Mons. Raul Motta de Oliveira
Já mostramos como a Catedral São João Batista, juntamente com seu Adro, situados na Praça Cesário Alvim mas não se confundindo com ela, pertencem à Diocese de Caratinga, por serem um pequeno resto dos 80 alqueires de terra doados a São João Batista pelos nossos fundadores, João Caetano do Nascimento e companheiros, dia 23 de junho de 1848, vésperas de São João (Cf. “O Diário de Caratinga”, de 7-3-2018).
Igualmente, pela História da Igreja e do Império do Brasil, vimos o que é propriamente um adro e que ele faz parte integrante do Templo católico, tendo sido até, como era todo Templo, lugar de refúgio de pessoas perseguidas pela Justiça (Cf. “O Diário de Caratinga”, de 27/06/2018) e, portanto, não é Praça Cesário Alvim.
Hoje queria encerrar mostrando, pela Bíblia Sagrada, que o adro do Templo de Jerusalém era um local sagrado, considerado como sendo o próprio Templo, Casa de Deus. Assim, o adro da Catedral é sagrado, pois faz parte da Casa de Deus e não da Praça Cesário Alvim.
Já mostramos o significado da palavra adro. Queremos apenas esclarecer que a palavra latina atrium, evoluindo para o Português erudito, tornou-se “átrio”; e, para o Português popular, “adro”. Mas são a mesma palavra, significam a mesma coisa: átrio e adro são sinônimos. Como já vimos, adro é um “Pátio externo descoberto e por vezes murado, localizado em frente ou em torno a uma igreja” (Houaiss).
O Templo de Jerusalém e seus adros
O Templo de Jerusalém, construído pelo rei Salomão (1005 a.C.), uma das sete maravilhas do mundo antigo, foi destruído por Nabucodonosor, rei da Babilônia (587 a.C.). O segundo Templo, depois do exílio da Babilônia, foi reconstruído por Zorobabel, na reforma de Esdras (516 a.C.). E o terceiro, construído pelo rei Herodes Magno (18 a.C.), foi o Templo do tempo de Jesus Cristo, destruído pelos romanos (70 d.C.). Os discípulos elogiavam a beleza daquele Templo: “Mestre, olha que pedras, que construções!” (Mc 13, 1).
Como podemos ver, pelo desenho aqui publicado, o templo de Jerusalém, no tempo de Jesus Cristo, era composto da parte central, que continha, o Santo e o Santo dos Santos, os locais mais sagrados; também o adro dos Sacerdotes, o adro dos homens israelitas e o adro das mulheres israelitas. Rodeando esta parte mais sagrada do Templo, havia o adro dos Gentios, onde podia entrar qualquer pessoa estrangeira, como também os mercadores e cambistas. Os Pórticos eram galerias abertas e cobertas, sustentadas por colunas, que rodeavam todo o Adro dos Gentios e marcavam a área de todo o Templo (Vejam o desenho).
Jesus expulsa os vendilhões do Templo
Esta passagem evangélica é tão importante que está descrita por todos os quatro evangelistas: Mateus 21, 12-13; Marcos 11, 15-17; Lucas 19, 45-46; e João 2, 13-16. Vejamos, segundo São Marcos:
No dia seguinte à Entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, “Jesus entrou no templo e começou a expulsar os que ali estavam, vendendo e comprando. Derrubou as mesas dos que trocavam moedas e as bancas dos vendedores de pombas”. Pôs-se a ensinar e dizia-lhes: “Não está escrito que a minha casa será chamada casa de oração para todos os povos? Vós, porém, fizestes dela um covil de ladrões” (Cf. Mc 11, 15.17). E São João nos conta assim: “Jesus fez um chicote com cordas e a todos expulsou do templo, juntamente com os bois e as ovelhas; jogou no chão o dinheiro dos cambistas e derrubou suas bancas; e aos vendedores de pombas disse: ‘Tirai daqui essas coisas. Não façais da casa de meu Pai um mercado’” (Jo 2, 13-16).
Os exegetas, mestres de Sagrada Escritura (Vg. Isidoro Mazzarolo, Pirot, Lusseau-Collomb, Strack-Billerbeck, etc.) colocam essa passagem bíblica como acontecida no Adro ou Átrio dos Gentios (em grego: en tô ierô), no lugar sagrado, mas fora do Templo propriamente dito (naós), onde ficavam o Santo e o Santo dos Santos. Jesus não expulsou os vendilhões de dentro do Templo, mas do Adro do Templo de Jerusalém, chamado Adro dos Gentios.
Em Marcos 11, 16, vemos que Jesus “também não permitia que se carregassem objetos passando pelo Templo”, ou seja pelo Adro dos Gentios, como costumavam fazer, para encurtar o caminho.
O Adro dos Gentios, com sua esplanada, cujo fim era isolar a casa de Deus dos barulhos exteriores, tinha se transformado em uma grande feira, barulhenta, com os gritos dos vendedores. Vendiam ali animais para o sacrifício (bois, ovelhas). E trocavam moedas para serem oferecidas no Templo. Esse comércio era necessário, para maior comodidade dos fiéis e peregrinos, mas deveria ser realizado em alguma praça pública, próxima ao Templo, e não no interior do recinto sagrado. E, pior ainda, explorando os compradores, muitos deles pobres. R. Simeon ben Gamaliel lamentava que se vendia ali uma pomba por uma moeda de ouro, quando era suficiente uma de prata.
Jesus se revolta contra aquela exploração do povo, principalmente dos mais pobres, e contra a profanação do Templo do Senhor, fazendo duas citações bíblicas: “A minha casa será chamada casa de oração para todos os povos” (Isaías 56, 7); e “Acaso esta casa consagrada ao meu nome tornou-se, a vosso ver, um esconderijo de ladrões?” (Jeremias 7, 11).
O adro da nossa Catedral São João Batista
A Matriz de São João Batista de Caratinga, de duas torres, cuja construção se arrastou por longos 24 anos (1880-2004), no Largo da Barreira, tornando-se Catedral ao ser criada a Diocese de Caratinga (15-12-1915), teve seu adro respeitado por todos. Mesmo depois da construção da nova Catedral pelo Monsenhor Aristides Rocha (1930-1935), manteve-se seu adro durante muitos anos.
Como o adro do Templo de Jerusalém, que era também usado para encurtar o caminho das pessoas, muitas vezes carregando objetos pesados, o adro da Catedral de Caratinga foi utilizado, por alguns anos, como passagem de carros e até caminhões, para encurtar o caminho. Era um abuso que foi debelado, graças a Deus, em 1991, com o fechamento daquele trânsito ali e a reestruturação do adro pela Paróquia, indo desde as escadarias da Catedral até o busto do Monsenhor Rocha. Este é o adro sagrado da Catedral. Ali não é Praça Cesário Alvim!
Concluindo e pedindo de novo
Reitero o meu pedido às Autoridades de Caratinga, ao Meritíssimo Juiz de Direito, Dr. José Antônio de Oliveira Cordeiro; ao DD. Prefeito Municipal, Dr. Welington Moreira de Oliveira; aos Ilustres Vereadores; e também ao Sr. Lysias Leitão, Presidente do Conselho Municipal de Patrimônio Histórico e Cultural de Caratinga: devolvam à Igreja Católica o adro da nossa Catedral de São João Batista! Não venha Jesus, de chicote na mão, obrigá-los a fazer isso!!!