
Pudim, Eduardo, Celinho, Ricardo, Saur, Ercy e Tico formavam o grupo musical de maior sucesso da região (foto: Arquivo Banda Mil)
Ex-integrantes recordam a trajetória do grupo de maior sucesso da região nos anos 90
CARATINGA – Como o tempo passa. No dia 21 de maio foram completados 25 anos de fundação da Banda Mil, o grupo musical de maior sucesso da região nos anos 90. E naquela época, os meninos não apenas sonharam, eles colocaram em prática o sonho e gravaram CD e LP. Mas daí veio a dura realidade do mercado fonográfico e a ‘ditadura’ das grandes gravadoras. Passado um quarto de século, Ercy Campos e Célio Henrique, o ‘Celinho’, contam como foi aquele período onde a esperança de ter um lugar ao sol ardia como cloro na veia daqueles jovens caratinguenses.
O INÍCIO
Olhando para trás, 1992 parece uma galáxia distante. Era um mundo sem internet, sem TV a cabo, telefone celular era pra poucos e representava ostentação. Mas politicamente o Brasil era muito parecido com os dias de hoje, pois havia a insatisfação com o governo federal e o ‘Fora Collor’ tomava as ruas. Foi nesse cenário que surgiu a Banda Mil. Vários músicos passaram pelo grupo, mas sua formação mais lembrada é com os vocalistas Celinho e Ricardo, Ercy Campos (tecladista), Saur (saxofonista), Eduardo (baixista), Tico (guitarrista) e Pudim (baterista).
Sobre o começo, Ercy Campos recorda que a banda surgiu impulsionada pelo estouro da música sertaneja, já que duplas como Leandro & Leonardo, Zezé di Camargo & Luciano, e Chitãozinho e Xororó eram presenças constantes na TV e dominavam o hit parade. “Tiveram a ideia de formar a banda e eu nem estava no primeiro baile. Eram Celinho e Ailton, que fazia a segunda voz. Tinha o Pudim na bateria, se não me engano o baixista era o Emerson, que hoje está no grupo Beijo Marcado. Não sei ao certo se o Eduardo era o guitarrista. Depois, lá pelo terceiro ou quarto baile, entrei para a banda”.
O vocalista Celinho resume aquele período inicial. “No começo era uma diversão e ao mesmo tempo uma maneira de ganhar uns trocos que ajudavam para comprar uma roupinha melhor ou um calçado, já que as coisas não eram fácies”.
A banda foi dando certo e o André de Barros, na época pertencia ao Grupo SISTEC, foi quem deu o nome para a banda. “O nome pegou. O Anderson fez vários bailes, assim como Fernando Kim e o Beto de Souza. Depois a banda foi alçando outros voos. Para ter ideia, tocamos em todos os lugares do Vale do Aço, seja na Lagoa Silvana, Parque das Cachoeiras ou na Festa do Trabalhador. Apresentamo-nos nos clubes Industrial (Bairro Bom Retiro, em Ipatinga), no Olímpico (Bairro Amaro Lanari, em Coronel Fabriciano) e no Alfa (Timóteo). Tocamos em festas como a de Santo Antônio, em Mesquita. Participamos da campanha política e fizemos o jingle para o senhor Dário Grossi. E numa época sem internet, nosso espaço foi só aumentando na mídia regional, conseguimos nos apresentar em cidades do Vale do Rio Doce, Zona da Mata e parte do Espírito Santo e até no estado de São Paulo”.
MEIO
Em 1995, a Banda Mil comprou um automóvel e depois veio a ideia de gravar um CD, afinal a quantidade de shows não só em Caratinga, mas em toda região, permitiu que o grupo tivesse um capital para essa empreitada, que na ocasião ficou em torno de quase 20 mil reais. “Com o passar do tempo a banda foi se tornando algo mais sério. Também crescemos musicalmente. Depois que começamos a notar o crescimento do público que nos acompanhava, então passamos a sonhar mais alto. Começamos a preparação para gravarmos com muita determinação e conseguimos nosso primeiro CD”, conta Celinho.
A respeito desse investimento na carreira musical, Ercy diz que era muito dinheiro e a banda apostou todas suas fichas nesse álbum. “Fomos corajosos, pois era algo totalmente desconhecido. Como éramos jovens, nessa etapa da vida pensamos que tudo é mais fácil. Este álbum foi gravado no estúdio Polifonia, no Bairro Serra, em Belo Horizonte. Foram 100 horas de estúdio e tudo gravado ao vivo, não usamos nada eletrônico e sentimos a experiência do que era gravar um disco. Esse trabalho foi gravado no sistema digital, que era uma novidade, justamente na época da transição do LP para CD, tanto que a prensagem incluiu LP, pois muitas pessoas não tinham aparelho de CD em 1995”, explica Ercy.
