Casal tinha sido impedido de deixar o local por conta da pandemia do coronavírus, tendo inclusive os passaportes confiscados
DA REDAÇÃO – Em outubro de 2016, Henrique Fonseca e Sabrina Chinelatto deixaram suas terras natais Caratinga e Juiz de Fora, respectivamente, para viajar o mundo de carro por três anos e meio. O casal, que chamou atenção da mídia pela primeira etapa do livro ‘Terra Adentro- Entre os extremos das Américas’, onde registram em fotografias as paisagens que visitaram, voltou a ser destaque na imprensa esta semana.
Eles estavam em um grupo de 17 estrangeiros que montaram acampamento em um terreno a cinco quilômetros da cidade de Sassandra, na Costa do Marfim, e estavam pedidos de deixar o local por causa da pandemia de Coronavírus. Eles enfrentavam olhares desconfiados e de reprovação da comunidade local e autoridades. Na quarta-feira (25), todos chegaram a ter seus passaportes confiscados. Na sexta-feira (27), finalmente conseguiram deixar o acampamento e foram acolhidos pela embaixada brasileira em Abidjã, onde têm a expectativa de conseguir um voo de repatriação.
Nesta entrevista concedida ao DIÁRIO, eles relatam o que enfrentaram desde a chegada na Costa do Marfim e ressaltam que pretendem seguir viagem após a situação do Coronavírus se normalizar.
Antes da crise do Coronavírus vocês estavam em Guiné Bissau. Quais circunstâncias culminaram na ida de vocês para a Costa do Marfim?
Eu e o Henrique Fonseca, que é meu namorado, estamos fazendo uma viagem de volta ao mundo. Somos fotógrafos documentais, sou jornalista e ele economista. E há três anos e meio estamos viajando visitando todos os continentes e documentando através de nossas fotos e livros. O objetivo da nossa viagem vai além do turismo, por causa do nosso trabalho de fotografia. Visitamos as Américas e lançamos um livro de fotografias e literatura, já visitamos a Europa e agora estamos na terceira etapa da viagem visitando a África Ocidental. É uma região bem isolada e remota, nosso trabalho aqui é muito importante, pois temos retratado culturas que são pouco visitadas e, por isso, esse foi o maior objetivo de chegar até aqui nesses países que são esquecidos no mundo como Guiné Bissau, Guiné, Costa do Marfim, Mauritânia e Senegal.
Quando estávamos em Guiné Bissau, ficamos bastante tempo, até hoje lá não tem nenhum caso de Coronavírus, mas, essa questão se tornou mais forte mundialmente. Foi decretada a pandemia, só que não esperávamos que essa questão fosse virar um problema aqui no continente africano, no sentido de fechar fronteiras, aeroportos, estradas e também para nós estrangeiros. Por isso, seguimos viagem, saímos de Guiné Bissau, passamos para Guiné que é um país que fala língua francesa, são países que hoje em dia estão enfrentando muita instabilidade política, por isso passamos até mais rápido por lá, mas, quisemos passar para documentar. Mesmo assim, quando estávamos em Guiné a situação foi mudando de forma muito crítica, as fronteiras da África começaram a se fechar, começaram a surgir boatos de toque de recolher e também alguns aeroportos, os países da região começaram a fechar, por isso tentamos cruzar o mais rápido possível para a Costa da Marfim que já era o nosso destino e é um país mais estruturado.
Como foi esse processo de atravessar a fronteira para conseguir chegar à Costa do Marfim?
Quando cruzamos a fronteira aqui pra Costa do Marfim, estava autorizada a entrada de qualquer turista estrangeiro, que estivesse vindo de países que tinham menos de 100 casos de Covid-19. Como viemos de Guiné Bissau que não tinha nenhum caso e também não tem até hoje; e de Guiné que tem casos só na capital e são poucos, fizemos uma avaliação de saúde e conseguimos entrar. Cada dia a situação foi ficando mais fechada e mais rigorosa, logo depois que entramos os aeroportos aqui do País fecharam, as fronteiras também de forma geral, ninguém sai e ninguém entra; e as estradas também começaram a se fechar, houve toque de recolher. Primeiro, é preciso escolher o desporto que mais lhe interessa. mostbet Todos os novos clientes podem receber até 300 euros como incentivo para o seu primeiro depósito Por conta dessa situação resolvemos encontrar um lugar seguro para ficar em isolamento e até essa situação toda do Coronavírus passar.
Quais são as características do local que fixaram acampamento? Como era a rotina e estrutura de sobrevivência?
