O lendário David Bowie, um dos artistas mais revolucionários do século 20, morreu neste domingo, 10. Ele tinha 69 anos. A informação foi divulgada nas redes sociais do cantor
DA REDAÇÃO – “David Bowie morreu em paz hoje (domingo/10), cercado por sua família depois de uma corajosa batalha de 18 meses contra o câncer. Enquanto muitos vão dividir a dor pela perda dele, pedimos que vocês respeitem a privacidade da família neste período de luto”, informou o comunicado oficial.
BIOGRAFIA
Nascido David Robert Jones, em 8 de janeiro de 1947, na cidade de Brixton, Londres, Bowie formou a primeira banda aos 15 anos, The Konrads. Ele adotou o sobrenome Bowie em meados dos anos 1960, já que seu sobrenome de registro gerava confusão com Davy Jones, do grupo The Monkees.
O pai dele, Heywood Jones, trabalhava em uma instituição de caridade para crianças e a mãe, Margaret Mary Jones, era garçonete. Uma briga com um colega de escola deixou a pupila de um dos olhos de Bowie permanentemente dilatada. Ele começou a tocar saxofone no início da adolescência. Aos 20 anos, já tinha passado um tempo em um monastério budista na Escócia e trabalhado em companhias teatrais.
O primeiro single, “Liza Jane”, saiu sob o nome Davie Jones with the King Bees, em 1964, sem sucesso. A carreira do artista começou a tomar forma com o lançamento do álbum de estreia, homônimo, em 1967. Mas o primeiro marco veio no segundo trabalho, também chamado David Bowie (e depois rebatizado como Space Oddity), em 1969, com a música-título. O verso inicial se tornou um clássico: “Ground control to Major Tom”. Este álbum também foi o início da parceria de Bowie com Tony Visconti, produtor que viria a trabalhar com o artista diversas vezes mais tarde. É de Visconti, inclusive, a produção dos dois últimos discos de Bowie, The Next Day (2013) e o recém-lançado Blackstar, que chegou ao mercado na última sexta, 8.
É possível dizer que em seus primeiros anos Bowie teve como uma de suas principais influências o cantor e compositor britânico Scott Walker. Bowie, no entanto, viria a se tornar uma influência para um sem número de artistas. Sempre destruindo padrões, ele passeou por inúmeros gêneros: glam rock (o personagem Ziggy Stardust, do disco Ziggy Stardust and the Spiders from Mars, é um dos mais emblemáticos da história do rock), soul, música eletrônica, entre tantos outros.
Na lista de seus inúmeros hits, estiveram “Changes”, “Fame” (composta em parceria com John Lennon) e “Heroes” (trilha da adaptação cinematográfica do livro ‘Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada, Prostituída’). O impacto dele na música é imensurável – entre os músicos que fizeram covers de suas canções e que em algum momento o citaram como influência estão Nirvana, Joan Jett, Duran Duran, Smashing Pumpkins, Marilyn Manson, Arcade Fire, Oasis, Ozzy Osbourne, Morrissey, Beck, Red Hot Chili Peppers, Lady Gaga, Bauhaus e Nine Inch Nails.
Inquieto e inigualável, Bowie também teve, no entanto, períodos de baixa, na segunda metade dos anos 1980 e na década de 1990. Mas sempre foi capaz de se reinventar. Blackstar é um exemplo disso: já considerado um ponto alto em uma carreira que teve diversos pontos altos, o disco de sete faixas mistura jazz, rock e elementos de música eletrônica de maneira experimental e inovadora.
Em 2004, durante a turnê do disco Reality, Bowie sofreu problemas do coração e interrompeu abruptamente a excursão. Foi o início de um longo período distante da mídia e dos estúdios. O silêncio – ao menos musical, já que Bowie há anos não concedia uma entrevista – foi quebrado em 2013, com o lançamento surpresa da canção “Where Are We Now?”, no dia do aniversário de 66 anos de Bowie.
A carreira de ator também foi frutífera, com o astro tendo papeis memoráveis em filmes como O Homem que Caiu na Terra (seu primeiro papel em um longa-metragem), Labirinto e Fome de Viver, para citar alguns. Em 1980, foi protagonista na produção teatral O Homem Elefante. No ano passado, trabalhou na concepção do musical teatral Lazarus, que dá continuação à história do personagem de O Homem que Caiu na Terra.
“Lazarus” é também o nome de uma das músicas de Blackstar. Nos clipes desta canção e da faixa-título do álbum, Bowie deu, pela derradeira vez, amostra de sua veia teatral e performática.