Através desse CD, chamado ‘Mil Sonhos’, a banda conseguiu uma carta de apresentação do cantor caratinguense Agnaldo Timóteo credenciando-a para se apresentarem em vários programas de TV, como Programa Livre, de Serginho Groisman; e Jô Soares Onze e Meia, ambos exibidos pelo SBT; programa de Ana Maria Braga, que passava na Record, assim como Raul Gil, e também no Bem Brasil (TV Cultura). “Peguei meu carro e fui junto do Saur e do Pudim para São Paulo a fim de divulgar o CD. Ficamos na casa de amigos. Mas acabamos por descobrir que o espaço, na época, para bandas
independentes era o armário. Como não existia a internet, as gravadoras tinham muita força. Então elas que ditavam, se fosse contratado de uma delas, apareceria na mídia. Daí percebemos que se não tivéssemos um contrato com uma gravadora não conseguíramos um espaço maior. Com isso ficamos limitados naquele CD, não compensava gravar outro”, pondera Ercy Campos.
Mesmo diante da desilusão em São Paulo, a banda continuou na estrada e em 1998 participou da campanha política. Foram vários showmícios em diversas cidades.
E para os integrantes da banda não havia lugar melhor do que o palco. Dentre tantos shows memoráveis, Ercy se lembra do ‘Natal com a Banda Mil’. “Num desses bailes chegamos ao pé do morro do Hospital e já tinha congestionamento. Foi um ‘Deus nos acuda’ para chegar até o América. Tivemos que descer e subir a pé”. Ele também inclui nesses grandes shows da banda aqueles feitos em parceria com Claudinei & Celso Lee, Banda Scala e JJ Brothers. “Todos os shows pra mim foram muito importantes porque sempre fazíamos com muita determinação e seriedade”, completa Celinho.
FIM
Em sua avaliação, Ercy acredita que o final da Banda Mil se deu em virtude da limitação dos próprios sonhos. “Chegamos a um ponto e percebemos que não passaríamos dali. Sempre falei que ser músico é igual ser jogador de futebol, a pessoa tem uma vida útil para tentar algo grande. Se não conseguir fazer sucesso enquanto novo, depois de velho é muito mais difícil. Também nossas responsabilidades foram aumentando e houve a necessidade de termos algo mais seguro. Mais ou menos foi isso que fez com que a banda parasse suas atividades. Questão de sobrevivência mesmo”.
E SE FOSSE HOJE…
Para Ercy, se fosse hoje a música da Banda Mil teria ainda mais penetração no mercado. “Temos a internet, que é mundial. Daria para termos maior divulgação, pois tínhamos fatores essenciais, que era um trabalho legal e uma energia bacana. Funcionávamos bem, não éramos músicos 100% detalhistas, mas a química da banda era muito boa. Enfim, tínhamos carisma, aonde chegávamos conquistávamos as pessoas”.
Celinho também fez sua análise se a banda começasse nos dias de hoje. “Acredito que seria bem mais fácil com as redes sociais, pois você consegue conquistar certo número de seguidores espontâneos e isso pode se multiplicar muito rápido”.
Entre 2012 e 2013, os integrantes fizeram um retorno da Banda Mil. Ercy comenta como foi essa fase. “O Ricardo, que era um dos vocalistas, tinha morado em Portugal e acabara de voltar para o Brasil, então fizemos bastantes shows nesse período. Só que a realidade de hoje é bem diferente, tanto a nossa pessoal quanto a mercadológica. Nos anos 90, apesar de não ter a internet, então tinha o lado negativo de não ter uma projeção mais rápida, mas tinha o lado positivo, pois os artistas de renome nacional tinham menor acesso às cidades do interior, com isso as bandas regionais ganhavam muito dinheiro naquela época. Havia poucas bandas, porém hoje em qualquer esquina você encontra músicos, o acesso a informação é muito mais fácil. Até mesmo para aprender um instrumento basta clicar no computador, você compra um instrumento de dentro da sua casa, a compra é on-line. Relembro que nos 90 era extremamente difícil ter um instrumento de qualidade e o importado era caríssimo. Mesmo diante das adversidades, conseguimos instrumentos de qualidade e assim exercer nosso trabalho da melhor maneira possível”.
Encerrando a entrevista, Ercy Campos traça um painel comovente do que representam aqueles anos junto da Banda Mil. “Foi uma época bacana, de muitas descobertas, muita amizade, muita energia positiva, muitos sonhos. Além do mais, eu só aprendi. O que tenho hoje é fruto do que vivi naquela época. Não só eu, mas imagino que assim também seja com Celinho, Pudim, Saur, Tico, Eduardo, Ricardo, Emerson, Ailton, o roadie Erasmo. Éramos uma família com várias qualidades e vários defeitos”.