O ser humano precisa de cuidados. Temos a ilusão de que somos fadados a sermos fortes e inabaláveis o tempo todo. Infelizmente esse mundo de aparências não dura muito tempo. Humanidade requer emoções, mansas, bondosas, compassivas… Claro que não conseguimos manter a calma a todo momento. Mas na falta de calma, alguns singelos cuidados de ternura fazem bem.
Um dia desses, estava na recepção do consultório aguardando minha vez. Em quatro anos de tratamento, percebia que minha depressão melhorava, ainda que vagarosamente. Apesar dos sinais de melhoria, as crises de tristeza e ansiedade vinham, vez ou outra, me visitar.
Nas cadeiras brancas da pequena e fria sala, estavam sentadas pessoas de diferentes idades, estilos e culturas. Todos em silêncio. Apesar de estar em meio a diversas “companhias”, senti-me só.
A solidão tomava conta de mim constantemente.
Cresci em meio a risos intensos e estridentes conversas de minha família e amigos. Minha terra natal fornecera-me “barulhos” inesquecíveis. Até mesmo a noite rompia seu silêncio com a ópera dos grilos no quintal.
Companhias eram constantes, ora de meus pais, ora de meus amigos, ora de minhas tias, ora de meus avós. Estes últimos tinham uma importância particular. Para alguém que ama ouvir histórias não poderia haver companhia melhor.
Vovô Adolfo é meu avô materno. Sempre tão doce, tão meigo! Meu maior orgulho era ter alguém tão bom em quem me espelhar. Incrível notar a forma como me acalma somente com a fala. Na falta de calma que em mim reinava, um conselho manso de meu avô era o bastante para tranquilizar meu coração.
Sair de casa foi um desafio imenso. Mas nada se compara à privação das conversas que tinha com vovô Adolfo na cozinha todos os dias. Mesmo estando a mais de cem quilômetros de distância, eu ainda esperava, a qualquer momento, ouvi-lo gritar no portão para tomar café da tarde comigo.
Agora, sentada na cadeira branca aguardando minha vez, senti-me só. Meu coração estava triste por não ter ninguém que pudesse me dizer uma palavra de conforto em tal momento. A ansiedade e a pressa sempre me dominavam.
O choro ameaçava cair quando um senhor saiu da sala do médico. Baixo, vestia uma camisa de botões amarela, calça social grafite, sapatos pretos e cinto de mesma cor. Os cabelos penteados de lado de uma forma incrivelmente delicada. Direcionando um terno e meigo sorriso a todos da recepção, o senhor pronunciou as seguintes palavras:
– Gente, sejam felizes!
Acenando, saiu ainda sorrindo com os brilhando com lágrimas singelas e acolhedoras. Como se a aparência não bastasse, aquele senhor pronunciou as palavras de uma forma tão acolhedora, tão consoladora… Vovô Adolfo veio me visitar no consultório.
Notei que a distância não importava. Sempre que me sentisse só, as palavras de vovô viriam me confortar, acalmando-me instantaneamente.
A falta de meu amado avô me doía muito, mas me acalmava saber que todos os atos de carinho que eu recebesse seriam afagos de sua fala mansa em minha vida. Quando a gente gosta, é claro que a gente cuida. Vovô cuidava de mim mesmo de longe. E mesmo longe, suas orações e falas mansas sempre chegarão a mim. Claro que eu não conseguia [nem conseguirei] manter a calma a todo momento. Mas na falta de calma, os singelos cuidados de ternura de vovô Adolfo viriam me fazer uma visita em forma de sorrisos.
Andreza Eduarda Araújo Freitas
Aluna do 5º período do curso de Letras do Centro Universitário – UNEC