Em comemoração ao Dia do Sapateiro, celebrado na segunda-feira (25), o DIÁRIO entrevistou Belarmino Vidal de Souza, uma das referências desse ofício na região
BOM JESUS DO GALHO – Nesta segunda-feira (25) é comemorado o Dia do Sapateiro. Essa profissão, uma das mais antigas, surgiu a partir do momento em que o homem passou a sentir necessidade de proteger seus pés, seja do frio, seja de perigos externos. Para comemorar essa data, o DIÁRIO entrevistou Belarmino Vidal de Souza, que completará 92 anos no próximo dia 30. Ele é uma referência regional desse ofício e, mais que sapateiro, o senhor Belarmino é um artesão.
Natural de Vermelho Novo em 30 de outubro de 1929, ainda na adolescência, Belarmino se mudou para Bom Jesus do Galho, onde casou-se com Marlene de Souza Vidal. Dessa união nasceram nove filhos, que lhe deram 19 netos e cinco bisnetos. Senhor Belarmino se tornou uma das pessoas mais respeitadas em Bom Jesus do Galho. Ele foi um dos primeiros membros da Assembleia de Deus do município e sua retidão é elogiada por todos que o conhecem, isso sem falar da sua competência profissional, de suas habilidades própria dos artesãos. Diferentemente do que muitos pensam, que sapateiro é alguém que conserta calçados, o senhor Belarmino fabrica calçados e já foi especialista em botinas e sapatos.
INÍCIO
Sua oficina sempre se destacou pelas paredes revestidas de páginas de jornais trazendo as notícias que ele julgava mais relevantes. Quanto ao começo da carreira como sapateiro, não aconteceu na infância, como a maioria das pessoas pensa; senhor Belarmino abraçou o ofício já na vida adulta, em 1954. “Comecei aos 24 anos. Trabalhava de servente de pedreiro. O que aparecia eu fazia. Tinha um amigo e ele perguntou se eu queria trabalhar de sapateiro. Aí aceitei a proposta e fiquei até hoje”, recorda.
À época, nos anos 50, não existiam em Bom Jesus do Galho lojas especializadas em calçados. Eram outros tempos. E quem quisesse um calçado único recorria ao senhor Belarmino. “Era muita procura. Fui funcionário durante cinco ou seis anos desse meu amigo, depois montei minha própria sapataria. Nesse tempo, pude contar com uma importante ajuda. Abri a oficina e era muito serviço. Algumas coisas eu fabricava, como botina, sapato. Como virei sapateiro mesmo, meu ex-patrão me chamou de novo. O que aparecia eu fazia e vendia no comércio, tipo botinas e sapatos. Era muito serviço”, conta.
DE PAI PARA FILHO
Senhor Belarmino anuncia que está deixando o ofício, mas um de seus filhos, o Salatiel, que é mais conhecido por ‘Natal’ em virtude de sua data de nascimento, será seu sucessor. “Como ele é trabalhador e tem muita coragem, trabalha na Frical e, em sua folga, trabalha comigo, ele deve seguir os meus passos”, fala senhor Belarmino, apontando outro motivo para deixar o ofício: “Hoje, é pouco serviço. O coronavírus quase acabou com a profissão que já estava ruim”, sublinha.
PASSATEMPO
O bate-papo com o senhor Belarmino se estendeu. Ele foi narrando toda a sua trajetória de vida, sobre seus filhos e a profissão de cada um. A fala mansa do artesão transcorre suavemente. Ele está há tanto tempo nesse ramo, que a profissão ganhou outra conotação. “Hoje é quase que um passatempo. O serviço é mesmo muito pouco, faço algumas coisinhas”.
MENSAGEM
Ao final da conversa, senhor Belarmino recorre ao versículo 10 do Salmo 90 para falar sobre suas muitas primaveras. “A idade chegou. A gente vive até os 70 anos. Dos 70 aos 80 é uma virtude e dos 80 pra cima é cansaço e enfado. Mas, como passei dos 80 (risos)…”.
Hoje o tempo parece fugaz, não passa tão lentamente como nos anos 50, década em que senhor Belarmino começou em seu ofício. A arte do sapateiro remota a uma época que a modernidade tratou de esvair. As lojas especializadas em calçados estão em toda parte, fomentam a economia, geram empregos, ditam a moda, mas está tudo na vitrine, que não conta com um calçado exclusivo como os feitos por senhor Belarmino. Ele observa que tudo muda, mas os seus amigos são unânimes ao dizer que só não mudam os valores perpetrados pelo senhor Belarmino, no aspecto pessoal e profissional, de verdadeiro artesão.
BOX
Sobre a escolha de 25 de outubro para comemorar o Dia do Sapateiro, a versão mais considerada tem sua origem associada com o ano 280, na França. Os irmãos franceses, Crispim e Cipriano, considerados santos pela Igreja Católica, e que eram pregadores do cristianismo, dedicavam suas noite à confecção de calçados para sobreviver. O imperador da época perseguiu os dois que acabaram sendo degolados por terem convertido muitas pessoas ao cristianismo.