Recordar fatos interessantes do passado é às vezes uma forma de deleite. Acontecimentos simples, muitas vezes nos mostram como o tempo mudou a vida e a maneira de nos comportarmos. Não sei se é por causa do isolamento social, só sei que estou meio saudosista.
Lembrei-me do meu tempo de Colégio do Carmo. Entre os conteúdos a estudar, havia aula de Polidez. E Polidez não era só civilidade ou educação, era mais do que isso. Era a finura da educação, o ponto alto da arte de conviver. Eram adotados modos finos, quase sublimes. Por exemplo: a polidez nos ensinava a subir as escadas pelo meio, sem arrastar os pés. Atitudes que feriam a polidez eram falar alto, fazer fuxico, chegar atrasadas às reuniões, recusar os convites para o aniversário de colegas, falar palavrões. Eram atos de polidez pedir licença, cumprimentar, pedir desculpas, devolver os livros que alguém nos havia emprestado. Ensinavam até como devíamos nos portar à mesa durante as refeições: colocar os pulsos na beirada da mesa, comer sem conversar e mastigar de boca fechada.
No início do ano, a Irmã Francina, professora de Educação Física, media e pesava todas as alunas para garantir a saúde diante dos exercícios. Tínhamos que tirar os sapatos para subir na balança. Nessa hora, muitas alunas apresentavam meias furadas. A gente não podia rir nem debochar. Engolíamos o riso, mas era muito engraçado ver as meias furadas com o dedão de fora.
E mais: Estávamos organizando uma festa em homenagem à madre superiora, que na época era a Madre Aparecida – uma freira amável, alegre que deixou saudades em todos que a conheceram. O evento era para o dia do diretor, 8 de setembro. Ela sabia que haveria essa comemoração porque via os ensaios e ouvia os comentários. Adiou uma viagem para não perder esse momento. No dia, reunimo-nos no salão grande todo enfeitado. Ela adentrou o local sob aplausos e vivas, correspondendo à nossa alegria com acenos e risos. Assistiu à festa e no final pediu o microfone. Agradeceu dizendo não ser merecedora de tão grande homenagem e que era apenas uma simples freira. Ela concluiu: “Fiquei aqui para assistir a esse evento por dois motivos: primeiramente, eu desejo educar vocês para terem respeito e carinho com o superior. É importante respeitar a hierarquia. Recebo essa homenagem como superiora e não como feira. E o outro motivo de eu ter ficado é por eu não querer recusar a festa que vocês preparam com tanto gosto. Se eu faltasse, seria uma grande falta de polidez.”
E assim era a Educação naquele tempo, cheia de momentos de ética. A Polidez há muito tempo já saiu do currículo, mas, às vezes, ela faz falta. Ela nos fazia caminhar em paz valorizando gestos de afeto e de pura educação.
Marilene Godinho