Novo colunista do DIÁRIO aborda o assunto mais comentado na atualidade
CARATINGA – Como as coisas mudam. Assuntos que antes não eram comentados agora estão na ordem do dia. Para ilustrar essa situação, a música “Pop Song 89”, presente no álbum “Green” de 1988, da banda americana R.E.M., é o melhor exemplo. A letra narra um equívoco e a pessoa acha que conhecia com quem estava dialogando. Pensava ser um conhecido de longa data. Ao perceber o engano, o interlocutor pergunta: “deveríamos falar sobre o clima?”. Pois bem, o que antes era comentado quando não tínhamos nada para dizer, agora tomou conta da pauta diária. A escassez de chuvas e o medo da falta d’água preenchem nossas conversas. “O que está acontecendo com o nosso clima?” é uma das perguntas mais ouvidas e que poucos sabem responder.
Para entender esse panorama, o DIÁRIO conta seu novo colunista, Paulo Batista Araújo Filho. Aos domingos ele irá nos informar sobre as diversas atualidades sobre clima e o nosso dia a dia, como também, nos informará sobre as diversas formas de reduzir os nossos impactos no meio ambiente e quais as melhores formas de nos adaptarmos as mudanças que são esperadas para a região Leste de Minas Gerais.
Paulo Batista Araújo Filho, natural de Ipatinga, é formado em Ciências Biológicas e Recursos Naturais pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), possui Mestrado em Clima e Ambiente pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), atualmente trabalha no renomado Lawrence Berkeley National Laboratory (LBNL), Berkeley – Califórnia – Estados Unidos, que pertence a Universidade da Califórnia em Berkeley (UCal-Berkeley) e que neste ano dará início ao seu Doutorado nesta instituição.
Paulo, durante toda sua caminhada científica, dedicou-se a compreensão dos impactos das atividades humanas no nosso dia a dia, sendo que atualmente trabalha com os impactos do desmatamento e do aumento das emissões do dióxido de carbono , originadas da queima de combustíveis fósseis e de atividades agrícolas, nas florestas e como estes impactos podem mudar o clima.
Paulo, quais atividades que você desenvolve no Lawrence Berkeley National Laboratory (LBNL)?
– Em Berkeley nos EUA, continuarei o trabalho que dei início em 2012 no INPA, ainda como aluno de graduação da UFES. Este trabalho tem como objetivo principal de entender como as florestas da Amazônia irão se comportar frente aos impactos das atividades humanas, como o desmatamento e aumento da emissão de , e, como também, entender como estas mudanças podem resultar em mudanças no clima. Para que isso seja possível, nós utilizamos como ferramenta de trabalho alguns programas computacionais conhecidos como modelos numéricos, que são utilizados cálculos matemáticos com base em conceitos físicos, tendo o objetivo principal de prever quais as possíveis mudanças que estas florestas poderão sofrer no futuro. Este trabalho, possui participação de renomadas instituições como NASA, UCal Berkeley, Universidade de Harvard, INPA e EMBRAPA. Sendo que este trabalho está sendo financiado pelo Departamento de Energia dos EUA.
Paulo, para você que é um jovem pesquisador quais as perspectivas para o desenvolvimento desta área da ciência que estuda as relações entre florestas e o clima no Brasil?
– Quando vamos falar sobre as perspectivas do desenvolvimento de uma dada área de pesquisa, devemos considerar o quão importante esta é para a sociedade e quais os produtos que dela podemos obter. A área que pesquisa a relação existente entre as florestas e o clima no Brasil pode ser considerada nova, pois é uma preocupação atual e que vem sendo inserida no nosso cotidiano diariamente. As perspectivas são as melhores possíveis, pois no Brasil existe uma grande área territorial de diferentes tipos de florestas, como Mata Atlântica, Cerrado e Amazônia, que necessitam ser estudadas e seu funcionamento ser compreendido.
Paulo, porque estudar os impactos das atividades humanas sobre florestas e seus efeitos sobre o clima na nossa região?
– Não é muito difícil de entender o porquê de estudar como as atividades humanas, através do desmatamento, incêndios e atividades agrícolas, podem trazem grandes danos às florestas e, como consequência, pode resultar em algumas mudanças no clima e com isso pode trazer algumas mudanças nosso dia a dia. Por exemplo, ao manter uma área de floresta em pé, que já é um grande desafio, nós estaríamos preservando também os serviços ambientais destas áreas. Serviços ambientais nada mais são que os serviços que o ambiente natural, no nosso caso as florestas, prestam de forma gratuita à nossa sociedade, sendo muito importantes para a nossa sobrevivência e desenvolvimento das nossas atividades diárias. Entre os diversos serviços ambientais que podemos citar para nossa região um deles demonstra a importância da preservação de áreas florestas nativas, pois em propriedades que têm áreas nativas preservadas próximas às plantações de café é observado um aumento da produção de aproximadamente 15% por hectare, em relação a propriedades que não possuem áreas de floresta preservadas, devido à polinização das flores do café pelas abelhas.
No entanto, o que vai determinar uma boa produção da plantação de café não é somente o trabalho das abelhas, mas sim o trabalho em conjunto delas com o clima. Quando desmatamos grandes áreas de floresta e quando fazemos mau uso da terra disponível para as culturas agrícolas nós podemos mudar, com tempo, o clima de uma região. Desta forma, os períodos de chuva e seca que antigamente eram bem definidos, hoje não são. As diferenças de temperatura existentes entre áreas rural e urbana que havia antigamente, hoje quase não há mais esta diferença. Desta forma, podemos observar que florestas e clima estão ligados e a mudança de um deles pode modificar a produção de alimentos, neste exemplo o café, e mudar o nosso dia a dia através de períodos de altas temperaturas, chuvas intensas e secas persistentes.
Em meio a tudo que se tem falado na mídia sobre as mudanças no clima, como nós podemos enfrentar estas mudanças?
– As mudanças no clima, que são basicamente caracterizadas pela maior frequência de períodos de chuvas fortes e, também, pela maior frequência de períodos de secas persistentes, podem trazer grandes mudanças no nosso dia a dia. Para enfrentar estas mudanças basicamente podemos utilizar diversas formas de mitigação (diminuição), e, posteriormente, buscar alguns meios de adaptação. Para a mitigação destas mudanças seria necessária a redução do nosso impacto no clima através de pequenas atitudes diárias, mas que num longo período de tempo podem demonstrar ser bem eficazes. Dentre estas atitudes, podemos citar redução da produção de lixo, trocar em alguns dias da semana o carro pela bicicleta ou caminhada, reduzir o consumo de energia elétrica, reduzir o consumo de água e buscar formas de reutilizar a água em diversas atividades. Entretanto, se nossas formas de mitigação não reduzirem os efeitos das mudanças no clima então teremos de nos adaptar a estas mudanças. A adaptação pode ser considerada uma fase crítica e extremamente extenuante para o enfrentamento das mudanças no clima, pois teremos de alterar radicalmente nossos hábitos para adaptarmos ao que irá acontecer. Nesta fase, observa-se a existência de crises de água, energia e, consequentemente, a diminuição da produção de alimentos para a população, devido ao aparecimento de novas pragas nas lavouras e mudanças nos regimes de chuvas, como podemos observar atualmente. Alguns exemplos de diferentes formas de adaptação seria o armazenamento da água das chuvas, para ser utilizada em períodos de estiagem, e a implantação de painéis solares para a produção de energia elétrica. Entretanto, as aplicações de tais medidas ainda são consideradas extremamente caras e, portanto, são consideradas inviáveis, do ponto de vista econômico, por grande parte da população.