A ideia para escrever sobre este tema surgiu a partir de um vídeo do professor Luis Henrique Beust, autor do livro “Afinal… Por que sofremos?”. Dissertando sobre a importância do sofrimento para o aprimoramento e a lapidação da nossa personalidade, ele chega à conclusão de que o importante é ser bom e não apenas ser feliz. Para ele, a bondade praticada no dia a dia levará o homem, com toda certeza, à felicidade e que, o sofrimento, leva o homem à purificação, à situação de estado de graça, como acontece com a terra que passa a produzir depois de machucada e com as plantas que ganham vida e força após serem podadas, torturadas.
Algumas situações já vividas levaram-me a uma reflexão sobre o sofrimento e a felicidade. Já tive muitas perdas na vida. Perdi amigos, avós, tios, primos e, de maneira muito especial, perdi meus pais, um irmão e a minha esposa. Destes últimos quatro, três passaram por grande sofrimento até o momento de fecharem os olhos, definitivamente. Meu pai passou anos tratando de um câncer, a ponto de ele mesmo dizer que a doença era como um carnê do BNH, daqueles que você pagava a vida inteira, sem conseguir chegar ao final do contrato. Minha esposa, depois de muito cuidar do meu pai, também passou anos cuidando de uma hepatite C, submeteu-se a transplante hepático e morreu um ano depois com o fígado novamente tomado pelo tumor. O tempo todo ela sabia de sua doença, das suas consequências e do fatal desfecho final, o que a fez sofrer, certamente, anos a fio. Minha mãe teve um período breve de enfermidade, mas muito doloroso, manteve a lucidez, mas não podia falar ou andar, dependendo dos outros para quase tudo. Sem falar que, após entrar em coma, passou quase sessenta dias em uma cama de hospital, a ponto de pedirmos a Deus a redução do seu tempo de sofrimento.
Eram três pessoas muito boas, tementes a Deus, prontas a ajudar o próximo, que se dedicaram à caridade e que colocavam, sempre, o outro à frente de seus objetivos, de seus interesses pessoais. Meus pais e minha esposa, após um período da doença, estavam completamente resignados, preparados para o desenlace derradeiro. Como se o sofrimento os tivesse preparado para lidar com um momento tão complicado, tão difícil para eles e para os que amavam. Minha esposa chegou a fazer recomendações, minha mãe manteve o semblante sereno e a fé e, meu pai consolava os mais chorosos e tentava manter o astral de todos à sua volta, sempre o mais alto possível.
Não, eu não quero – nem poderia – fazer qualquer relação entre o sofrimento e a vida que cada um escolheu para viver. Mas, posso sim, relacionar o sofrimento à aceitação da partida. Acredito que, por isso, o sofrimento seja tão importante quanto a alegria para a nossa vida. O sofrimento, certamente, transforma-nos em pessoas melhores, mais preparadas para a vida e, também, para a morte. E não falo, apenas, do sofrimento com a doença derradeira. Minha mãe, por exemplo, de todos os sofrimentos que teve na vida, sempre afirmou que nada doía mais que a perda do filho, que dor alguma poderia se comparar àquela.
Acredito que, cada dor, cada perda, cada sofrimento nos leva ao aperfeiçoamento como pessoas, como se passássemos por uma elevação de alma, a ponto de entendermos melhor a vida, os outros, as nossas e as outras angustias, os nossos e os outros medos. Quem passa por grande sofrimento passa a dar mais valor ao que tem, deixa de preocupar-se com coisas sem sentido, esquece um pouco do umbigo alheio e passa a se preocupar mais com o seu próprio. Aliás, o sofrimento do outro, de alguma forma, nos leva à reflexão sobre a nossa postura, sobre como temos conduzido nossas vidas, nossas ações. E isso acaba por nos tornar pessoas melhores, pessoas mais integras, pessoas de caráter. É de Fiódor Dostoievski, o célebre autor de Crime e Castigo, um dos maiores romances da literatura mundial, a frase “O sofrimento sempre acompanha uma inteligência elevada e um coração profundo. Os homens verdadeiramente grandes experimentam uma grande tristeza, acometidos de uma melancolia súbita.”
O sofrimento, talvez, mais do que purificação, conduz ao amadurecimento, conduz à aceitação daquilo que é inevitável, conduz à pacificação da alma, na medida em que nos ensina a valorizar e a cultivar aquilo que realmente importa em nossas vidas. E tudo isso, sem dúvida, acaba por nos tornar pessoas mais felizes, pois ao superarmos as inúmeras dores da vida, passamos a vê-la, verdadeiramente, como uma dádiva, um presente, em todo o seu esplendor, em toda a sua glória. Amadurecer nos faz descobrir que sofrer perdas é inevitável, mas que não precisamos nos agarrar à dor para justificar nossa existência, nem definir nosso futuro. Sempre nos é permitido recomeçar.
Por tudo isso, também acredito, assim como o professor Luis Henrique, que ser bom leva o homem, inevitavelmente, a ser mais feliz. Talvez, de fato, a melhor recompensa não esteja ao final da busca, incessante, do homem pela felicidade, mas, no resultado de cada boa ação que ele realiza ao longo de sua caminhada.
Portanto, sejamos bons, pois ao final, seremos mais felizes.
“Me esforço para ser melhor a cada dia, porque bondade também se aprende”, Cora Coralina.
- Eugênio Maria Gomes é professor e Pró-reitor de Administração da Unec. Membro das Academias de Letras de Caratinga e Teófilo Otoni e presidente da AMLM- Academia Maçônica de Letras do Leste de Minas. É membro do Lions Clube Caratinga Itaúna, do MAC- Movimento Amigos de Caratinga e da Loja Maçônica Obreiros de Caratinga. É Grande Secretário de Educação e Cultura do GOB-MG, Colunista do Jornal Diário de Caratinga, diretor da Unec TV e apresentador de programas de televisão nas emissoras Super Canal TV, TV Sistec, Unec TV e TV Três Fronteiras, no Vale do Mucuri.