrigada a tentar consumir cada vez menos, priorizando aquilo que é realmente necessário, seja pela escassez de recursos financeiros, seja pelo seu pessimismo frente ao futuro.
Como gerir as empresas nos momentos de crise?
Sinceramente, as estratégias não precisam ser ortodoxas demais, nem muito diferentes das que já são tomadas pelas empresas em tempos de “vacas gordas”. E eu explico o porquê: toda organização, em qualquer ramo de atividade, vive situações de ameaças e de oportunidades seja qual for o momento econômico pelo qual passe o país em que estejam instaladas, até porque sofre pressões o tempo todo dos diversos atores – principalmente os externos, tais como os acionistas, os concorrentes, o governo, clientes, fornecedores, legislação, tecnologia, etc. -, fazendo com que a empresa se sinta pressionada a dar a melhor resposta a cada grupo e a agradar ao mercado, responsável em última instância por seu sucesso ou insucesso.
Quais cuidados devem ser tomados?
Ameaças e oportunidades sempre existiram no dia-a-dia das organizações. E continuarão existindo… Faz parte do negócio. O que ocorre neste momento é que as ameaças estão maiores, mais incisivas e perigosas, enquanto as oportunidades estão mais difíceis de serem observadas e aproveitadas. Mas, ambas estão, como sempre estiveram, no rol das preocupações empresariais. Alguns cuidados precisam, sim, ser tomados, de forma a amenizar a força das ameaças e auferir o melhor resultado através das oportunidades que surgem. Como exemplo, podemos citar a expertise no atendimento às necessidades e desejos dos consumidores, bem como a gestão do quadro funcional.
CARATINGA X ATENDIMENTO AO CLIENTE
Qual a importância do bom atendimento ao cliente?
Em relação aos consumidores, nunca foi tão importante gerar valor em todas as etapas da sua relação com a empresa. O cliente, cada vez mais exigente, se coloca neste momento como algo de raro valor. Decidido a comprar menos, ele precisa ser “convencido” a enfiar a mão no bolso… E mais, deverá ser motivado a direcionar a entrega do seu dinheiro a determinada empresa. Isso somente será possível no caso de o cliente apresentar extrema necessidade por um determinado produto ou serviço ou então, se for encantado com algumas benesses, tais como um atendimento excepcional, uma excelente oferta em termos de preço e prazo, ou uma diferenciação em determinados produtos ou serviços.
Em Caratinga, isso acontece?
Em Caratinga, infelizmente, os consumidores sentem uma profunda falta do adequado atendimento por parte significativa das organizações, especialmente das pequenas e médias empresas, atuantes no setor comercial e de serviços. A maior parte deles jamais experimentou o já corriqueiro procedimento denominado “pós-venda” e não foram submetidos a nenhum tipo de pesquisa de satisfação, até porque a maioria esmagadora das empresas instaladas em Caratinga não o faz. A maioria dos comerciantes possui apenas dois modelos de abordagem ao cliente que chega a seu estabelecimento: aquele que “cola” no cliente, sem deixar que ele “respire” e escolha com calma o que procura e aquele que simplesmente ignora o cliente, deixando inclusive que ele se vá sem que receba qualquer tipo de manifestação dos vendedores.
São pontos que fazem a diferença?
Sim. Estamos falando de diferenciais competitivos, importantes em qualquer condição econômica do país e em todo regime de alta concorrência, mas, que agora passam a ser extremamente importantes, fundamentais mesmo, para que o consumidor crie coragem de “quebrar” a barreira imposta pelo desejo de não gastar e decida pelo ato da compra.
Em sua opinião, o que ainda falta no atendimento?
Como deixar de dar preferência àquela loja que periodicamente envia ao consumidor, seja em sua casa ou no seu local de trabalho, alguns produtos do vestuário para que ele os leve para casa, sem compromisso, para experimentá-los e separar, caso queira, os que mais o agradar; que envia o funcionário posteriormente para recolher as peças não adquiridas, levando com ele a máquina do cartão de crédito para concretizar da transação e que, alguns dias depois, lhe telefona para saber se ele ficou satisfeito com a compra? Como deixar de dar preferência àquela empresa que, quando o cliente chega à sua loja recebe do atendente – logo após o usual cumprimento e da apresentação pessoal -, a seguinte pergunta: “o senhor prefere que eu o ajude ou prefere ficar à vontade e me chamar quando precisar?” Como não ficar satisfeito com o atendimento complementar no final do processo, quando o atendente faz questão de levar a sacola com os produtos adquiridos até a porta, se despede com cortesia e se coloca à disposição para qualquer assunto relacionado à compra?