Bowie casou pela primeira vez em 1970, com Mary Angela Barnett. Um ano depois, Angela deu à luz o filho do casal, Duncan Zowie Haywood Jones. Os dois se divorciaram em 1980.
Enquanto ainda estavam juntos, Bowie disse ser gay em 1972 e, em 1976, afirmou que era bissexual. Mais tarde, se arrependeu da declaração. “O maior erro que já cometi foi ter afirmado àquele jornalista que era bissexual”, falou à Rolling Stone EUA em 1983. “Jesus, eu era tão jovem naquela época. Estava experimentando.”
Em 1992, Bowie casou com a modelo e empresária Iman, com quem teve uma filha, Alexandria Zahra Jones, no ano 2000.
IMPORTÂNCIA
A morte de David Bowie foi lamentada em todo o mundo. Poderíamos mostrar depoimentos de vários artistas, mas preferimos ‘regionalizar’ a notícia e apresentar o que pensam o cartunista Camilo Lucas e o editor José Horta sobre o grande ‘Camaleão do Rock’.
“Meu primeiro disco do Bowie foi o Alladin Sane. Lembro dele enfeitando a vitrine da Casa Santa Maria em 1973, e todos os meus amigos – especialmente meu primo Júnior Assis , que era – ainda é – um dos meus mentores musicais, só falavam em Bowie. Eu tinha 13 anos e acabei comprando o disco, com aquela foto dele com um raio pintado na cara. Como já era fã dos Stones, a primeira coisa que curti foi a versão dele pra “Let’s spend the night togheter” que vinha no disco, além da agitada “Jean Jeannie”; só depois de algumas audições fui assimilando coisas mais densas como “Driving Saturday”, “Panic in Detroit” e a faixa título.
Como curtia mesmo era rock mais pesado, como Alice Cooper, Kiss e Deep Purple, não continuei comprando discos do Bowie, só de vez em quando. O “Tonight” eu tenho até hoje – um disco subestimado dele nos anos 80, ainda mais porque saiu logo depois do “Let’s Dance“, que foi um sucesso avassalador, mas pra mim, uma das obras primas dele.
Bowie não precisa de mim pra ser um dos maiores nomes da música do século XX, não precisa dos detratores que o tratam como “modinha” (um cara que faz e acontece há cinco décadas, mas é “modinha”, vai entender), não precisa fazer sucesso na mídia, não precisa provar nada… Não precisa nem que eu fique aqui resenhando ele, pois com certeza isso vai acontecer bastante nos próximos dias, mas eu preciso dizer que fico triste, mas invejo um cara que fez tanto durante uma vida de 69 anos. Quando eu partir quero deixar alguma coisa que faça as pessoas se lembrarem de alguma obra que já produzi… nem precisa ser a obra ciclópica de David Bowie”.
Camilo Lucas, cartunista
“Ouvi ‘Lets Dance’ assim que foi lançada, em 1983. Tinha 14 anos na ocasião. E realmente senti o que a música propunha: vamos dançar. Também fiquei maravilhado com o clipe, que assisti no programa FMTV, que passava na extinta TV Manchete. O vídeo, dirigido por David Mallet e rodado na Austrália, mostrava como os aborígenes viam a cidade grande e como eles eram recebidos. Um verdadeiro choque de culturas.
Importante dizer que David Bowie foi um camaleão que sempre lançou tendências, ao contrário de alguns camaleões brasileiros que se ‘inspiram’ no que é feito lá fora e se dizem originais. Ele também era de opiniões que divergiam de seus contemporâneos: “Enquanto o mundo falava em paz e amor eu estava preocupado com a ida do homem à lua”, disse no final dos anos 60 depois de compor ‘Space Oddity’
Passei a pesquisar a obra de David Bowie e digo que o mais gosto é a trilogia de Berlim, feita entre 1977 e 1979, que resultou nos antológicos ‘Low’, ‘Heroes’ e ‘Lodger’. ‘Heroes’ está entre as minhas dez canções preferidas.
Engraçado que até as ‘derrapadas’ que ele deu em sua carreira, como os álbuns ‘Never Let Me Down’ (1987) e ‘The Buddha of Suburbia’ (1993) ou o projeto Tin Machine (do final dos anos 80), são mais instigantes que 80% do que é feito na música atual.
Bowie ainda era um cara que não se esquecia de seus amigos. Ele quem produziu ‘Transformer’ (1972) de Lou Reed e sempre deu uma ajudinha ao iguana Iggy Pop.
Bowie se foi, mas temos um alento: sua obra atemporal nunca irá nos deixar”.
José Horta, editor do Diário de Caratinga