* Kelly Aparecida do Nascimento
Nossa filha Alice nasceu de 34 semanas, em fevereiro de 2015, e desde o primeiro exame de Ecocardiograma (ECO), na UTI (Unidade de Terapia Intensiva), Neonatal foi constatada uma comunicação interventricular (CIV), vulgarmente conhecida como sopro no coração.
A CIV é uma cardiomiopatia congênita e ocorre quando existe um orifício entre o ventrículo esquerdo e o direito do coração.
Na ocasião do exame, lembro-me muito bem, a médica disse que a CIV era comum em prematuros e que o orifício fecharia naturalmente.
Com 33 dias de UTI, Alice recebeu alta e seu novo destino foi a Pediatria, onde permaneceu por mais 7 dias. Nessa transição, solicitei que fosse feito novo ECO. Durante o exame foi verificado que a CIV dela não havia fechado e que, portanto, precisaria do acompanhamento de especialista cardiologista pediátrico.
Aos três meses de vida ela fez novo ECO. Durante o exame a médica disse que a CIV dela não fecharia mais e que, possivelmente, teria de fazer cirurgia depois de 1 ano. Orientou que aos 10 meses fosse feito novo ECO.
Sempre a levamos em um laboratório muito conceituado de Belo Horizonte. Mesmo assim, aos 10 meses, a Médica, muito experiente, fez o exame e, ao final, nos perguntou se seria possível no dia seguinte levá-la para fazer outro ECO com a aparelhagem do Hospital Biocor, referência em tratamentos de coração. Dissemos que sim e no outro dia cedo fomos ao Hospital indicado fazer o exame.
O ECO foi feito pela mesma Médica e ela procedeu normalmente sem comentários adicionais. Entretanto, cerca de 1 hora depois, quando já não estávamos no Hospital, meu telefone tocou e o médico especialista que a acompanhava informou que nossa filha estava com um problema grave, chamado Hipertensão Arterial Pulmonar (HAP), e que no dia seguinte pela manhã tudo já estava sendo providenciado para um cateterismo de urgência no Hospital Biocor. Era 17 de dezembro de 2015 e o Médico disse também que muito provavelmente ela faria uma cirurgia antes do Natal.
No outro dia de manhã fomos ao Hospital e o cateterismo foi feito. Alice permaneceu 24 horas internada e a médica residente que deu alta no sábado de manhã informou que ela seria liberada, mas que a equipe médica do Biocor iria se reunir para decidir o caso da nossa filha. Informou ainda que era mesmo grave, a pressão do pulmão estava muito alta, e que fariam contato na segunda-feira.
Apesar da doença grave, o que nos consolou um pouco naquele momento difícil é que ela estava aparentemente ótima e não apresentava nenhum sofrimento e assim sempre foi até os dias de hoje.
Naqueles dias a espera foi grande e só fomos comunicados pelos médicos na quarta-feira seguinte. O primeiro médico especialista que a acompanhava nos recebeu no Hospital onde ela nasceu para explicar o quadro da HAP. E assim foram feitos todos os esclarecimentos.
A HAP é caracterizada pelo aumento da pressão sanguínea nas artérias pulmonares, isto é, acontece devido ao estreitamento das artérias que ligam o pulmão ao coração. Com isso, o lado direito do coração é submetido a uma tensão crescente para bombear o sangue até os pulmões, o que desencadeia o seu aumento no referido lado.
Os valores de referência da pressão arterial pulmonar são de 18-25 mmHg. Assim, a HAP acontece quando a pressão nos pulmões ultrapassa 25mmHg. Os graus da HAP baseiam-se nos valores da pressão: (i) Hipertensão pulmonar leve – entre 25 e 35mmHg; (ii) Hipertensão pulmonar moderada – entre 35 e 45mmHg e (iii) Hipertensão pulmonar grave – superior a 45 mmHg.
Alice encontra-se no terceiro grau de HAP, visto que sua pressão é em torno de 60mmHg. Acredita-se que a HAP dela tenha causa multifatorial, podendo estar associada à prematuridade e à doença cardíaca congênita, a CIV.
O tratamento da HAP depende de cada paciente e da gravidade da doença, incluindo a administração de drogas, mudanças no estilo de vida e na nutrição, além da cirurgia. O último estágio são os transplantes de pulmão e de coração.
Neste momento, o tratamento da Alice é realizado somente através do Citrato de Sildenafila, que relaxa os músculos lisos pulmonares e provoca a dilatação das artérias pulmonares.
O médico que nos atendeu naquela quarta-feira, 23 de dezembro, nos orientou a passar as festas de fim de ano em casa e a retornar para Belo Horizonte somente após ests período. Informou que nada aconteceria com ela, fazendo a indicação do medicamento que ela usa até hoje.
Voltamos após o ano novo e tivemos a felicidade de conhecer um dos melhores cardiologistas pediátricos do Brasil no Biocor, com especialidade exatamente na HAP. Ele testou medicamentos durante 3 meses e após novo cateterismo afirmou que, ao contrário do que se esperava, o caso da nossa filha não poderia ser revolvido com cirurgia em função de a HAP estar muito alta. Lembro-me de ele dizer que debaixo das pontes da Medicina passam muitas águas e que em 10 anos tudo poderia ser diferente, mas naquele momento seriam somente os medicamentos. E com as graças de Deus assim estamos até agora.
A expectativa de vida das pessoas com HAP depende da causa da doença. Algumas doenças que desencadeiam a HAP podem melhorar com os anos e com o tratamento.
Enfim, sabemos que a HAP é uma doença que progressivamente se agrava e às vezes é mortal. Hoje Alice tem pouco mais de 3 anos, seu quadro está totalmente estável e vive uma vida normal. E quando a HAP bateu à nossa porta eu fui aprendendo que o segredo da vida é viver um dia de cada vez e entendi também que o dia de amanhã não nos pertence, está nas mãos de Deus.
*Profª M.Sc. Kelly Aparecida do Nascimento – Bacharel e Licenciada em Educação Física. Licenciada em Pedagogia. Mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade. Professora do Centro Universitário de Caratinga –UNEC.
Mais informações do autor (a), acesse: http://lattes.cnpq.br/12867154411002