Verbas pecuniárias financiaram consultório odontológico, marcenaria e cobertura de pátio do regime fechado
CARATINGA- A Associação de Proteção e Assistência aos Condenados (Apac) de Caratinga realizou na manhã de ontem, a cerimônia de três inaugurações na unidade: consultório odontológico, marcenaria e da cobertura do pátio do regime fechado.
O evento contou com a participação de recuperandos, seus familiares e autoridades. A mesa principal foi composta por Elan Tebas, presidente da Apac; Consuelo Silveira Neto, juiz da 1ª Vara Criminal de Caratinga; Maicson Borges Inocêncio de Paula, promotor da 2ª Vara Cível, Execução Penal e Juizado Especial Criminal de Caratinga; Paulo Cezar Azevedo de Almeida, defensor público; Maria Alice
Mendes Gomes, diretora do presídio de Caratinga; Valter Cardoso de Paiva, presidente da Câmara de Caratinga; Marco Antônio Ferraz Junqueira, dentista e apoiador do projeto do consultório odontológico; Jaelson Gomes, presidente do Conselho de Pastores e Welington Moreira, prefeito de Caratinga.
Em seu pronunciamento, Elan Tebas ressaltou o trabalho desenvolvido pela instituição e a importância da sociedade se unir a este projeto. “Nesse momento estamos fazendo algo muito importante. Estamos buscando uma integração muito maior com a sociedade que nós vivemos. A Apac, todo mundo que vem aqui diz que fica maravilhado quando chega e encontra este ambiente, em se tratando de um ambiente prisional. Aqui nessa instituição ninguém fica sem uma atividade, seja laborterápica, produtiva ou até mesmo instrutiva. Um dos erros que a humanidade comete é segregar os seus filhos que cometem erros, até mesmo sem entender que história essa que está por trás desse erro. Precisamos ter uma mudança nessa mentalidade”.
REFLEXÃO
O juiz Consuelo destacou que todas as obras inauguradas são oriundas de penas pecuniárias. O gabinete odontológico ainda contou com a colaboração do dentista Marco Antônio, que doou a cadeira, considerada a principal ‘peça’ do consultório. Ele ainda falou sobre o trabalho em equipe e a importância da reflexão ao recuperando. “Gostaria de realçar que todo o trabalho desenvolvido é de várias mãos. Nada seria possível sem o apoio dos servidores do Poder Judiciário. (…) Desde quando aqui assumi, sempre caminhamos de mãos dadas. Sempre objetivando a melhoria e a valorização do cumprimento dos elementos do método da Apac, para recupera aqueles que aqui se encontram cumprindo pena. O trabalho dos voluntários é fundamental e essencial. Sem o apoio da sociedade organizada não existe uma Apac que seja efetiva naquilo em que ela foi construída ou criada. O cidadão
quando adentra a Apac, o objetivo maior nosso é que ele possa refletir o erro cometido e sair daqui um novo homem, para que retorne à sociedade junto a sua família, aos seus entes queridos e viver uma vida fora da criminalidade”.
Consuelo ainda citou uma passagem bíblica em João, capítulo 8, de uma mulher surpreendida em adultério, para exemplificar a necessidade de compaixão sem julgamento. “Eles queriam testar Jesus, porque Ele teria que cumprir a lei e também por ser um ser humano de extrema bondade, como iria dizer ali que era para a mulher ser apedrejada? Jesus disse: ‘Atire a primeira pedra aquele que nunca errou’. Em nenhum momento, quando essa mulher é indagada por Jesus, onde estão os seus acusadores, ela procurou se defender. Ela podia simplesmente dizer: ‘Eu não cometi adultério’. Ela disse apenas: ‘Eles foram embora’. Está aí a misericórdia de Deus. Jesus perdoa aquela mulher e acima de tudo, lhe dá a misericórdia. E agora me dirijo especialmente aos educandos, porque a Apac é uma obra de Deus, que precisa estar a todo o momento sendo construída e reformulada”.
