CARATINGA- Na cabeceira do Córrego da Conceição, que pertence ao distrito de Patrocínio, uma família tem se destacado na produção de cafés especiais. O casal Sandra Regina de Souza Batista, 42 anos e José de Lourdes Batista, 46 anos, o “Tatão”, junto dos filhos Isaque Samuel de Souza Batista, 14 anos e Bruno D’Lucas, 21 anos trabalham de forma manual, produzindo café de qualidade.
A reportagem esteve no local, acompanhada de representantes do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar). Na chegada a acolhida de uma família sorridente. Uma mesa preparada para os visitantes e é claro, não podia faltar o café. Samuel Gonçalves, mobilizador do Senar, brincou: “Nada de açúcar. Se pedir açúcar, a Sandra briga”. Afinal, um café de qualidade deve ser apreciado em sua forma natural. E assim é o café produzido pela família.
Sandra Regina afirma que o café sempre esteve presente em sua vida, motivada pelos pais. “Então, desde os sete anos de idade já estou no meio da lavoura. Cresci, me casei, meu esposo também mexendo com café. É a nossa fonte de renda. A gente era meeiro, empregados, trabalhamos e de lá 40% tiramos o valor de comprar o nosso lugarzinho aqui, que era do avô do meu esposo, ele faleceu, os herdeiros venderam e nós fomos trabalhando lá e comprando as partes dos tios dele. E as oportunidades foram surgindo de pouco a pouco”.
Do mesmo modo que o gosto pela produção do café passou dos pais para Sandra, Sandra também ensinou isso para os filhos. E o incentivo deu certo. “É um negócio totalmente familiar, todo mundo envolvido, eu, meu esposo e meus dois filhos, nós que cuidamos aqui”.
Mas, o ano de 2018 marcou uma mudança importante para a família: eles tiveram as primeiras informações sobre os cafés especiais, bebida de alta qualidade, com características sensoriais marcantes. Trata-se de uma categoria de cafés que possui a graduação a partir de 80 pontos numa escala de 0 a 100 de avaliação. “Minha irmã foi na ACIC (Associação Comercial e Industrial de Caratinga) e ficou conhecendo o café especial, que ela já estava no ATeG Café+Forte e falou para nós que existia um outro café, que a gente consegue fazer um outro café que é o especial. Falamos: “Mas, como?”. Ela falou assim: “Eu vi lá, é muito importante e a gente consegue””.
Foi aí que Isaque, o filho caçula, começou a utilizar a internet para pesquisar e ajudar os pais e o irmão a produzirem este café. “Ficamos naquela curiosidade e o Isaque estava bem mais novo, mas, começou a pesquisar, viu alguns vídeos no YouTube e que realmente tinha mesmo esse café. 2019 nós começamos a catar uns grãos para fazer uma experiência, mas, não deu nada, sentimos uma diferença, mas, não levamos para provar, nada disso. Em 2020, resolvemos a colher uns grãos e sempre pensando como a gente ia fazer, mas, não tinha uma saída”.
Conforme Sandra, o incentivo do Senar e do Sindicato dos Produtores Rurais foi fundamental para capacitação da família e início da produção de cafés especiais. “O Samuel, nosso mobilizador do Senar veio fazer visita no córrego e alguém informou ele que aqui a gente tinha vontade de mexer, mas, não sabia por onde começar. Ele chegou aqui e propôs para nós cursos do Senar e através dos cursos começamos a mexer e, graças a Deus, 2020 já fizemos um pouco, 2021 fizemos uma quantidade maior e vamos na luta, de pouco a pouco. Tudo manual, então fazemos pequenos lotes ainda. É um café de muita qualidade, graças a Deus, com a experiência dos cursos que nós tivemos, ano passado nosso café deu 86 pontos e umas notas muito boas”.
A rotina da família é bastante intensa, mas, a cooperação faz com que o trabalho seja feito de forma mais prazerosa. A união é o elemento principal que tem feito a produção dar certo. “Às vezes temos que emendar até o dia com a noite, a noite com o dia (risos). Nós vamos para a lavoura, ali colhemos, vem todo mundo, a gente lava na caixa, porque não temos lavador ainda, colocamos no terreiro suspenso e aqui a gente vai catando os verdes que aparecem. Todo mundo junto. É muita dificuldade, sem os maquinários para ajudar é bem apertado, é uma correria, mas, mexemos com muito prazer e o resultado deixa muito satisfeito”.
