Familiares de Lourdes Moreira Costa Miranda, assassinada no último domingo (17), ainda estão perplexos com o ocorrido. Para tentar seguir em frente, buscam conforto na Força Divina e acreditam que a justiça será feita
CARATINGA – Tinha tudo para ser um domingo perfeito. Almoço com os familiares, assistir uma apresentação circense e depois comer uma pizza para fechar o dia com chave de ouro. Mas o imponderável aconteceu. Depois de horas felizes, cheias de sorrisos e abraços; vieram os momentos de pavor. Lourdes Moreira Costa Miranda, 39 anos, foi morta na noite do último domingo (17) na frente do marido, dos filhos e dos netos. O crime aconteceu Córrego São Roque, às margens da BR-116, zona rural de Caratinga, e teve repercussão nacional.
Conforme apurado pela Polícia Civil, Lourdes e seus familiares foram abordados por Leonardo Tavares Silveira, 26 anos, Carlos Roberto Tavares Filho, 19, José do Carmo Tavares Filho, 49 e um menor 16. Eles estavam no Corsa Classic, placa HLW-2680, e chegaram perguntando onde seria a ‘casa da tia Lúcia’, referindo a um prostíbulo. Quando foram informados que naquele local não funcionava este tipo de estabelecimento, Leonardo usou um canivete e desferiu um golpe que acertou o peito de Lourdes. A mulher teve morte imediata. Em seguida, houve uma briga generalizada, gerando mais feridos.
Leonardo está detido no presídio de Caratinga acusado de ter matado Lourdes. Carlos Roberto e o menor foram ouvidos e liberados, José do Carmo continua foragido.
UMA FAMÍLIA DESTROÇADA PELA DOR
O sol que iluminou Caratinga no dia de ontem contrastava com o ar gélido e o tom sombrio de uma residência situada no Bairro Santa Zita. Nesta casa mora a família Miranda, uma família destroçada pela dor. E foi neste clima de pesar que o viúvo José Miranda Júnior, 44, e as filhas Elen Mara Miranda Costa, 22, Bianca Miranda Lopes, 18, receberam a reportagem do DIÁRIO. A união de José e Lourdes gerou ainda mais um filho, 11 anos.
Depois do domingo fatídico, eles tem se encontrado todos os dias. Juntos tentam aplacar o sofrimento. José Miranda recebe a reportagem e é o primeiro a falar. O casamento com Lourdes já durava 23 anos, fora os quatro anos de namoro. Os olhos do viúvo brilham ao falar da mulher. Este brilho revela o amor que ele sente por Lourdes, mas mostra toda a tristeza de não tê-la por perto. Com a voz embargada, José Miranda tem adjetivos direcionados para a mulher que partiu. “Lourdes era companheira, prestativa. Lembro-me dela desde que era novinha, convivia na casa de seus, que depois se tornaram meus sogros. Eu costumava brincar que quando ela crescesse, iria levá-la para minha casa. Depois namoramos e nos casamos. Tivemos três filhos maravilhosos”, conta Miranda de forma contemplativa.
As lembranças do dia 17 de maio vêm à sua mente. Miranda observa que o domingo estava sendo maravilhoso. Eles almoçaram na casa da sogra, foram ao circo com os filhos e com os netos, e depois comeram pizza. Então José Miranda passa a falar sobre o fato que ele, junto dos filhos, procura explicação. “A tragédia aconteceu quando fui levar minha filha (Bianca) até sua casa. Vínhamos de um passeio quando chegaram àquelas pessoas. Fica até difícil de classificá-las como ‘pessoas’. Vem um rapaz (Leonardo) e mata minha mulher. Matou sem motivo, sem explicação”.
José Miranda prossegue seus comentários e é categórico ao dizer que Leonardo teve a intenção de matar Lourdes. “Veio para matar, senão ele teria dado um muro, mas foi um covarde, matou uma mulher na frente dos filhos e dos netos”.
Ele estende seus comentários sobre o fato. “Aos colocarmos Lourdes dentro do meu veículo, José do Carmo Tavares entrou no carro e impediu que prestássemos socorro. Ele disse que estava procurando um celular. José do Carmo estava desorientado. Ele estava foragido, não sei se já se apresentou à Polícia Civil”, discorre José Miranda.
