* Kelly Aparecida do Nascimento
Nas duas últimas décadas, o discurso da existência da crise socioambiental ganhou visibilidade principalmente nos meios de comunicação. Porém, até então parecia apenas discurso. A nossa região ainda não havia sofrido “na pele” as consequências disso. Falta de água era coisa de nordeste.
Pois bem, agora falta de água passa a ser uma realidade nossa, situação causada pelo prolongado período de estiagem da bacia hidrográfica, somado ao aumento do consumo de água, proveniente do forte calor, tem comprometido o abastecimento na cidade de Caratinga e de outras cidades vizinhas.
Mesmo a crise nos atingindo diretamente, registra-se que as discussões atuais sobre educação ambiental ainda estão reduzidas às florestas. Esta é uma concepção que, na maioria das vezes, é veiculada cotidianamente pelas instituições de formação que interpretam o meio ambiente como meio exclusivamente natural e não como espaço humanizado. Parecem não oferecer estímulos para que o educando perceba que meio ambiente não é só a natureza, mas as relações que ele estabelece em qualquer espaço. Ao contrário disso, a educação ambiental se apresenta como um processo que coloca em evidência os aspectos políticos, sociais, econômicos e culturais, utilizando-se inclusive da ecologia.
Observações na realização de projetos de caráter socioambiental desenvolvidos pela maioria das escolas apontam que eles ainda não apresentam efetividade. As crianças e adolescentes se organizam em estandes bonitos, bem decorados, no entanto sequer conhecem a causa que, teoricamente, defendem. Os alunos tornaram-se robozinhos e cada um se responsabiliza por falar “a sua parte”. Em seus discursos predomina falas do tipo: o Homem está poluindo as águas, a enchente e a chuva matam as pessoas e causam a erosão. Afinal, quem é esse Homem que está poluindo as águas? Em que Planeta ele vive? Onde é sua casa? É a água, fonte de vida, que corre nos solos descobertos de vegetação que mata o Homem? Se o solo está desmatado é a água que provoca a erosão? Quem desmatou? Verdadeiramente, quem está se matando?
Nossa alienação é tamanha que não conseguimos olhar para nós mesmos, tanto do lugar de pais, como de professores ou de cidadãos, a fim de que, como espécie humana, sintamo-nos responsáveis pelo problema e, principalmente, por alternativas que possam resolver ou pelo menos amenizar a situação. É fato que o Homem não pode ser enxergado apenas como vilão, isso representaria a dicotomia da relação Homem-natureza. Ao contrário disso, a intenção é a de que Homem e natureza se constituam em unidade indissolúvel, tal como postula o princípio de Gaia.
Em geral, os projetos desenvolvidos nessa área têm se apresentado tão vazios que não conseguem tocar a nós mesmos, imaginem então como poderão sensibilizar crianças e adolescentes. Nós educadores estamos contribuindo para o simulacro da educação ambiental. Nesse caso, acredito que simplesmente plantar árvore com as crianças no dia da árvore e estimular que elas distribuam copinhos d’água nas ruas no dia da água não provoca transformações. Não estou dizendo que não seja importante, mas enquanto ações pontuais só servem para sair das quatro paredes da escola, já que planta-se a árvore e esquece o plástico no solo, bebe-se a água e joga o copinho na rua. Falta a essência, a introjeção do processo de conscientização.
Além disso, ensinamos aos alunos que a coleta seletiva de resíduos é importante e fazemos isso na escola, mas sabemos que o caminhão vai passar e misturar tudo novamente. Estamos enganando a quem? Assim, o discurso está indo ao encontro da prática ou a educação ambiental tornou-se simplesmente uma retórica em voga? Essas ações pontuais, sozinhas, não vão fazer as pessoas entenderem que no mundo está acontecendo a crise socioambiental que está comprometendo a qualidade de vida de todo o Planeta e, portanto, nossa também.
Nunca se falou tanto em desastres ambientais como atualmente. Eles estão causando instabilidades social e econômica no mundo e agora estão chegando em nossas casas. Por isso mesmo que as ações devem começar das nossas casas e se estender para o mundo. O caminho é iniciar em nossas residências para nossas ruas, nossos bairros, nossa cidade e assim por diante, de forma cooperativa a partir de pequenas ações coletivas de organização dos grupamentos.
Assim, convido-os a repensar nossas práticas docentes e de cidadãos, pois não tenho dúvidas de que nós professores somos os principais agentes a fim de efetivar essa causa. Diante do mau uso e maus hábitos desenvolvidos por aquelas pessoas que viveram em períodos de fartura de água e dos demais recursos naturais, investir na educação de crianças e adolescentes, que começam suas experiências em um período de restrições, parece a melhor alternativa. No entanto, precisamos lembrar que os professores também precisam de qualificação e de formação adequada.
É importante enfatizar que, pela especificidade, considero que somos os principais agentes, mas não se pode negar a responsabilidade coletiva, isto é, de outros grupos sociais nessa causa.
Somos filhos de uma mesma Terra, que está reclamando as nossas ações a fim de poupá-la de tanta devastação. E acredito sim, colegas professores, que somos fundamentais na multiplicação de um discurso e prática em favor da conservação, preservação e qualidade de vida nossa e do nosso Planeta Terra.
Profª M.Sc. Kelly Aparecida do Nascimento
Bacharel e Licenciada em Educação Física. Licenciada em Pedagogia. Mestre em Meio Ambiente e Sustentabilidade.
Professora do Centro Universitário de Caratinga –UNEC.
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