Militares da ação negam omissão de socorro. PM instaurou procedimento investigatório sobre o caso, que será acompanhado pelo Ministério Público
CARATINGA- A família de Joana D’Arc de Oliveira, 54 anos, questiona a ação da Polícia Militar durante uma operação realizada na tarde da última quinta-feira (26), tendo como alvo uma residência da Rua Márcia Maria, no local conhecido como Morro da Lagartixa, Bairro Vale do Sol. A mulher passou mal e acabou falecendo.
A Reportagem esteve no local na manhã dessa sexta-feira (27) para ouvir os familiares sobre o caso. O DIÁRIO DE CARATINGA também esteve com a PM, que apresentou sua versão.
VERSÃO DA FAMÍLIA
A PM cumpriu mandado de busca e apreensão na casa de Joana, onde ela morava com os filhos. De acordo com Nivaldo Arruda de Oliveira, um dos filhos da dona de casa, ele estava na casa da tia quando percebeu a movimentação policial. “Vi que subiu um monte de carro aqui e moto. Falei: ‘Tia, vou olhar o que é’. Quando cheguei na janela já vi os policiais parados aqui na porta. Eles falaram que estavam com um mandado de busca e apreensão, até então não tinham me mostrado nada e já tinham arrombado minha casa e entrado para dentro. O documento foi chegar só uns 20 minutos depois. Já saíram da viatura arrombando, metendo o cassetete, não chamou hora nenhuma. Já quebraram uma porta de vidro lá dentro de quase R$ 1000”.
Nivaldo ressaltou que Joana, que estava lavando roupas, teria se assustado com a abordagem policial e começado a se sentir mal. Ele questionou a prestação de socorro para sua mãe. “E toda hora eles ficavam oprimindo eu, minha mãe e meu irmão; falando que se tivesse alguma coisa ilícita eles iam levar. Minha irmã que tem deficiência auditiva também estava aqui. A minha mãe começou a passar mal, foi nessa hora que pedi ao capitão da operação para socorrer, porque ela tinha problema de coração e no dia 7 de setembro sofreu um ataque de trombose e quase faleceu. Ficou muito ruim internada no Casu (Centro de Atenção à Saúde Unec) e depois teve alta. E eles não prestaram nenhum tipo de socorro para ela”.
Sobre o desfecho da operação, Nivaldo afirma que “não encontraram nada” em sua residência. “Saíram quebrando aí. É perseguição, eles vivem me perseguindo, porque já tive uns atritos, umas passagens por porte de arma. Eles falaram que o mandado era por porte de arma. Tinham que ter socorrido minha mãe, já que eles podem carregar ladrão, traficante, matador, estuprador na viatura eles podiam socorrer a minha mãe. Minha mãe era uma cidadã de bem, não tinha passagem nenhuma, mulher honesta, pastoral e vivia orando para os outros”.
Iracema Domingues Davi, irmã de Joana, ressaltou que o estado de saúde dela era delicado. E que foi difícil conseguir um veículo que pudesse conduzi-la para atendimento médico. “O filho dela pediu para me chamar para socorrer ela, eles (polícia) não liberaram ela e nem me chamaram. Só falaram com ele assim: ‘A viatura já levou’. Mas, é mentira. Tinham três viaturas aqui e cinco motos. Fizeram muita pressão em cima dela e o médico já tinha me avisado da outra vez que qualquer momento de pressão ela ia passar mal de novo.
Ela morreu por falta de socorro aqui na porta. Vim, atravessei com ela para o outro lado. O policial estava ali, ela pediu para ele socorrer, porque estava morrendo. Ele falou assim: ‘Não posso fazer isso, porque recebo ordem. Tem que pedir o outro que está no comando’. Aí ele falou com outro policial: ‘A dona está pedindo aqui para ser socorrida. Posso socorrer ela?’. Ele falou: ‘Não. Vê se arruma um carro aí, se não conseguir libero a viatura. Mas, agora não. Porque nós estamos na operação’. Eu falei: ‘Mas, ela está morrendo. Vocês estão vendo que ela está morrendo, está roxeando toda. Tem quase dois meses que esteve internada, deu trombose no pulmão, tem problema de coração. Vocês não podem fazer nada?’. E eles falaram que nada”.
