Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial 1.485.717/SP, decidiu ser indevido o pagamento decorrente de contrato de seguro de automóvel quando o segurado, causador do acidente, estiver em estado de embriaguez. Assim, em caso de acidente com veículos, em que o motorista estiver sob afeitos de álcool ou outra substancia, a seguradora não poderá ser compelida ao cumprimento do contrato. Ou seja, a seguradora não irá lhe indenizar.
Está comprovado cientificamente que os efeitos nocivos do álcool no organismo humano são capazes de alterar as condições físicas e psíquicas do motorista, potencializando a probabilidade de causar acidentes e danos no trânsito. Com base nisso, entende-se que o motorista, ao assumir o controle do veículo após ter feito uso de álcool ou drogas, agrava intencionalmente o risco, objeto do contrato, consoante o artigo 768 do Código Civil Brasileiro.
Ou seja, à medida que o segurado conduz o veículo embriagado, mesmo que sem a intenção de envolver-se em sinistro, ele aumenta voluntária e conscientemente o risco de colisão e acidente com vítimas, perdendo o direito a cobertura securitária.
Ao agir assim, o indivíduo aceita o risco que é presumido. E esse aceite ao risco, com a ocorrência do sinistro, pode afastar a responsabilidade da seguradora.
Sendo o princípio da boa-fé peculiaridade essencial do contrato de seguro, é possível concluir que o segurado, quando ingere bebida alcoólica e assume a direção do veículo, frustra a justa expectativa das partes na execução do seguro, pois se rompe com os deveres anexos do contrato, como o de fidelidade e de cooperação, sobretudo diante das características próprias do seguro em que a mutualidade é pedra angular e, à luz dos fundamentos do seguro, impõe-se a presunção de agravamento e do nexo causal entre a embriaguez e o sinistro, salvo se demonstrado que ocorreria independente da embriaguez (culpa exclusiva de outro motorista, falha do próprio automóvel, imperfeições na pista, animal na estrada etc.).
A perda do direito securitário não se encerra somente nessa hipótese. Obviamente, a rigidez quanto ao uso de álcool, bem como o afastamento da indenização engloba também os prepostos. Ou seja, motoristas de empresas, motoristas particulares ou outros a quem são entregues os veículos para o trabalho, caso dirijam embriagados, seu empregador perderá o direito ao seguro.
O mesmo ocorre a quem entrega ou empresta veículos a motoristas embriagados ou que venham a se embriagar. Além de configurar crime de trânsito, podendo ser responsabilizado civil e criminalmente, o proprietário perderá o direito à indenização da seguradora em caso de sinistro
Neste sentido, o próprio STJ editou a Súmula 575, segundo a qual “constitui crime a conduta de permitir, confiar ou entregar a direção de veículo automotor à pessoa que não seja habilitada, ou que se encontre em qualquer das situações previstas no art. 310 do CTB, independentemente da ocorrência de lesão ou de perigo de dano concreto na condução do veículo”. Com esta súmula, a Corte, uniformiza o entendimento de que é crime de perigo concreto ou abstrato o simples fato de permitir, confiar ou entregar veículo a pessoa não habilitada, embriagada ou drogada, reforçando também a tese do agravamento intencional do risco, conforme o artigo 768 do Código Civil, bem assim a presunção do nexo causal.
Assim, é perfeitamente lícita a cláusula do contrato de seguro de automóvel que preveja a exclusão da cobertura securitária no caso de direção de veículo por um condutor alcoolizado, salvo, se o segurado demonstrar que o acidente aconteceria de qualquer jeito, estando ou não embriagado.
Cumpre esclarecer que o presente artigo trata apenas do seguro do automóvel e todas as suas garantias. Não nos referimos aqui ao seguro de vida do condutor. Este seguro, individual ou coletivo, em nada se mistura com o seguro do veículo, e, ao contrário deste, deve ser pago mesmo em casos em que o condutor acidentado estiver sob efeitos do álcool. Tal decisão também saiu do STJ. Segundo o Tribunal, no contrato de seguro de vida, cuja cobertura é naturalmente ampla, é vedada a exclusão de cobertura de acidentes decorrentes de atos do segurado em estado de insanidade mental, de alcoolismo ou sob efeito de substâncias tóxicas, conforme a carta circular editada pela Superintendência de Seguros Privados.
Ao contratar um seguro, o proprietário do veículo procura se precaver de possíveis prejuízos causados em virtude de acidentes de trânsito, sobretudo a terceiros. Visa uma forma de minimizar o dano, nos casos em que o prejuízo supera o valor da indenização contratada. Todavia, ao dirigir embriagado, ou permitir que motorista embriagado o faça, o proprietário se sujeita inteiramente ao risco. Assume, sozinho, o ônus de indenizar e reparar todo e qualquer dano causado a terceiros, além dos próprios prejuízos.
Aldair Oliveira – Advogado
Pós-Graduado em Direito Civil e Processo Civil
(33) 3321.7581