As filhas já são casadas, então o pai tem a missão de trabalhar e ficar mais perto do seu filho. Mas está difícil para conciliar as funções, já que Lourdes era quem ficava mais próxima do menino, que agora está prestes a entrar na adolescência sem o amparo da mãe. “Minha vida mudou radicalmente, não é fácil. Sou motorista de ônibus, trabalho viajando, meu filho não pode ficar sozinho. Ele tem que se alimentar; ir à escola. Agradeço a empresa onde trabalho por ter me dado licença. Estou conversando com o menino e digo que mãe dele partiu, mas que está bem. Agora somos só nós dois em casa; um tem que ajudar o outro. Espero que ninguém nunca passe por isso que estamos passando. Tenho procurado todos os dias Força Divina para suportar essa dor”, revela José Miranda, desta vez com os olhos marejados.
Mesmo ainda estarrecido, José Miranda mostra confiança. “Acredito na Polícia Civil que está investigando no caso, acredito no promotor de justiça e no juiz de direito. A justiça será feita. Aquele rapaz matou covardemente uma mãe. Foi uma canivetada certeira. O responsável ou os responsáveis tem que pagar. A justiça sendo feita irá amenizar a nossa dor. Esse covarde não pode ficar impune”, brada José Miranda.
“A VIDA PERDEU O SENTIDO”
Sentadas no sofá da sala e quase inertes, Bianca e Elen, juntas do irmão, personificam o lamento. Os três filhos são diretos ao dizer, quase uníssonos, que “a vida perdeu o sentido”.
Bianca toma os dois filhos no colo e recorda os últimos momentos vividos ao lado da mãe. Ela busca conforto a todo o instante e esse conforto vem dos ótimos momentos passados com Lourdes. “Naquele domingo, minha mãe estava muito feliz. Pegou minha menina no colo. Fomos à pizzaria. Então o conforto vem em lembrar-se de seu sorriso. Ela até brincou que quando ficasse velhinha queria que meu irmão a levasse ao circo. Mas este desejo ela não pode realizar”, recorda com a voz estremecida. “É muito duro lembrar que estávamos tão alegres e unidos, e horas depois acontece aquilo. É algo inexplicável”, pondera a filha.
Sobre o crime, ela conta que quando os ocupantes desceram do carro, era nítido o cheiro de cerveja. “Eles estavam super alterados. Tive a informação de que até os médicos notaram isso. Pode ser até uso de drogas. Acredito que aquilo foi coisa do ‘trem-ruim’, já que normais eles não estavam”, avalia Bianca.
Sobre os últimos sete dias, Bianca disse que a rotina da família Miranda tem se resumido em ‘dormir e acordar’. “Não estamos vivendo, estamos sem rumo. Minha mãe era o centro de tudo. Era a melhor mãe do mundo, esposa maravilhosa e nunca vi uma avó assim. Foi a nossa pior semana. É muito triste saber que quando voltar para casa ela não estará mais me esperando. Ela era a base de nossa família”.
Elen, que segura a sua filha, descreve Lourdes. “Não era só uma mãe, era minha amiga e cuidava da minha filha como se fosse a filha dela. Não tinha inimigos e andava sempre sorrindo, sempre de cabeça em pé, independente das coisas que aconteciam. Era fácil de fazer amizades. Muito prestativa e cuidava de todos nós”.
A filha conta que ao retornar a casa onde vivia sua mãe, sentiu um arrepio pelo corpo. “É estranho não ver minha mãe na casa dela. Dá uma agonia no peito, uma dor no coração. Ela tinha 39 anos, uma vida inteira pela frente. Não tinha problemas de saúde. Imaginávamos que a teríamos por muitos anos. Como disse a Bianca, ela brincou com meu irmão ao ver uma velhinha no circo. Queria chegar àquela idade e queria que ele a levasse ao circo”.
Elen revela que queria esquecer o que houve, mas além das recordações, ela ainda traz marcas pelo corpo. “Foi um filme de terror. Foi tudo muito rápido, sem motivos. Ele (Leonardo) não deu chance para minha mãe sobreviver. O golpe foi direto no peito. Depois de muitas lutas corporais, ele me mordeu, me deu uma canivetada num dos dedos e na perna de meu marido. Peguei minha mãe no colo para levá-la para o pronto atendimento. José do Carmo entrou no carro e impediu o socorro. Pedi a Deus para salvar a minha mãe, mas ela já tinha morrido. Sempre fiz tudo por ela. Vê-la partir dessa forma me dá uma angústia muito grande”, disse Elen, encerrando aos prantos a entrevista.