Walber Gonçalves de Souza
Desde os primórdios o ser humano procura melhores formas de viver em sociedade. Ainda nômade, formava grupos. Ao passar a viver nas cavernas, começando sua vida sedentária, inicia-se também um novo estilo de vida. Passados mais uns anos, não tardaram a aparecer as primeiras comunidades, as tribos e as civilizações antigas. Espalhadas pelo mundo cada uma delas desenvolveu características próprias dando origem às suas culturas. Aspectos que marcam e identificam cada grupo social.
Ainda na antiguidade, entre os povos gregos, surgem as primeiras preocupações que envolvem as relações sociais humanas. Ao afirmar que o ser humano é um animal político, o famoso filósofo Aristóteles propõe uma reflexão sobre as nossas formas de conviver. Para ele a ética deveria ser o princípio básico dos relacionamentos. Um grupo não pode viver de forma antiética. E ética para Aristóteles “pode ser definida como uma busca da felicidade dentro do âmbito do ser humano se este homem se esforçar a atingir sua excelência, isto é, se tornar uma pessoa virtuosa”. Virtude significa cuidar dos nossos hábitos, pois ele determina o nosso comportamento como bom ou ruim, há um ditado popular que ilustra bem este pensamento, mostrando a força do hábito “o uso do cachimbo deixa a boca torta”; a virtude pode ser entendida também como cuidar da nossa intelectualidade, alimentando-a com conhecimentos significativos para a nossa existência. Já diria outro ditado, “mente vazia é oficina do diabo”.
Aristóteles propôs esta reflexão justamente porque, de acordo com ele, as pessoas afastavam-se da virtude e por consequência não conseguiam praticar e nem tão pouco perceber a importância da ética nas relações.
Séculos depois, já por volta do início do século XVI, uma obra literária ganhou uma forte repercussão. Maquiavel escreve sua famosa obra “O Príncipe”. Nela Maquiavel trata das questões políticas, de como um dirigente deve agir. E entre as ideias expostas no livro, uma tornou-se mundialmente conhecida, que pode ser resumida na seguinte frase: “os fins justificam os meios”. Portanto, não interessa o que você vai fazer para atingir o seu objetivo, o que importa de fato é o objetivo cumprido. Independente da forma o que interessa é se o resultado foi o esperado.
A partir deste momento Maquiavel vai no sentido contrário do pensamento proposto por Aristóteles, pois para ele nas relações políticas, portanto, nas relações entre as pessoas, não se faz necessário o comportamento ético. Para Maquiavel um ser humano virtuoso é aquele que consegue conquistar os seus objetivos, custe o que custar.
Assim, começamos a perpetuar uma nova forma de pensar e agir. E desde então o livro “O Príncipe” vem sendo o livro de cabeceira de muitos estadistas que o utilizam como forma de aprender a dominar a todos aqueles que se afastam da virtude, da forma pensada por Aristóteles. Talvez agora, começamos a entender porque nossos dirigentes políticos preferem um povo intelectualmente falido, pois assim, geramos um povo desvirtuado. E um povo sem virtudes é mais fácil de ser controlado, encabrestado, enganado, iludido, enfim, manipulado.
O tempo passa, o terceiro milênio chega e com ele a questão do valor e o papel da ética volta à cena novamente. Queremos ser éticos, ter comportamentos éticos… falamos em ética a todo o momento. Mas que tipo de ética queremos, a proposta por Aristóteles ou aprofundarmos ainda mais no modelo maquiavélico de conduzir os nossos comportamentos?
A resposta parece óbvia, mas na prática não é. Sem que nos tornemos virtuosos não conseguiremos agir de forma ética.
E se a virtude encontra-se também nos hábitos, não há outro caminho a não ser mudarmos os nossos hábitos. Se quisermos construir uma cidade digna, bacana e justa para viver é preciso ter a coragem de corrigimos os nossos hábitos. Lembrando que hábitos são coisas rotineiras que fazemos constantemente, a todo o instante. Podemos citar como exemplo, o lixo que depositamos na rua no momento inadequado, a fila que furamos, o voto que trocamos por coisas banais, o livro não lido, a ação egoísta, a violência que exercemos, a corrupção que cometemos, a palavra mal dita e assim vai, inúmeros são os exemplos.
Se não tivermos a coragem de revermos nossas posturas, nossos hábitos, pois eles já estão dando sinais claros que estamos caminhando em direções tenebrosas, de pouco ou quase nada adiantará discussões em prol de um conceito, de uma palavra. Ética é comportamento, é atitude, é consequência do hábito humanamente digno e justo.
Walber Gonçalves de Souza é professor.
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Excelente texto.