Por Zilanda Souza – Profª Neuropsicopedagoga
Domingo é dia de ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio. Desde que a prova passou a ser um passaporte para a universidade, muitas escolas canalizaram toda a sua estratégia didática de sala de aula com finalidade em preparar a garotada para o ENEM.
Dentre as estratégias didáticas adotadas, foram incluídos inúmeros simulados dentro do processo de avaliação, iniciando já com os pequenos dos anos iniciais. O argumento¿ “É preciso preparar os meninos desde cedo.” Questões similares às do exame ou de vestibulares são encontradas nas avaliações com intuito de familiarizar os alunos com a proposta. Avaliações com extenso número de questões, premiação para as maiores notas. No Ensino Médio então, não se faz outra coisa a não ser preparar para o ENEM. E se o resultado não for tão bom, e se nenhum aluno da turma entrar para uma federal, a cena bíblica da prostituta a beira de um apedrejamento é reconstituída. No contexto escolar, a prostituta é representada pelos professores do ensino médio, as pedras são as acusações, o pedido dos pais de transferência para outra escola. Os apedrejadores podem ser a família, a direção da escola, os professores dos outros segmentos. A bancada da educação infantil isenta, até respira aliviada: “não fazemos parte do ENEM!” Eu não ouso ser Jesus Cristo nesse teatro, mas como boa revolucionária que também aprende com o mestre eu gostaria de apimentar a reflexão:
- Resultado de provas classificatórias é consequência. Consequência de um processo de ensino e estímulo de habilidades.
- Para o ENEM não basta saber conteúdo, matérias. Não é suficiente saber aplicar fórmulas. É um teste de resistência postural e mental.
- É preciso manejar informações longas. Além de apresentar uma leitura fluente, capacidade de raciocínio lógico é preciso saber extrair o que realmente é importante, reconhecer e eliminar distratores (aquelas informações que não possuem nenhuma utilidade para a resolução da questão). É preciso flexibilizar o pensamento, a ponto de perceber e transportar a aprendizagem da sala de aula para a avaliação e dentro da avaliação encontrar as aprendizagens da sala de aula, apresentadas em novo contexto. É preciso sustentar a atenção na resolução das questões e alterná-la entre os campos do conhecimento durante todo o percurso da prova. Usar o manejo do tempo e, sobretudo, manter o controle emocional. Emoções desreguladas podem ser bloqueadores da expressão da aprendizagem. Comportamentos impulsivos são os maiores responsáveis por aquele “errar sabendo”. Eu pergunto então: aprende-se essas habilidades na escola¿ O currículo escolar alcança essas habilidades¿
- As habilidades citadas no número 3 necessitam de pilares básicos para serem constituídas ao longo do desenvolvimento. Que pilares são esses¿
MOTOR – SENSORIAL – LINGUAGEM
Pilares que deveriam compor todo o currículo da Educação Infantil, fortalecendo assim o alicerce para o desenvolvimento da leitura, escrita e base aritmética. Esses pilares são a base cognitiva da criança. Desculpem os autores dos livros didáticos, mas não é objetivo da educação infantil aprender “Moradias”. Esse tema pode ser um bom pretexto para se estimular MOTOR, PERCEPÇÕES SENSORIAIS E LINGUAGEM! Crianças de 4 anos que escrevem o nome, fazem lindos álbuns de atividades, mas que não correm, não pulam, não rolam, não experimentam, não exploram todos os sentidos. Crianças que não exercitam sua autonomia, criatividade, que não aprendem sobre frustração, novas opções para começar um dia na escola ou uma atividade, não estão sendo bem preparadas para o ENEM, nem para nenhum exame que vá requerer suas habilidades no futuro. Existe uma exigência precoce de alfabetização altamente devastadora para o desenvolvimento de habilidades futuras! Aquela mãe orgulhosa da letra cursiva redondinha do filho de 6 anos , que não percebeu que uma fatia do desenvolvimento da sua criança foi prejudicada. Mais tarde, temos um adolescente com percepções comprometidas. Pouca habilidade de exploração e investigação. A educação infantil prepara para o ENEM e mais do que isso, prepara para a vida.
Eu sinceramente não estou certa de que o excesso de simulados preparam os alunos para o ENEM. Também não tenho certeza de que repetir questões de vestibulares e edições anteriores do exame venha preparar nossos meninos. Mas algumas convicções eu já tenho:
1: Professores do ensino médio não são os únicos responsáveis pela preparação dos alunos.
2: Pensar um currículo que acolha o estímulo de habilidades desde a Educação Infantil, respeitando o desenvolvimento dos meninos é fundamental.
3: A regulação emocional e o envolvimento da família na vida escolar do aluno mesmo depois do 6º ano e durante todo o ensino médio é primordial.
E por fim..
O ENEM não prepara nossos meninos para a vida. Mas uma educação que tem como pilar o desenvolvimento da criança e do adolescente e o estímulo de habilidades, contribui para a vida e para as avaliações classificatórias.
Profª Zilanda Souza – Neuropsicopedagoga