A gente participa de um grupo de apoio a quem está viajando nessa região da África e uma mulher que é alemã, ela é casada com um local aqui da Costa do Marfim, eles possuem um terreno, que é um acampamento, um surf camping, em frente a uma praia no norte do País, mais precisamente alguns quilômetros da cidade de Sassandra. Ela fez um convite no grupo, para quem tivesse no país viajado e pudesse se recolher nesse lugar para ter segurança e esperar a situação passar, ficar em isolamento social. No camping se juntaram 17 pessoas ao todo, contando conosco, são cinco brasileiros e o restante são de nacionalidades europeias, como inglês, alemão, austríaco, espanhol e holandês. É um acampamento bem difícil, não tem água encanada, não tem eletricidade, precisamos andar quase um quilômetro para pegar água na vila. Estávamos com muita dificuldade de ir à cidade fazer compras de comida porque estava havendo uma certa hostilidade da população, porque eles ficam com medo. Eles vêm nós que somos estrangeiros, pensam que podemos ser portadores do Coronavírus e trazendo pra cá, o que não é verdade já que viemos de regiões que não têm nenhum caso. Estamos aqui expostos ao vírus da mesma forma que qualquer pessoa local. Saímos algumas vezes somente para comprar comida.
Como vocês foram recebidos inicialmente pelas autoridades e como foram as negociações?
Essa semana, começou um grande problema, que foi em relação às autoridades locais. A polícia começou fazer visitas a esse acampamento e a se incomodar com a nossa presença lá. Quarta-feira (25) chegou um grupo muito grande de pessoas, entre eles polícia, exército, autoridades de saúde, prefeitura, até o governador aqui da região; quase 30 pessoas. Eles estavam nervosos e disseram que não tínhamos autorização para ficar ali, apesar de que era uma propriedade privada. Nos trataram com hostilidade e dizendo que poderíamos ir para o hospital ficar de quarentena, levaram nossos passaportes embora. Foi aí que entramos nas nossas redes sociais, onde divulgamos nosso trabalho de fotografia e pedimos suporte do Itamaraty, da nossa embaixada aqui na Costa do Marfim para nos ajudar, porque é ilegal qualquer pessoa tomar o nosso passaporte, ele é propriedade do Brasil, segundo o embaixador aqui. Somente no final desse dia conseguimos recuperar nossos passaportes, mas a situação ficou muito instável. Quinta-feira(26), a Polícia voltou e tentamos cada um com a sua embaixada, o pessoal da Europa com a sua embaixada e nós com a embaixada local, uma permissão, já que as estradas estavam fechadas, para chegar até a capital Abidjã e lá sermos acolhidos pela embaixada brasileira, já que a situação aqui no País está complicada. As coisas ficaram tão hostis que até saímos nos jornais do país com várias informações erradas, disseram que eram todos italianos, que estávamos ilegais nesse acampamento. Isso criou um pânico geral em torno de nós, sem a menor razão e por isso solicitamos muito ajuda para nos levar em segurança e sermos acolhidos lá, até a situação passar.
Vocês conseguiram deixar o acampamento. Qual o próximo passo?
A embaixada deu suporte, agora, neste momento (às 9h20 de sexta-feira, 27 de Março- Horário de Brasília) estamos saindo do acampamento, estamos em comboio todos os carros. A polícia está nos levando até a capital, são 300 km de onde estamos e a embaixada do Brasil vai nos acolher. Quando estivermos lá nosso próximo pedido é uma repatriação para o Brasil, que é um voo, já que o aeroporto está fechado o Itamaraty está articulado para conseguir um voo pra gente ir embora para o Brasil, já que hoje não conseguimos ir por conta própria.
Após tudo isso, vocês ainda pretendem continuar seguindo viagem pelo mundo?
Queremos sim, seguir viagem, continuar nosso trabalho, nossos dois livros publicados são um sucesso de vendas, temos artigos em vários, temos o nosso site que é muito nem visitado. Hoje é o nosso trabalho mesmo, consideramos que é um trabalho de relevância já que somos dois fotógrafos brasileiros que estão visitando regiões extremas do mundo, conhecendo a cultura, as paisagens, outros idiomas, outras formas de vida e isso tudo está sendo documentado para levarmos para o Brasil pra um trabalho que fazemos. Apesar de todas as dificuldades que passamos fazemos com muito amor e pretendemos continuar fazendo isso. Somos de Minas Gerais, Henrique de Caratinga, eu de Juiz de Fora, consideramos que é um trabalho também muito importante para as nossas cidades. É um trabalho de muita relevância, queremos continuar fazendo isso. Esperar agora só essa situação do coronavírus que afetou a todas as pessoas do mundo passar, se Deus quiser conseguimos chegar nesse voo de repatriação para o Brasil, esperar tudo voltar ao normal para continuarmos nossa viagem.