Segundo Iracema, quando conseguiram um carro para o socorro, Joana já havia falecido. “Ela morreu na minha mão. Deitei ela ali e falei que ela tinha acabado de morrer. O menino dali da frente veio para socorrer, mas já tinha morrido. Ainda assim ele levou para o Casu, mas não tinha mais o que fazer. Não socorreram porque não quiseram, se socorressem rápido ela não tinha morrido. A rua inteira é testemunha do que aconteceu. Eles (polícia) tinham que ter dado um primeiro socorro para ela, tinham muitos policiais, se é a porta que eles queriam vigiar, ficassem dois aqui e dois iam socorrer. Assim como entraram na viatura e foram lá em baixo buscar umas testemunhas, porque não quis pôr as testemunhas aqui de perto, também podiam ter entrado com ela na viatura e levado para o Casu”.
O OUTRO LADO
A PM concedeu uma coletiva de imprensa para tratar sobre o assunto. Major Márcio afirmou ter sido informado desta ocorrência na noite de quinta-feira (26) e que foi cumprido mandado de busca e apreensão com autorização judicial, para apurar denúncias anônimas sobre tráfico de drogas “em determinada casa, apontado como suspeito determinado cidadão”.
O militar ainda destacou que durante o cumprimento do mandado, foi necessário, segundo a guarnição, fazer o “rompimento do obstáculo que é a porta, o que é previsto no Código de Processo Penal”. “Durante a ocorrência, pelo que nos foi informado uma senhora que reside em uma das residências que foram verificadas passou mal, foi socorrida por familiares ou amigos ali do bairro. Inicialmente, a própria Polícia Militar, segundos os militares da ocorrência, iriam fazer o socorro, mas, por indicação dos próprios familiares preferiu-se que fosse feito por uma pessoa que já teria socorrido ela dias atrás. Eles afirmam que ficaram aguardando essa pessoa chegar, mas, como demorou um pouco mais, a própria viatura deslocou para retornar logo à frente, fazer uma conversão no local, porque a rua ali é estreita e já iria fazer o socorro, mas o vizinho chegou e fez o transporte que era necessário. Assim, foi feito socorro, mas infelizmente ela veio a falecer”.
Major Márcio ainda informou que já assinou portaria que instaura procedimento investigatório sobre o caso, que ainda será acompanhado pela promotora de Justiça responsável pelo controle externo da atividade policial. “Já informei que estamos fazendo essa investigação e vou mandar pra ela hoje (ontem) ainda a cópia da portaria de instauração. A partir disso o Ministério Público vai acompanhar todos os fatos para que seja esclarecido da melhor forma possível”.
Durante a operação na residência, segundo a PM, foram apreendidos alguns pássaros. “Não é nossa atividade do 62 BPM a questão ambiental, mas quando a gente cumpre o mandado de busca e apreensão e verifica outras irregularidades também no local, aciona a equipe competente para tal, que foi a equipe de meio ambiente que lá no lugar constatou a existência de pássaros em desacordo com a legislação e foram tomadas as providências legais necessárias também para esse caso”.
A PM também afirmou que a pessoa suspeita de tráfico de drogas tem “várias passagens e em função das denúncias a PM estava cumprindo a função dela”.
NOTA EMITIDA PELO CASU
Sobre o atendimento à paciente Joana D’Arc de Oliveira, o Hospital Casu informa que a paciente deu entrada na Emergência às 16h46 de ontem (quinta-feira), 26 de outubro de 2017 em Parada Cardíaca Respiratória (PCR). A paciente foi prontamente atendida e foram realizadas as manobras de Reanimação Cardiorrespiratória (RCP), sem sucesso.
O corpo foi reencaminhado ao Serviço de Verificação de Óbito (SVO) do município para detectar causas da morte.