Número de medidas protetivas aumentou durante pandemia: Judiciário, MP, PM, PC e parceiros formam rede de apoio
CARATINGA- A rede de Atendimento e Enfrentamento à Violência Doméstica, formada por representantes do Judiciário, Ministério Público, polícias militar e civil e outros parceiros, está buscando se fortalecer em Caratinga e região. O número de pedidos de medidas protetivas apreciados na 2ª Vara Criminal aumentou consideravelmente durante a pandemia, conforme destaca o juiz Marco Antonio de Oliveira Roberto.
O juiz explica que a rede já está instalada, em funcionamento e o objetivo é reforçar as ações. “Desde o começo da pandemia foi notado um aumento muito significativo dos casos de violência doméstica e familiar contra o gênero feminino. Notei isso pelo aumento da distribuição de medidas protetivas e os consequentes inquéritos policiais que, posteriormente, se tornaram ações penais. A Lei Maria da Penha prevê atuação da rede como política pública, é uma ação afirmativa que visa a igualização dos direitos entre a mulher e o homem, em razão da desigualdade histórica que sempre existiu. O objetivo é trabalhar com uma atuação extrajudicial, mas, sempre de uma forma articulada com o Poder Judiciário, Ministério Público e outras instituições”.
A intenção é criar um fluxo de atendimento, com enfoque preventivo e na erradicação da violência. “Quem faz o primeiro contato com a vítima é a Polícia Militar, através da Patrulha de Prevenção à Violência Doméstica-PPVD; depois a vítima é encaminhada para a Delegacia de Polícia, registrada a ocorrência, feito o pedido de medidas protetivas e a ideia é estabelecer na decisão que estipula as medidas protetivas, o encaminhamento, tanto da vítima, quanto do agressor à rede de enfrentamento. É uma rede socioassistencial, com uma equipe multidisciplinar, psicólogo, assistente social, pedagogo, conforme o que o caso demandar”.
Com relação ao agressor, o encaminhamento será uma obrigação, conforme já permite a Lei Maria da Penha. “Que o agressor seja encaminhado para acompanhamento psicossocial de uma forma coercitiva, como medida preventiva, de modo que, em caso de descumprimento, ele pode incorrer em um crime específico, de desobediência, sem prejuízo, uma prisão preventiva”.
A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
O magistrado explica o porquê houve um aumento significativo nos casos de violência doméstica. “As próprias pesquisas apontam isso. Com o confinamento social, as pessoas ficaram muito próximas, então, isso inevitavelmente gerou conflitos intrafamiliares ou acirrou os já existentes. As pessoas ficam mais ansiosas, nervosas e acaba gerando ou agravando a situação de violência”.
Na quinta-feira (29/7), foi sancionada a Lei 14.188, de 2021 que inclui no Código Penal o crime de violência psicológica contra a mulher, a ser atribuído a quem causar dano emocional “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões”.
O crime pode ocorrer por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro método. A pena é de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
Marco Antonio frisa que esta mudança representa uma vitória para o enfrentamento da violência doméstica. “Já era realizada a Campanha Sinal Vermelho, para a mulher informar a situação de risco. A campanha teve sucesso e se tornou lei. E também essa mesma lei prevê uma nova pena, quando a lesão corporal for cometida com base no gênero feminino e também o crime de violência psicológica. Foi um grande avanço, porque posso dizer que a maioria dos casos de violência baseada no gênero é de cunho psicológico. E, muitas vezes difícil de ficar comprovado”.
O juiz cita ainda que, em muitos casos, a mulher tem receio de denunciar, o que envolve questões psicológicas, o que é compreensível, pois a fica intimidada, temendo retaliações. “Especialmente, porque as leis posso dizer que ainda são brandas. Houve agora essa modificação legislativa bem recente, mas, destaco também o acompanhamento psicossocial a cargo da rede, principalmente quando a mulher sofre a violência psicológica, que não há uma agressão física, mas, fica sofrendo constantes ameaças, humilhações, ridicularizações, entre outras situações que afetem a saúde mental, eu destaco a importância de procurar a rede. Às vezes a mulher não tem o empoderamento para tomar uma atitude e é importante atuação da rede justamente para orientá-la e dar um suporte”.
Marco finaliza chamando atenção para o fato de que ainda é bastante comum que por muitas vezes, a vítima desista de seguir com o processo contra o agressor. “Verifico isso nas audiências, a mulher denuncia, gera um inquérito policial, uma ação penal e chega na audiência, ela muda a versão. Diz que não foi bem assim, que estava nervosa porque ocorreu uma discussão. Ou admite o fato, mas, diz que repensou, reatou porque foi um episódio isolado e ele é muito bom, carinhoso e estava nervoso. Sempre usa uma justificativa, geralmente tem a dependência financeira, a vergonha, porque é humilhante saber que sofre algum tipo de violência. Tem a dependência emocional, porque às vezes a pessoa gosta, ama, tem o afeto mesmo sendo uma relação tóxica. Mas, costumo dizer que a maioria é por medo, por pressão, por coação, infelizmente”.