* José Victor do Amaral Neto
Este texto, de um modo bem particular, tem como objeto demonstrar sob a ótica do dominado, a metáfora da dominação abordada por Morgan no capítulo 9, bem como explicitar a transição da forma de dominação pela tradição para a racional-legal numa empresa familiar.
Nesta empresa, embora os seus membros não necessariamente dependessem do aval dos demais para tomar as decisões, acordaram tacitamente que o grupo necessitava de um gestor para harmonizá-las, haja vista que as várias empresas concorriam entre si.
A concorrência, sem regras claras, promovia em diversos momentos mal-estar entre os familiares, que embora não explicitado, pendia no ar um clima de desconforto.
Assim fizeram contato com um profissional e o contrataram para assumir o comando do grupo, determinando-lhe autonomia para promover as alterações que se fizessem necessárias.
Com esta atitude a gestão que, conforme Weber, baseava-se na dominação pela tradição, começa a moldar-se no que ele denominava forma de dominação pela gestão racional-legal, a partir da contratação de um profissional que se tornou responsável por decisões anteriormente designadas aos sócios.
As dificuldades foram inúmeras. Além da gestão pela tradição, a presença dos sócios era forte entre os funcionários que não reconheciam por completo a legitimidade da autoridade investida nele pelo grupo familiar. Segundo Weber, a utilização destas formas de dominação de forma combinada pode provocar tensão, dado a instabilidade no processo decisório desta última e do favoritismo observado em relação a alguns, que em função da implantação de uma burocracia tende a desaparecer. No entanto, o elevado grau de autonomia para exercício de sua criatividade e iniciativa proporcionou a formação de uma dependência e subordinação pela classe secundária, face à implementação de regulamentos e procedimentos padrões, centralizando decisões e exigindo um maior grau de complexidade e conhecimentos específicos em atividades outrora designadas aos gerentes de loja.
O profissional, agora, em todos os aspectos tornara-se uma ferramenta de dominação dos detentores do capital. Embora, detinha o poder para fomentar os delírios de sua criatividade, reconhece que era dominado, não somente pelo respeito aos diretores, que obviamente era devido. Mas, pela manutenção do status-quo adquirido com o cargo. O salário maior ao que anteriormente recebia em proporções de dois por um, bem como sua inserção e o reconhecimento da autoridade pelo sistema, que inclui desde fornecedores a parceiros, estabeleceu tácita e ao mesmo tempo explicitamente uma forma de dominação pela manutenção de padrões sociais angariados pela maioria das pessoas.
A precariedade dos salários pagos no interior, é de certa forma, sustentada por um cartel informal, no que tange ao aliciamento ou propostas de transferência de funcionários de uma empresa para outra. Enquanto fores funcionário das empresas em que os empresários são amigos, dificilmente receberá uma proposta para compor o quadro destas, independentemente de suas qualificações profissionais, ou do destaque de suas ações em função da atividade exercida.
Portanto, ao exercer um cargo de confiança e embutido a este todas as cobranças que lhe são pertinentes e que por elas só provocam estresse, então acrescentamos todos estes ingredientes de instabilidade além da necessidade de manutenção de padrões, aliada ainda ao baixo ou nenhum reconhecimento de suas conquistas. Conquistas que quanto maiores forem, maiores serão as exigências em relação às próximas ações. Todos estes fatores culminam nos perigos ocupacionais abordados por Morgan em sua obra, especificamente no capítulo 9.
A válvula de escape, talvez, fosse a delegação de responsabilidades centralizadas neste profissional, mas a delegação traduz-se na arte de tornar-se “inútil”, pois as tarefas rotinizadas são mais visíveis e de fácil constatação. Assim, quanto maior o nível de abstração das tarefas e responsabilidades, maior a necessidade de conhecimento para avaliar o resultado, faltando, na maioria das vezes, sensibilidade para avaliar resultados intangíveis.
O que se percebe ao analisar o capítulo 9 da obra de Morgan, principalmente pela ótica do dominado, mais nos remete àquela peça de teatro que ele ilustra a introdução ao assunto: Como as organizações usam e exploram os seus empregados. O sentimento é semelhante ao descrito como “um bagaço de laranja”, não atingindo o extremo do suicídio, mas ao acusar o golpe da falta de reconhecimento, a mágoa é grande e fica a sensação de que somos uma ferramenta que pode ser utilizada ou descartada conforme demanda as vaidades ou necessidades das organizações.
* José Victor do Amaral Neto, Professor e Coordenador do curso de Ciências Contábeis do Centro Universitário de Caratinga. Formado em Ciências Contábeis, Pós Graduação em Administração e Marketing – Centro Universitário de Caratinga, Mestrando em Administração (MPA) – Faculdades Integradas de Pedro Leopoldo .
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