A garantia de moradia ao cônjuge abandonado
A usucapião é o instituto jurídico pelo qual se adquire a propriedade através da posse prolongada do bem e o cumprimento de determinados requisitos.
A usucapião familiar foi inserida no nosso Código Civil através da lei 12.424/2011, que regulamenta o programa Minha Casa, Minha Vida. Através dessa inclusão, criou-se a possibilidade de um cônjuge usucapir do outro e pleitear o domínio integral do bem imóvel que compartilhavam. Essa inclusão é verificada no Art. 1240- A do Código Civil:
Art. 1240-A: Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.
Essa possibilidade foi inserida em atenção aos problemas sociais, já que o cônjuge que permanece no lar abandonado sofre com a instabilidade financeira e a insegurança social. Assim, o legislador pretende proteger essas pessoas, regularizando a posse do bem imóvel, ocupado exclusivamente por um dos cônjuges, em face do abandono do lar, integralizando o domínio. Esse foi o objetivo da função social da usucapião familiar.
Em se tratando dos requisitos da usucapião familiar é necessário que haja o abandono do lar, posse direta ininterruptamente com exclusividade e sem oposição, pelo período de 2 anos, utilização do imóvel para moradia do cônjuge abandonado ou da família, ser imóvel urbano, inexistência de outra propriedade urbana ou rural, metragem total do imóvel com a área de até 250m².
Quando se fala em abandono do lar, a mesma deverá ser de forma espontânea, ou seja, configuração da separação de fato ou separação de corpos. Isto se faz necessário para que haja a proteção da integridade e até mesmo o respeito dos cônjuges. Para tanto serão admitidos todos os meios de prova permitidos pela lei. Neste novo mecanismo de usucapião é essencial à presença da separação de corpos, já que, para iniciar o prazo prescricional entre ex-cônjuge deve haver o rompimento do vínculo, na medida em que, do art. 197, I, do Código Civil, não corre prescrição entre cônjuges na constância da sociedade conjugal.
Além do abandono, é necessário que esteja configurada a separação de fato. É imprescindível verificar que a usucapião familiar deve recair sobre bem comum do casal, assim, o imóvel pode ser fruto dos regimes de comunhão total ou parcial. Não cabe a usucapião aos bens públicos, tampouco, a terrenos urbanos sem construção posto que um dos requisitos estabeleça a moradia do possuidor.
Para a Professora Maria Helena Diniz, o fundamento deste artigo, é a garantia de segurança e estabilidade da propriedade. De fato, o intento deste artigo introduzido é preservar e proteger um teto de moradia para o cônjuge ou convivente que se separa e permanece no imóvel.
É fundamental acentuar que, em conformidade com o art. 1240-A, § 1º, CC/02, aquele que usucapir uma vez, não poderá o fazer novamente, pois se assim o pudesse, desvirtuaria o que propõe o instituto, descaracterizando sua principal finalidade que é beneficiar quem não detém de um imóvel para nele constituir sua moradia.
Outro ponto importante é quanto ao abandono material. Obviamente, como o intuito da lei é a proteção ao cônjuge abandonado, não se aplica aos casos em que um cônjuge se separa, porém mantém amparo financeiro e convivência com o ex-cônjuge ou companheiro. O que torna o uso da propriedade em comum, por parte de um, apenas ato de permissividade e não de abandono.
Em que se pese essa garantia há muitos desafios para a adoção dessa modalidade, porque se trata de uma modalidade mais criteriosa do que as outras modalidades e em nenhuma hipótese permite a procedência da ação sem preencher algum requisito. É notório que o art. 1240-A do CC/02 apresenta certas falhas e omissões que refletem em sua execução, mas que, ainda assim, não despersonalizam o principal foco do dispositivo: garantir o direito à moradia em concordância com os preceitos constitucionais sociais, além de, precipuamente, refletir o princípio da função social, importante na legitimação dos atos civis.
Em outras linhas, a usucapião familiar foi criada no intuito de beneficiar as pessoas mais carentes de direitos sociais, cônjuges ou família que não tem outro lugar para morar. Por isso, o prazo prescritivo é o mais curto em comparação com as outras modalidades de usucapião, pois, tem que se levar em consideração a urgência de um direito social.
Por fim, vários embates a respeito da modalidade de usucapião familiar. Diante do exposto observa-se que a usucapião familiar é um novo instituto criado para ratificar a previsão Constitucional, a saber, a uma moradia digna e adequada.
Aldair Oliveira – Advogado
Pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil