Professor Antônio Fonseca da Silva
O famoso escritor brasileiro Luis Fernando Verissimo, que também é jornalista, tradutor, roteirista de programas para televisão e músico, é conhecido também por suas crônicas e contos de humor! É impossível não dar boas risadas com seus textos. Funcionam como um verdadeiro desopilador de fígado. Faz bem ler a qualquer hora: quando acorda, antes ainda de ler as mensagens do WhatsApp, no meio da manhã, quando o trabalho começa a exigir uma pausa para tomar fôlego, até após o almoço, depois de uma caprichada feijoada… agora, sim, confirma-se que os textos de Verissimo são muito bons! Passaram até no teste da feijoada! Sugiro evitá-los à noite, antes de dormir, pois, com certeza, você vai começar a rir quando estiver quase pegando no sono, mas certamente vai dormir muito feliz! Então vale a pena!
A crônica “Defenestração” é uma dessas preciosidades. Nela o humorista questiona o significado das palavras, mostra-se intrigado com o sentido delas e logo no início já aponta suas inquietações! “Certas palavras têm o significado errado. Falácia, por exemplo, devia ser o nome de alguma coisa vagamente vegetal. As pessoas deveriam criar falácias em todas as suas variedades. A falácia Amazônica. A misteriosa falácia Negra. Hermeneuta deveria ser o membro de uma seita de andarilhos herméticos. Aonde eles chegassem, tudo se complicaria. -Os hermeneutas estão chegando!”[…]. Defenestração é outra palavra que inquieta o autor que antes de olhar seu significado no dicionário supõe diversos significados para ela, é claro, todos eles diferentes do seu sentido real.
Ao leitor sugiro a leitura, pois tal crônica nos faz pensar no significado de algumas palavras, achamos algumas feias, como “estapafúrdia”, estranha mesmo! Outras vezes nos divertimos com uma palavra e seus múltiplos significados como, por exemplo, a palavra aperto, do verbo apertar e seus derivados: tais como: apertar, apertado, apertão, aumentativo de aperto, apertilho, diminutivo de aperto, apertíclo, apertura, apertadura, apertamento. Será que já usamos todas? Mas há muitas outras relacionadas, derivadas de apertar, como: comprimir, unir fortemente uma coisa a outra.
Segundo o professor Francisco da Silveira Bueno, em seu Grande Dicionário Etimológico-prosódico da Língua Portuguesa, apertar é uma palavra oriunda do latim tardio “appertorare”, que significa estreitar ao peito e sua primeira forma foi “apetrar” e depois com a metátese da vibrante tornou-se apertar. O autor esclarece o sentido de apertar como: adstringir, (você já viu ou ouviu alguém usando), estreitar, segurar fortemente, comprimir, unir fortemente uma coisa a outra, apertucho.
Essa palavra é tão significativa que às vezes aperta ou alivia. Imagine que você trabalha em uma empresa e seu gerente ou chefe lhe passa uma tarefa a ser cumprida em dois dias, por exemplo. Aperto! Você começa a executá-la e percebe que não conseguirá cumpri-la em dois dias e aí o aperto se torna apertadura, apertamento, apertão, mas há uma ordem a ser cumprida. Como fica o coração? Apertado! Você pensa que será dispensado. Você tem família. O primeiro dia chega ao fim, noite mal dormida e chega ao segundo dia, aperto, mais aperto. O seu gerente precisa de resultado e você não o tem. Como lidar com o tempo nessa ocasião sendo pouco para quem executa e muito para quem ordena? Eis o aperto, também em pensar o que fazer como fazer, e o que será amanhã…
Essa mesma palavra pode causar medo, desconforto. Você é parado numa blitz e está sem documento!… Você fala, argumenta, todavia haverá certamente uma multa, o seu carro será guinchado, mais tempo e gastos e o seu salário comprometido, como pagar? Aperto…
E assim a palavra “aperto” vai se afrouxando, desapertando em seus diversos sentidos: Aproximar muito; comprimir, espremer como, por exemplo, apertar as pessoas em uma fila. Diminuir, encurtar, estreitar, como, por exemplo, apertar roupas largas. Segurar com força, como, por exemplo, quando se quer proteger o filho de um perigo iminente. Fixar, firmar, como, por exemplo, apertar o cinto de segurança no avião. Exigir, pressionar significa, por exemplo, apertar alguém com palavras ameaçadoras. Afligir, angustiar, molestar, por exemplo, terríveis apreensões apertam-lhe o coração. Tornar-se intenso, rigoroso, como, por exemplo, o verão que nos apertou em janeiro e fevereiro. Há tantos outros apertos agradáveis e desagradáveis, como aperto financeiro, por exemplo, mas também apertos que nos fazem bem, como um aperto de mão e um abraço espontâneos e sinceros.
Certo é que as palavras são fascinantes, evoluem com o tempo e constroem sentidos diversificados que causam inquietações tanto aos gênios e imortais quanto a nós reles mortais.
* Antônio Fonseca da Silva é Reitor e professor de Linguística do Centro Universitário de Caratinga – UNEC. Mestre em Administração pela Fundação Pedro Leopoldo. Mais informações sobre o autor:
http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4137123U3