Mulher, produtora rural, mãe e esposa. Sandra Regina é uma grande representante no campo. Ela espera seguir prosperando e quer que mais mulheres se destaquem na produção de café. “A gente fica sonhando em melhorar mais, para a gente mexer até de uma forma mais tranquila, porque sem ajuda de maquinário, alguma coisa é bem difícil. Queremos investir mais, para ficar cada vez melhor. Nossa vizinhança aqui estou sempre falando, mostrando para elas da diferença do que nós já aprendemos, do prazer que é mexer com café especial, porque é diferente. Temos um prazer imenso”.
UM JOVEM PRODUTOR
Isaque Samuel foi peça importante para que a família começasse a produzir cafés especiais. Ele recorda como foi este processo. “Minha tia falou sobre esse novo mundo de café, os cafés especiais, que além de ser cafés pontuados, têm por trás a história dos produtores. Comecei a pesquisar, mostrar para meu pai, minha mãe e meu irmão sobre esses cafés no YouTube, canal do Papo do Cafeicultor, que também nos incentivou muito a produzir. E tem alguns outros canais que começamos a assistir e vimos que aqui na nossa região tinha alta capacidade de produzir cafés de altíssima qualidade. Em 2019, fizemos um nano lote, só mesmo para teste, só fizemos o consumo aqui mesmo. Em 2020, produzimos um pequeno lote e levamos para provar, deu 83 pontos, mas, não conseguimos a comercialização”.
O trabalho realizado também ganhou alcance com a divulgação na internet. “Em 2021, a gente conseguiu produzir 33 sacas, conseguimos comercializar parte desse lote com 86 pontos. Então, já conseguimos, do zero, produzir e comercializar. Estamos buscando mais mercado e daí criei um canal no YouTube, chama Diário do Cafeicultor e tentamos mostrar para os consumidores como é a produção de cafés especiais, como é o processo aqui no dia a dia dos produtores rurais”.
Mostrando todo seu conhecimento, apesar da pouca idade, Isaque Samuel fala um pouco sobre o café que é produzido e as expectativas da família. “Trabalhamos só com o café natural, só mesmo lava ele e coloca no terreiro suspenso, não passa por processo de fermentação; cereja descascado não. Mas queremos começar a produzir esses outros tipos de café. A safra, em questão do ano passado deu um salto, dá uma previsão de colheita boa. E estamos na colheita, difícil, tem alguns companheiros para ajudar, mas, é totalmente familiar mesmo, só parentes, aqui trabalhamos mais voltado para a família e, também, o trabalho de mulheres”.
Ele também destaca que o jovem do campo tem que buscar conhecimento. “Tecnologia, para que mude a história dos produtores. Quando a gente se tornar produtor com mais experiência no café, temos mais tecnologia e os jovens que estão entrando também já possam entrar com mais produção dentro do café”.
RECONHECIMENTO
Bruno D’Lucas fala sobre o esforço da família, que tem resultado em bons frutos. “É fruto de um trabalho que viemos fazendo procurando melhorar nossas condições aqui. E para a gente é importante produzir um café de alta qualidade, levar qualidade para a mesa das pessoas e isso é um sonho que a gente sempre teve e está conseguindo isso. A esperança é cada vez mais produzir cafés melhores, contribuindo para a segurança alimentar e sempre pensando no meio ambiente”.
A economia tem grande incentivo do agro. Bruno ressalta que é preciso mais reconhecimento aos trabalhadores, que produzem e levam sustento diretamente do campo. “O Brasil é o maior produtor de alimento do mundo e é movido muito pela agricultura familiar, então, isso é muito importante para gente estar nesse meio de agricultores, somente com a família. O que buscamos hoje é o reconhecimento financeiro por esse trabalho, o que muitos produtores enfrentam hoje, se produz um café de alta qualidade e na hora de fazer o comércio dele não tem aquele mercado. Estamos procurando, reunindo várias instituições do município para tentar melhorar essa questão e ter a porta para o produtor vender seu produto de forma que realmente merece. Tem altíssima qualidade, então, tem que ter um preço também expressivo para animar o produtor a produzir cada vez mais”.