Para o juiz, a responsabilidade dos recuperandos é de manter a efetividade da Apac, para que a instituição possa dar a oportunidade a outras pessoas de se recuperarem. “Peço a Deus e espero que cada um de vocês (recuperandos), quando receberem o alvará de soltura e forem se dirigir para as casas, viver novamente com seus familiares, possam ecoar nos seus corações a palavra de Jesus para com a adúltera: ‘Vá e não peques mais’”.
APOIO DA SOCIEDADE
Em sua fala, o promotor Maicson Borges enfatizou o trabalho da Apac como uma inovação dentro do sistema prisional e citou a necessidade de envolvimento da sociedade no processo de ressocialização. “Estamos num processo de repensar o sistema prisional e o método Apac veio exatamente dentro desse
processo humanitário, de forma a repensar como deve ser cumprida essa pena, para concretizar de maneira fiel a efetiva ressocialização. (…) Somos seres coletivos, vivemos em uma sociedade, existem normas a serem seguidas e alguns contrariam essas normas, mas a sociedade tem que estar disposta a receber aqueles que mesmo tendo praticado algo de ilícito, possam demonstrar a sociedade que respeitam os seus valores”.
O defensor público, Paulo Cezar Azevedo fez questão de relatar do quanto a Apac representa em seu trabalho. “É uma inspiração tão grande para o meu trabalho, uma renovação tão grande de esperança daquilo que eu faço no meu dia a dia, como defensor público. Vejo pessoas com as quais eu esbarrei nos primeiros passos da minha carreira e percebo o quanto que o trabalho desenvolvido acaba surtindo bons frutos. Quando vejo pessoas que tive a oportunidade de defender, que realmente batalhei e fiz o
melhor que pude; mas, vejo elas hoje respondendo por um erro que eventualmente cometeram em suas vidas, aquela roupa vermelha, aquele uniforme, as algemas, já foram retiradas. Eles já estão aqui vestindo roupas, olhando pra cima. A primeira vez que eu vi, muitos dos que estão aqui sequer me encaravam nos olhos. Acho que esse é o primeiro processo de dessocialização da pessoa, quando ela não tem a capacidade de olhar para o outro, talvez porque já tenha ao longo de sua trajetória, sido tão julgada e pré-julgada que já não consegue encarar o outro. Vejo a Apac como uma esperança”.
Ele ainda destacou que “se errar é humano, a pessoa que errou é humana. Nós erramos. Não podemos diminuir o outro, por conta de um eventual equívoco que ela tenha cometido”.
O prefeito de Caratinga, Dr. Welington (DEM) também elogiou o trabalho desenvolvido pela Apac e falou da segunda chance que é dada aos recuperandos. “Digo a vocês com propriedade, a minha vida profissional toda está construída dentro da Segurança Pública. Vivenciei de perto a resistência que se tinha dentro do órgão governamental de segurança pública à construção e implantação das Apacs. E hoje tem sido a salvação da segurança pública, da sociedade. Aos que hoje estão aqui como internos, estão tendo a oportunidade ímpar de serem enxergados como seres humanos, pessoas que necessitam realmente de uma palavra amiga, uma mão, que mostre seu verdadeiro valor. Demonstrar que é capaz, que pode e consegue, basta querer”.
INAUGURAÇÕES
A marcenaria inaugurada recebeu o nome do presidente da Apac, Elan Tebas; a unidade de trabalho tem capacidade para produção de móveis planejados. Já o consultório odontológico foi intitulado ‘Consuelo Silveira Neto’ e oferecerá atendimento aos recuperandos, por meio de dentistas voluntários. O descerramento da placa de inauguração foi acompanhado por familiares do juiz.
O dentista Marco Antônio, como apoiador do projeto comentou sobre o trabalho que será realizado no consultório odontológico e da importância do voluntariado. “É um grande exemplo de solidariedade, de esperança a uma sociedade melhor. Nossa contribuição na verdade foi um ‘tijolo’ nessa grande obra, que estimulou ao pastor Elan. Cada um dá uma contribuição, falo para todos os colegas dentistas: ‘O trabalho de vocês é o mais importante’. Construir uma obra é difícil, mas mantê-la em pé é ainda mais. A odontologia é uma profissão que exige dedicação do profissional. Quero parabenizar os voluntários, todos fazendo sua parte não é sacrifício pra ninguém e juntos, cumprimos nossa missão”.