Após audiência pública realizada na noite de sexta-feira (10), prefeito Edinilson Lopes decidiu acionar empresa na Justiça. Copasa afirma que tem autorização para iniciar a obra
PIEDADE DE CARATINGA– Desde que a Copasa anunciou uma obra de captação complementar no Córrego do Rio Preto para garantir o abastecimento de Caratinga, a população de Piedade de Caratinga se mostrou contra. E esta opinião foi reforçada durante audiência pública realizada na cidade vizinha na noite de sexta-feira (10). A reunião terminou sem consenso e o prefeito Edinilson Lopes (PMDB) decidiu acionar a empresa na Justiça, na tentativa de impedir o projeto.
“Fui o mediador entre a Copasa e a população como prefeito e cidadão. Ouvimos a empresa, que apresentou suas justificativas tecnicamente, algumas pessoas foram convidadas e pediram a palavra, alguns munícipes, representantes de agricultores e pedimos à população para que se manifestasse de forma voluntária, demos um cartão vermelho e um cartão verde e o que predominou foi que a população de Piedade de Caratinga é categoricamente contra essa transposição. Entraremos na Justiça com todos os trâmites legais e essa vitória pode ser do povo ou da Copasa. O prefeito tem o poder limitado, mas vamos fazer nosso papel como gestor defendendo o direito da população, porque fui eleito por ela, então devolvo esse poder também para ela”, garantiu Edinilson.
‘SOMENTE A VAZÃO NECESSÁRIA’
Representando a Copasa, o superintendente da Regional do Vale do Aço e do Rio Doce, Albino Júnior Batista Campos, inicialmente esclareceu que trata-se de uma obra a ser realizada entre 10 e 11 meses, operada “somente e estritamente em casos de escassez hídrica”, por falta de água no manancial Ribeirão do Lage, o que geralmente implica em rodízio na cidade de Caratinga. “Em razão disso, nós iremos acionar as bombas para poder complementar somente a vazão necessária para que não haja nenhum prejuízo ao abastecimento com água tratada à população de Caratinga. Ou seja, é uma obra que será utilizada ou operada num período muito curto durante os anos e torcemos para que não seja sequer operada, será utilizada uma vazão necessária para complementação da vazão captada no rio do Lage”.
Albino ainda ressaltou que a empresa possui toda documentação necessária para realização da obra, orçada em R$ 5,153 milhões, recurso assegurado pela Copasa. “A audiência pública foi solicitada pelo prefeito municipal, a Copasa veio aqui cumprindo o seu papel de esclarecer, informar para toda a população as ações que estará realizando após a emissão de todas as licenças ambientais e autorização dos órgãos que têm competência para jurisdição na BR-474. Compreendemos o receio da população, mas a Copasa não está retirando a vazão sem um documento oficial da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, ou seja, a Semade, através do Igam que é o Instituto de Gestão das Águas, órgão que realiza a gestão dos recursos hídricos do estado concedeu à empresa uma outorga, um direito para exploração ou retirada de até 100 litros por segundo no Rio Preto”.
Além desta medida, o superintendente destacou que outras ações também estão sendo implantadas, com programas educativos e estudos técnicos. “Como o Pró Mananciais, programa vinculado ao Cultivando Água Boa, para a própria Bacia do Rio Preto, além de estudos que precisamos fazer para verificar a viabilidade socioambiental, econômica/financeira e técnica para a possibilidade de construção de um reservatório, que seja de regularização ou de acumulação, mas que são obras que em razão da sua complexidade demandam um tempo bastante elevado de estudos ambientais”.
Em relação a preocupação dos moradores com o comprometimento do abastecimento, a diretoria da Copasa já teria protocolado documento junto ao município de Piedade de Caratinga, se comprometendo em realizar imediatamente estudo para definição de medida que assegure, a longo prazo, o abastecimento de Caratinga, sem nenhum prejuízo a cidade de Piedade. “Tanto é que esse também é um dos compromissos firmados pela empresa formalmente junto ao prefeito Edinilson Lopes. A população urbana de Piedade de Caratinga, a qual é atendida pela companhia, em momento algum sofrerá algum impacto relativo à crise hídrica em detrimento dessa obra que será realizada para atender a população de Caratinga. É importante ressaltar também que a própria licença ambiental define que em caso de escassez hídrica haverá necessidade de uma vazão residual para que possa atender aos outros usos da bacia, seja de agricultura, ou outro uso diverso ao abastecimento humano à jusante do ponto de captação que está sendo implantado pela companhia”.
O superintendente enfatizou que a obra está autorizada pelos órgãos ambientais e sobre este posicionamento do prefeito, a empresa está tranquila em relação à legalidade e viabilidade da captação. “A avenida principal é uma BR, cuja jurisdição ou responsabilidade pela sua utilização das faixas de servidão competem ao Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes), mas de toda maneira a gente continuará com a mobilização da equipe que já foi contratada, caminhando para o início das obras. Caso o município ingresse com alguma ação na Justiça, a Copasa irá buscar a sua defesa com nosso corpo jurídico, assim estaremos continuando, sem querer entrar em nenhum confronto”.
Encerrando sua fala, Albino acrescentou que é necessário buscar uma solução para ambos os municípios, sem que haja disputa entre eles. “Foi falado muito aqui e acho bom ressaltar, que não devemos criar um ambiente de Piedade de Caratinga contra a Copasa ou contra a população de Caratinga. Isso é um ambiente muito ruim, são cidades coirmãs, Piedade foi um distrito da cidade sede Caratinga, são pessoas ordeiras, a gente precisa buscar harmonia, o diálogo, para que possamos construir políticas públicas, mas também buscando atender a todas as partes”.
PREOCUPAÇÕES
Ao longo da audiência, muitas pessoas demonstraram preocupação sobre os impactos da obra e apresentaram seus argumentos. Harley Coelho, que é biólogo e professor, se manifestou sobre algumas questões ambientais que acredita devem ser observadas atentamente no planejamento desta obra. “Temos que ter um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e seu respectivo Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) para saber o que está realmente acontecendo ali e se a biota toda não vai ser afetada. Ou seja, toda a parte de fauna e flora, porque afinal não podemos pensar apenas num contexto externo e esquecer do outro também, que temos microrganismos que vivem na água, peixes, anfíbios, repteis e outros animais que dependem da água, afinal se tiver uma vazão e tirarem aquilo ali como ficarão esses animais? E as plantas que sobrevivem ali. Precisamos também fazer um reflorestamento de matas ciliares ao redor e recuperar as nascentes, que é muito importante, esse trabalho de educação ambiental de prática é muito necessário. E a médio prazo fazendo isso aqui como vai ficar? Será que a vazão vai diminuir o assoreamento, ficaremos sem água como, por exemplo, Engenheiro Caldas?”.
João Paulo de Paiva, diretor de Agricultura de Piedade de Caratinga, se baseia no Plano Municipal de Saneamento Básico, elaborado pelo Centro Universitário de Caratinga, para se mostrar contra a realização da captação complementar. “O documento fala que qualquer nova captação para atendimento a Caratinga é obrigatório que a Copasa apresente estudos da bacia e principalmente busque nova captação para Piedade. E até o presente momento este estudo não chegou até a gente. Estamos totalmente perdidos porque se você tem de um lado material elaborado por uma equipe técnica falando que não tem água suficiente para atender duas cidades, de outro lado você tem a Copasa que está evidente que não cumpre muito bem com o que fala. Infelizmente, culminou na situação que Piedade não está concordando da forma como a Copasa quer captar”.
Alexandre, tesoureiro da Associação dos Produtores Rurais do Córrego do Rio Preto, explicou porque os agricultores também são contra. “Hoje nossa base de agricultura é o que sustenta nossas famílias, então usamos muito a irrigação, mas não como desperdício, mas para tirar nosso sustento. Nossa preocupação é que a gente viu a Copasa fazer muito pouco ou quase nada a respeito de proteger as nascentes e conservar. Nessa última década houve um índice de muito plantio de eucalipto, isso fez com que muitas nascentes secarem. Se a Copasa instalar essa estrutura para captar para Caratinga vamos ter um problema sério no nosso sustento. Devemos pensar nas futuras gerações, será que teremos com produzir? Quero deixar bem claro que não somos contra Caratinga. A gente sabe a dificuldade que é ficar sem água, mas somos extremamente contra à forma que a Copasa quer fazer esse investimento. Eles não estão preocupando com o futuro de nossa cidade e de nossas famílias, mas com as necessidades de Caratinga, porque estão sendo cobrados por isso”.