Memórias das práticas de reflorestamento de um homem que viveu em equilíbrio com a natureza
Quando se deu a partida de Joãozinho da Matinha, em 22 de setembro de 2018, muitos disseram que Deus escolheu especialmente para ele o primeiro dia da primavera, já que ela é a estação mais linda do ano, o tempo de florescerem majestosas espécies.
Uma vida dedicada integralmente à proteção da fauna e da flora, assim viveu Joãozinho da Matinha (1956-2018). Ainda jovem, ele iniciou a atividade de reflorestamento da propriedade de sua família no Córrego da Matinha. Tratava-se de um terreno marcado por pastagens com trechos degradados.
A foto antiga, datada de dezembro de 1983, revela como eram, há 37 anos, o solo e a vegetação da antiga Matinha, com terreno relativamente íngreme que dava acesso à mata lá no alto. No centro da imagem, a casa simples construída pelo meu pai, onde viveu uma vida inteira com minha mãe. A casa continua lá, recebeu apenas mudanças externas com a construção de um terraço e foi integrada a outras benfeitorias. Vejam que, no fundo da casa, avista-se uma pastagem rasa, com marcas de trilhos onde o gado mais circulava. Embora fosse dezembro — mês em que costumava chover bastante — a foto representa um cenário bem degradado, como era comum naquela época em que não se falava muito em preservação do meio ambiente.
Pouco tempo depois, Joãozinho se tornou muito amigo do Bauer, engenheiro do Instituto Estadual de Florestas (IEF), que foi a pessoa que ofereceu condições, por meio da doação de mudas, para que meu pai pudesse iniciar o reflorestamento da propriedade. Assim, toda semana, ele passava no canteiro do IEF, no Bairro Seminário, enchia sua velha Kombi verde e branca com as mudas doadas, principalmente árvores frutíferas, e tudo era plantado em nosso terreno. Isso ajudou a atrair, cada dia mais, animais para nossa propriedade.
A saudade traz à memória recordações da minha mãe, minha irmã e eu ajudando meu pai no reflorestamento. Eu me lembro de eu tinha 7 anos de idade e minha irmã 6 anos e ajudávamos no plantio todas as manhãs até dar o horário de irmos para a escola.
A segunda foto aérea é recente e caracteriza o resultado do trabalho incansável de reflorestamento realizado por Joãozinho da Matinha em pouco mais de 35 anos. O conjunto da área construída, como dito, inclui a antiga casa. Veja que a tímida mata da foto antiga deu lugar a um frondoso conjunto integrado de área verde. Todas as árvores do entorno no outro lado também se constituem em área reflorestada por Joãozinho da Matinha. Trata-se de uma área densamente verde que hoje é repleta de árvores frutíferas responsáveis pela alimentação de uma fauna diversificada, cujas aves e outros animais que nela vivem e dela se alimentam, nutrição esta complementada com ração e outros alimentos naturais que meu pai sempre comprou ou recebeu doações, especialmente em períodos de escassez dos alimentos naturais nas matas.
João do Nascimento dos Reis, Joãozinho da Matinha, soube honrar e fazer história no Município onde nasceu e viveu toda a sua vida.
Viveu 62 anos e deixou um legado muito importante para a nossa família e a sociedade. É com muito orgulho que posso afirmar que meu pai era um homem honesto, com pureza de alma e que viveu em equilíbrio com a natureza em seu pedacinho de chão que herdou de seus pais e, para ele, foi mais que suficiente, pois nunca teve ambição de ficar rico. Foi um filho presente, irmão disponível, pai exemplar, esposo companheiro, avô dedicado e amigo constante.
Deixou em nossos corações a profunda lembrança de dor em tão pouco tempo de ausência e a doce lembrança desse tempo que esteve entre nós. Permanecerá o exemplo de vida para todos que tiveram o privilégio de conviver com ele. Saudades e nosso eterno Amor!
Kelly Aparecida do Nascimento. Professora Universitária, Mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade, filha de Joãozinho da Matinha.