Caratinga também perde na oferta de produtos, por se mostrarem mais atrativos em outras cidades?
Todo mundo sabe – mas nenhuma das nossas entidades de classe ainda teve a curiosidade de medir quanto -, que é alto o valor monetário desviado do comércio de Caratinga por conta das compras realizadas em algumas cidades vizinhas. Esta semana tomei conhecimento de que um prestador de serviços na área de musculação trouxe de Ipatinga a geladeira que precisava para a sua academia. É fácil imaginar o que anda ocorrendo com outros tipos de produtos, mais facilmente transportáveis, oferecidos por lojas das cidades próximas à nossa, dotadas da excelência no atendimento e da disposição de ganhar menos por unidade e, claro, mais em função do volume das vendas.
O que ainda falta para que o comércio de Caratinga se fortaleça na satisfação do cliente?
Independentemente da crise econômica, o comércio de Caratinga precisa rever questões relacionadas ao encantamento que o cliente precisa sentir, condição fundamental para a sua fidelização. Está mais que na hora de inovar, de fazer as coisas diferentes. Por que não realizar “feirões” por tipo de produto, oferecer condições melhores de preço e de parcelamento, melhorar o visual das lojas, colocar música, de boa qualidade, nas ruas, motivar o cliente a comprar? Duvido que, por exemplo, se os restaurantes se organizassem, criassem uma grande praça de alimentação em determinados fins de semana, em um espaço único, oferecessem boa música, cardápio variado e ótimo atendimento, que as famílias não se sentiram motivadas a saírem de casa para almoçar ou jantar “fora”… Por que esperar o período de natal para enfeitar as ruas, as lojas, as vitrines? A festa de São João, nosso padroeiro, comemorada durante todo o mês de junho, não deveria ser uma referência para a movimentação do comércio de nossa cidade? Onde estão as bandeirolas, as sanfonas, os atendentes vestidos a caráter e as lojas oferecendo um (bastaria um!) pé de moleque ou um pedaço de rapadura ao seu cliente?
GESTÃO FUNCIONAL
E a gestão do quadro funcional?
Sim. Muito importante. A maioria das empresas, em época de crise, comete um grave equívoco em relação ao seu maior patrimônio: as pessoas. Talentos são demitidos por conta de uma visão deturpada de que a melhor redução de custos acontece com a redução da folha de pagamento. Há dois meses realizei uma consultoria para uma organização, sediada em outro estado da federação, por conta dos efeitos da crise econômica. Reuni os funcionários e solicitei deles o maior empenho possível em ajudar a descobrir caminhos que permitissem, se não o crescimento, pelo menos a manutenção do volume de vendas e da receita, como forma de evitar redução de quadros. O resultado foi fantástico e a empresa este mês precisou contratar mais dois funcionários, em pleno período de ascensão do desemprego.
O senhor acredita que é necessária uma nova visão do gestor para com os funcionários de uma empresa?
Funcionário precisa ser visto e tratado como um parceiro, não como um recurso do qual você se desfaz sempre que for preciso. Quando ele é respeitado, reconhecido e instado a colaborar como se fosse parte da empresa, ele dá a sua contribuição. Poucos gestores oferecem ao funcionário a oportunidade de demonstrar todo o seu potencial criativo. Quando isso acontece, o resultado costuma ser surpreendente. Sabemos que a crise econômica pela qual passa o país é transitória. Há poucos meses as empresas estavam com dificuldade para encontrar mão de obra adequada para contratar. Daqui a pouco, esta situação estará novamente em evidência e o problema se repetirá. Nesse momento, é fundamental que o funcionário seja treinado, preparado para lidar com as mudanças e motivado a buscar soluções que favoreçam a empresa a gastar menos e a continuar a entregar os seus produtos e serviços. E digo mais: frases do tipo “talvez eu tenha que reduzir o quadro de pessoal” e “a fila lá fora para ocupar o seu lugar está grande” não colaboram em nada com o rendimento funcional. Somente funcionários preparados e motivados serão capazes de ajudar as empresas a atravessarem as turbulências do momento atual.
Então o momento é de inovação?
Com certeza. Crise econômica? Juros altos? Desemprego? Menor volume de vendas? Clientes arredios? Tudo isso, junto e misturado, se constitui em uma ótima oportunidade para mudar, para inovar e realizar bons negócios! Basta querer. Basta olhar para além do próprio umbigo, deixar de direcionar toda a culpa aos concorrentes e ao governo e colocar a cabeça para funcionar, encontrar a maneira de fazer a diferença e buscar os melhores resultados.